A ATUAÇÃO DO PERITO CRIMINAL NO LOCAL DE CRIME CONTRA A VIDA E A GESTÃO DA CADEIA DE CUSTÓDIA DOS VESTÍGIOS

THE PERFORMANCE OF THE CRIMINAL EXPERT AT THE SCENE OF THE CRIME AGAINST LIFE AND THE MANAGEMENT OF THE TRACE CHAIN ​​OF CUSTODY

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.10278258


Rondinelli Alves De Souza1
Orientadora: Catrine Cadja Indio do Brasil da Mata2


RESUMO

Preservar o local de crime é fundamental para que se descubra as provas que indicarão a autoria do delito. Este artigo trata da importância da preservação do local de crime, da pericia criminal e da gestão da cadeia de custódia para a perícia oficial brasileira na elucidação de crimes. É tratado aqui sobre as variáveis encontradas no local, busca e manuseio corretos dos vestígios encontrados, tudo trazido de uma forma didática, de forma que o leitor, seja ele profissional da segurança pública ou cidadão comum, tenha uma noção de comportamento nos locais de crime que venha a ajudar o trabalho dos peritos criminais. Ao se tratar da cadeia de custódia, busca-se principalmente atingir a todos aqueles profissionais que lidam com o vestígio do local, desde a sua identificação até seu processamento, trazendo informações com relação aos procedimentos necessários e suas consequências.

Palavras–Chave: Vestígios, Cadeia de Custódia.

Abstract

                Preserving the crime scene is essential to discover the evidence that will indicate the authorship of the crime. This article deals with the importance of preserving the crime scene, criminal expertise and chain of custody management for Brazilian official expertise in elucidating crimes. It deals here with the variables found at the scene, the correct search and handling of the traces found, all presented in a didactic way, so that the reader, whether a public security professional or a common citizen, has an idea of ​​behavior at crime scenes.

that will help the work of criminal experts. When dealing with the chain of custody, the main aim is to reach all those professionals who deal with traces of the site, from its identification to its processing, providing information regarding the necessary procedures and their consequences.

Key – Words: Trace Elements, Chain of custody.

1 INTRODUÇÃO

No Brasil, como em todo o mundo, a violência é uma realidade, pois as estatísticas apontam para o fato de que a violência tem crescido assustadoramente, sendo a sociedade brasileira uma das mais agressivas. A violência pode resultar em agressões verbais, físicas e até em crimes contra a vida. Um dos fatores que pode ajudar nesse sentido, ou seja, que pode contribuir para a elucidação dos crimes, é a eficiência da perícia criminal.

A perícia criminal é uma atividade que analisa os vestígios de um determinado crime, objetivando descobrir quem praticou e como praticou este crime, sendo realizada através da ciência forense, ciência esta que é responsável pelos exames periciais, como também pela interpretação dos vestígios encontrados no local onde aconteceu o crime. Sabe-se que os vestígios são elementos importantes na elucidação de qualquer acontecimento que implique em prejuízos para a sociedade e para os indivíduos que nela vivem.

O perito criminal faz uso de todas estas áreas para poder interpretar as pistas existentes no local do crime, analisa corpos, cenas e qualquer pista que possa indicar quem foi o praticante do acontecido no local onde se sucedeu o evento criminatório. É o perito criminal que vai fornecer os elementos necessários à formação de um diagnóstico sobre como e quem praticou o crime. Outro fato bastante importante é o gerenciamento da cadeia de custódia, que é o processo de documentar a história cronológica do crime, para garantir o rastreamento das evidências, registrando quem teve acesso e quem realizou o manuseio dos indícios encontrados no local.

A cadeia de custódia é formada pelos objetos que se encontram no local do crime, bem como a forma como estes objetos se encontram no local onde aconteceu o evento, e a preservação das informações coletadas. Ela possibilita cronometrar as evidências do crime. Sabe-se que o gerenciamento correto destas evidências do crime, tais como colocar lacres em objetos encontrados e restringir o acesso de pessoas estranhas à estas evidências, contribui para que não haja manipulação que dificulte um melhor diagnóstico da situação.

Diante das ponderações acima e da relevância social desse tema, demonstrou-se um interesse em realizar um estudo sobre o trabalho do perito e a forma como é conduzida a cadeia de custódia. Um dos problemas enfrentados constantemente pelos peritos criminais é a falta de cuidados com os vestígios do local do crime.

Após se realizar leituras e pesquisas sobre a importância de se preservar o local do crime e da cadeia de custódia, desenvolveu-se um estudo acerca desta temática, pois se percebeu que sem a preservação do local do evento delituoso e sem um devido gerenciamento da cadeia de custódia, as provas materiais se fragilizam e podem não ser concludentes, dificultando a elucidação do crime.

Um dos problemas enfrentados constantemente pelos peritos criminais é comprovar a falta de isolamento do ambiente onde ocorreu o crime, verificando que houve alterações na situação original (o ambiente do crime não foi preservado convenientemente), o que pode conduzir à perda de elementos vitais relacionados ao fato delituoso. Outro problema não menos importante que este já citado, é a falta de cuidados com os vestígios do local do crime. Eis a justificativa para a elaboração do presente artigo.

Objetivou-se então, de forma geral, abordara importânciadapreservaçãodolocaldocrimee dacadeiadecustódiadentrodaperíciacriminal. Especificamente, objetivou-sediscorrer sobre o local do crime, sua preservação e classificação; apresentar a cadeia de custódia e seu valor para a justiça; conceituar o que são vestígios e elencar os métodos utilizados na sua busca.

Na elaboração deste artigo, a metodologia utilizada foi uma revisão bibliográfica sobre o assunto, abordando os temas principais de forma clara e concisa, passando por todos os assuntos pertinentes ao entendimento do estudo, citando-se as opiniões dos teóricos consultados no decorrer desta pesquisa acerca do local de crime, da cadeia de custódia e do gerenciamento dos vestígios.

2 A CRIMINALÍSTICA

A Criminalística ou ciência forense é o estudo da perícia criminal. É a ciência que detém as técnicas e conhecimentos para a elucidação dos crimes em geral, e que através da coleta e posterior análise dos vestígios encontrados no local do crime. Existe a criminalística de campo e a criminalística de laboratório, sendo que a criminalística de campo investiga o local do crime a partir dos vestígios encontrados e a criminalística de laboratório analisa os vestígios com instrumentos científicos, estabelecendo a forma exata dos fatos (Carvalho, 2006).. Conforme Silva (2015) criminalística “é o conjunto de procedimentos científicos de que se vale a justiça moderna para averiguar o fato delituoso e suas circunstâncias, isto é, o estudo de todos os vestígios do crime, por meio de métodos adequados a cada um deles” (Silva, 2015, p. 12)

A Criminalística no Brasil é atividade da Polícia Federal, através do Instituto Nacional de Criminalística; e, dos Estados, pelos Institutos de Criminalísticas ou Departamentos de Polícia técnico-científica e pelos Institutos Médicos Legais, os quais utilizam as técnicas e os métodos científicos na busca da prova pericial (Lima, 2012, p. 36).

Para o Perito Criminal José Del Picchia Filho, a Criminalística é uma ciência que tem por objeto o reconhecer e a interpretar os indícios materiais extrínsecos, relativos ao delito ou à identidade do criminoso. Os vestígios intrínsecos, ou seja, no corpo, são de competência da medicina legal (Maia, 2012).

A Criminalística vem ganhando cada vez maior credibilidade perante a sociedade, pois, ao levar para o conjunto probatório o conhecimento técnico-científico, oriundo das Ciências Forenses, ela contribui para que os usuários da prova pericial tomem uma decisão mais acertada ao longo do fluxo decisório da persecução penal, possibilitando, assim, uma maior efetividade ao Sistema de Justiça Criminal, com respeito aos direitos humanos (Amorim, 2012, p. 58).

A Criminalística tem por objeto determinar as circunstâncias do crime e segue os seguintes questionamentos: “como?”, “por que?”, “quem?”, “que instrumentos foram utilizados?”, “onde?”, “quando?”, e assim, lançando mão de técnicas, procedimentos e ciências que determinam a verdade jurídica acerca do ato criminal (Lima, 2012; Filho, 2012; Velho et al., 2012).

Ao observar que nos séculos XIX e XX a perícia seguia uma metodologia baseada na tortura, informações e confissões, metodologia esta que era bastante ineficiente, Hans Gross (1999) citado por Filho (2012) propôs que as ciências modernas fossem utilizadas como forma auxiliar no trabalho policial e sistematizou o trabalho de verificação e exame realizado por especialistas das diversas áreas, originando Criminalística, uma ciência independente que vem dar apoio à polícia e a justiça, tendo como objetivo o esclarecimento de casos criminais. Gross fundou o primeiro instituto de criminologia do mundo na Áustria (Filho, 2012). Por isso ele é considerado o pai da criminalística.

Durante o longo período em que atuou como Juiz de Instrução, dedicou-se aos estudos de diversos tratados de física, medicina, psicologia, microscopia, fotografia e ciência em geral com o objetivo de descobrir em que medida tais conhecimentos poderiam ajudar a investigação do crime, fundando assim a “Criminalística” como uma ciência policial especial (Amorim, 2012, p. 60).

A evolução da Criminalística no Brasil teve um marco em 1913, por iniciativa do Dr. Rafael de Sampaio Vidal, na presença do Prof. Rudolph Archibald Reiss, que, como diretor do Laboratório de Polícia Técnica e titular da cátedra de Polícia Científica da Universidade de Lausanne, na França, ministrou conferências temáticas às autoridades locais do eixo São Paulo e Rio de Janeiro (Moraes, 2013).

Entretanto, somente no ano de 1947 foi adotada a criminalística no Brasil, durante I Congresso Brasileiro de Polícia Técnica. Durante este Congresso foi acatada a definição proposta pelo perito criminal Del Picchia, segundo o qual se trata de uma “disciplina que tem por objeto o reconhecimento e interpretação dos indícios materiais extrínsecos relativos ao crime ou à identidade do criminoso” (Velho et al., 2012 apud Amorim, 2012, p. 62).

Conforme Silva (2015, p. 12) criminalística “é o conjunto de procedimentos científicos de que se vale a justiça moderna para averiguar o fato delituoso e suas circunstâncias, isto é, o estudo de todos os vestígios do crime, por meio de métodos adequados a cada um deles”.

3 CONSIDERAÇÕES SOBRE A PERÍCIA CRIMINAL

A perícia é fundamental para que o crime seja desvendado, identificando os autores, os motivos e as circunstâncias em que o crime foi executado e é devido à perícia criminal que diversos casos de homicídio têm sido desvendados. que a perícia é um exame técnico usado de acordo com a necessidade do caso” (Capez, 2012,  citado por Vargas e Krieger, 2014).

A perícia criminal já vem sendo usada ao longo da história da humanidade. Já na velha Roma, o Imperador César aplicara o método de “exame do local”, ou seja, tendo chegado aos seus ouvidos que um de seus servidores, Plantius Silvanius, tendo jogado sua mulher, Aprônia, de uma janela, compareceu ao local e foi examinar o seu quarto de dormir ‘e nele encontrou sinais certos de violência’ (Dorea, Stumvoll. Quintela citados por Vargas; Krieger, 2014, p. 31).

Manzano (2011) apud Vargas e Krieger (2014, p. 37) ressaltam que “perícia é um meio de prova técnica ou científica, que tem por objetivo a obtenção de certo conhecimento relevante para o acertamento do fato (elemento de prova), a partir de um procedimento técnico realizado sobre a pessoa ou coisa (fonte de prova)”.

A perícia criminal é realizada observando-se basicamente 5 etapas, conforme informe Barbosa (2011, pp. 10-11): inicialmente ocorrerá a requisição da perícia, vindo em seguida a escolha da equipe de perícia; em um terceiro momento, a chegada da equipe no local dos exames, .à qual verificará o isolamento, a  preservação do local, a verificação das condições técnicas e de segurança; em um quarto momento, a equipe observa se os peritos fizeram a observação geral do local; se anotaram horários, condições atmosféricas, etc;  no quinto e último momento, a equipe de perícia vai verificar a metodologia utilizada; a conscientização sobre a paciência, preservação e atenção na busca dos vestígios; o estabelecimento dos sentidos de deslocamento na área dos exames; a realização de todas as fases de busca, constatação e identificação dos vestígios no local encontrado e se procurou analisar individualmente.

Depois do procedimento pericial já finalizado (conclusão probatória), o técnico pericial emite um laudo que será encaminhado às autoridades competentes, para que seja examinado e anexado ao processo  de investigação do crime. “O laudo é o produto gerado pelo perito após as análises realizadas, apontando a quais conclusões puderam-se chegar a partir dos resultados”, informa Souza (2011, p. 16). A perícia criminal é:

[…] Exame realizado por técnico ou pessoa de comprovada aptidão e idoneidade profissional, para verificar e esclarecer um fato, ou estado ou a estimação da coisa que é objeto de litígio ou de processo, que com um deles tenha relação ou dependência, a fim de concretizar uma prova ou oferecer o elemento de que necessita a justiça para poder julgar (Araújo, 2004, p. 76).

“A perícia criminal está normatizada no Código de Processo Penal (CPP), mas por questões históricas, não está na Constituição Federal de 1988”, afirma Lima (2012, p. 37). Conforme Capez (2005 apud Almeida, 2009, p. 46), os tipos de perícias  são:

a) Perícia percipiendi, em que o perito se restringe às percepções extraídas com descrição técnica do objeto em análise, sem conclusão valorativa alguma.

b) Perícia deducendi, em que o perito apenas opina, através de interpretação cientifica, sobre um fato.

c) Perícia intrínseca, em que o perito se debruça sobre o elemento interno do crime, sobre o objeto da materialidade do crime.

d) Perícia extrínseca, em que o expert tem como objetos de análise elementos externos à infração penal, que levam à sua materialidade.

e) Perícia vinculatória, em que o juiz fica adstrito ao laudo pericial, sem emanar qualquer juízo de valor sobre o fato.

f) Perícia liberatória, em que o magistrado tem plena liberdade de aceitar, no todo ou em parte, ou mesmo não considerar a perícia para efeito valorativo do caso. Vigora nos ordenamentos jurídicos que primam pelo princípio do livre convencimento, como o Código de Processo Penal Brasileiro (art. 182 do CPP)

Conforme apresentado, existe uma diversidade de assuntos e disciplinas que estão à disposição da justiça para o esclarecimento dos delitos. O poder judiciário não pode apreciar, em sua totalidade, fatos ou negócios jurídicos sem a colaboração de técnicos ou pessoas especialistas em determinados assuntos, razão pela qual se solicitam as perícias (Filho, 2012).

3.1LEGISLAÇÃO PERTINENTE

Conforme Medeiros (2010), quando ocorre um crime, (Art. 6º), a primeira autoridade a chegar ao local providencia o seu isolamento. A responsabilidade legal do procedimento é da autoridade policial, mas a responsabilidade técnica é de todos. Significa que a polícia militar, a polícia civil e a perícia criminal devem zelar pela preservação do local. Continua informando Medeiros (2010) que no Art. 6º, logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:

I – dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; II – apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; III – colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias (Brasil, 1974).

Segundo Cunha (2014), a prova pericial se destaca pelo seu aspecto científico (Art. 155), ao contrário das provas subjetivas. Daí a importância da preservação do local do crime até a chegada dos peritos criminais, por exemplo.

Art. 155.   O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

Nenhum juiz poderá valer-se de prova obtida por meio ilícito (Art. 157), mesmo que esta traga à tona a verdade, para proferir uma sentença condenatória. Considera-se ilícita inclusive aquela prova derivada da ilícita, se tratam, por exemplo, as que violam os direitos constitucionais.

4 CADEIA DE CUSTÓDIA DOS VESTÍGIOS 

A prova pericial produzida pelo perito criminal deve obedecer a uma sequência de etapas que garantam a sua idoneidade, sabido que quando não é possível contestar as provas materiais condenatórias de determinado delito, os procedimentos de obtenção das mesmas o serão.

Segundo Brandão (2016), a prova é o meio técnico pelo qual se demonstra a verdade real de um fato. Ainda segundo Brandão (2016, p. 34), as provas podem ser: a) Provas Inquisitoriais, baseadas na investigação dos fatos do caso, geradas durante o inquérito policial; b) Provas Judiciais, obtidas durante o inquérito policial, são lícitas porque comprovam a veracidade dos fatos; c) provas cautelares, quando existem apenas indícios, pede-se mais investigação para conseguir provas judiciais, como por exemplo uma interceptação telefônica; d) Provas não repetíveis, são as que uma vez coletadas não podem mais ser produzidas em outra fase do processo; e) Provas antecipadas – são provas produzidas no início do inquérito policial, devido a sua relevância para o processo.

A investigação das provas encontradas no local de um crime obedece a um grupo de procedimentos que esclarecerão ou não o delito. Essa investigação criminal não é um processo fragmentado e desordenado, mas um processo coordenado e integrado com diversos segmentos que se unirão para elucidar o crime. Assim, a sequência de “proteção ou guarda dos elementos encontrados durante a execução de uma busca e apreensão”, é chamada de cadeia de custódia, ressalta Barbosa (2011, p. 9).

A cadeia de custódia é o registro de todas as pessoas que tiveram a posse de algo que é considerado evidência e que futuramente tornar-se-á prova ou não; consiste numa série de atos interligados, sem lacunas, objetivando a segurança e confiabilidade do processo em que os vestígios estão submetidos, mantendo sua integridade conforme sua natureza (Marinho, 2011; Leonardo, 2012). Segundo Pereira (2017, p. 15), é o “conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio, para rastrear sua posse e manuseio a partir do seu reconhecimento até o descarte”.

O termo cadeia de custódia define uma sucessão de eventos seguros e confiáveis que devem ter início de forma legal no primeiro contato da polícia com o vestígio e tem importância fundamental na persecução criminal (Velho et al, 2013).  “A cadeia de custódia refere-se à capacidade de garantir a identidade, integridade e rastreabilidade dos vestígios, ela envolve todos os agentes que de alguma forma participaram da investigação forense”, afirma Silva (2015, p. 31).

De acordo com Smith et al. (1990) citado por Ferrari Junior (2012, p. 8), a cadeia de custódia “contribui para manter e documentar a história cronológica da evidência, para rastrear a posse e o manuseio da amostra a partir do preparo do recipiente coletor, da coleta, do transporte, do recebimento, da análise e do armazenamento. Segundo Machado (2019), o Projeto anti-crime no seu art. 158-A, caput do CPP, definiu cadeia de custódia como sendo  “o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em viítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte” (Venturini, 2019).

Pereira (2017, p. 21) ressalta que a “ausência da cadeia de custodia das fontes de prova gera danos irreparáveis ao processo penal um vez que podem levar o magistrado à uma visão adulterada dos fatos”. Quando ocorre a alteração das fontes indiciais no local do crime, quando este não foi preservado, a credibilidade das provas será afetada, porque de nada adianta as provas consideradas legítimas se elas não guardarem uma fiel conexão com a realidade fática dos acontecimentos.

A cadeia de custódia é de suma importância para garantir a autenticidade e a idoneidade da prova pericial. A documentação (através de anotações, fotografias, vídeos, medições, etc.) na cena do crime consolida o ponto de partida para a cadeia de custódia, devendo ser mantida para demonstrar cada etapa, assegurando assim o rastreamento da evidência desde o local de crime até o tribunal (Machado, 2017, p. 9).

Cabe aos peritos criminais o processamento do local de crime, para que encontre e documente os vestígios ali existentes. No entanto, para que isso ocorra, é necessário que o estado das coisas não seja alterado pelos primeiros policiais que chegam ao local, responsáveis pela sua preservação que é condição necessária para uma perícia eficiente (Velho et al., 2013).

No art. 158-A do CPP, a cadeia de custódia é “o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado, para rastrear sua posse e manuseio” a partir de seu reconhecimento até o descarte (Medeiros, 2020). 

Os vestígios no local do crime deverão ser coletados  por peritos criminais, que os encaminharão à central de custódia, conforme está no art. 158_C, caput CPP. Medeiros (2020) salienta que “todos os vestígios coletados […], deverão obrigatoriamente ser remetidos à central de custódia (art. 158-C, § 1º, do CPP), existente necessariamente em cada instituto de criminalística”. Caso não haja condições de armazenamento dos vestígios na central de custódia, uma autoridade judiciária determinará um outro local para acondicioná-los (art. 158-F, § único, do CPP).

No art. 158-D do CPP consta que, em cada uma das etapas da cadeia de custódia, observar-se-á “regras técnicas pertinentes, empregados os materiais necessários à preservação da regularidade do vestígio em questão, bem como adotados os protocolos exigidos de segurança (Medeiros, 2020).

4.1  PACOTE ANTICRIME

Ocorreram alterações na legislação penal e processual do Brasil a partir do ano de 2020, através da Lei no 13.964/2019, chamada de Lei anticrime. Machado (2019) salienta que o  projeto de lei n. 6.341/2019, mais conhecido como “pacote anticrime”, promoveu significativas mudanças na justiça criminal, no sistema de investigação preliminar processual penal.

Houve alterações no campo de investigações de crimes, visando aprimorar estas investigações (Lei de Execução Penal e Lei 12.037/2009 e a identificação de criminosos). Afirma Medeiros (2020) que no pacote anti-crime, o Código Penal estabelece as novas fases da cadeia de custódia (art. 158-B), sendo estas:

a) reconhecer um elemento importante para a prova pericial, b) isolar e preservar o os vestígios e o local do crime; c) descrever os vestígios e sua posição através de filmagens e fotografias; d) coletar e recolher os vestígios, preservando-os; e) acondicionar os vestígios de forma individualizada, referindo quem os coletou e acondicionou; f) transportar os vestígios garantindo suas características originais: g) recebimento dos vestígios com anotações de todos os procedimentos de transporte e informações de suas características; h) processamento dos vestígios, verificando suas características para se chegar a um resultado; i) armazenamento dos vestígios em condiçôes adequadas à sua preservação: j) descarte dos vestígios respeitando a legislação  vigente e, quando pertinente, mediante autorização judicial (Medeiros, 2020).

Neves (2019) afirma que o Artigo 3º da Lei  n.º 12.850/2013 (Lei de Organizações Criminosas) determina que sejam criadas equipes conjuntas de investigação, às quais  não terão restrições para compartilhamento de provas e podem ser compostas com órgãos de investigação estrangeiros sem exigência de tratado internacional. A ideia é que essas equipes sejam usadas para investigar crimes de terrorismo ou transnacionais

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante das leituras realizadas nas fontes consultadas no decorrer deste estudo, constatou-se que preservar o local de crime é fundamental para que se descubra seu autor e a forma como foi perpetrado. Os vestígios encontrados no local de crime, após serem analisados pelos peritos podem vir a se tornar evidências, as quais são incontestáveis e evidentes, caracterizando as provas do ato cometido por alguém. Eis porque é essencial a preservação do local onde ocorreu o delito, para que os vestígios não sejam alterados e destruídos por pessoas que adentraram no local.

Percebeu-se que o local de crime deve ser imediatamente isolado pelas autoridades competentes, porque qualquer alteração, por menor que seja, pode descaracterizar o ambiente criminoso e impedir que os peritos cheguem a uma conclusão exata sobre o autor do crime.

O perito criminal exerce um papel importante no contexto da justiça dentro do sistema penal, sendo o responsável pela elaboração da prova material a partir dos vestígios do local do crime. O trabalho do perito é descrever o local do crime, relacionando os vestígios e evidências encontradas, fornecendo esquemas e desenhos que facilitem a análise pela justiça.

Tomou-se conhecimento de que a cadeia de custódia é um processo de documentar por determinada pessoa, previamente qualificada para tal, todas as evidências e provas, laudos e amostras, indicando quem as manuseou, detalhando os procedimentos e sequência dos fatos, tais como: quem manuseou os vestígios, como manuseou, como foram obtidos estes vestígios, como foram armazenados, quem esteve em contato com eles desde o momento da coleta até o momento da análise, sendo citados todos os envolvidos, tais como peritos criminais, agentes, escrivães, delegados, papiloscopistas e demais pessoas que tiveram contato com os vestígios e ambiente do crime. A correta gestão da cadeia de custódia, ou seja, dos procedimentos adequados na investigação de um crime, poderão fazer a diferença no momento de condenar um culpado.

Este estudo, ao esclarecer o local do crime, ao definir os principais elementos relacionados de forma que ficasse claro que o local de crime é um espaço rico em fontes de informação para a perícia criminal, ao colocar a importância de sua preservação para o desenvolvimento dos trabalhos periciais, ao discorrer sobre a gestão da cadeia de custódia, deverá contribuir para que os agentes policiais tomem conhecimento da importância da preservação adequada do local de crime e de uma boa gestão da cadeia de custódia na elucidação de crimes e na punição dos culpados.

Os objetivos específicos do trabalho foram contemplados, apoiados numa bibliografia consolidada utilizada e produzida por profissionais renomados da área da criminalística. Como um todo, foi abordada a importância da preservação do local de crime e da gestão da cadeia de custódia dentro da perícia criminal, atingindo o objetivo geral deste estudo.

Sugere-se que novos estudos sejam realizados nesta área, para que todos sejam informados sobre a preservação do local de crime como parte essencial na investigação criminal e sobre a correta gestão da cadeia de custódia como elemento crucial na condenação dos envolvidos no crime.

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Rondinelli Alves De Souza – Especialista em Gestão e Segurança Pública, curso de Pós Graduação Lato Sensu,pela Faculdade de Vitória, ES; Bacharel em Ciências Contábeis pela Universidade do Estado da Bahia – UNEB; Bacharelando em Direito pela Faculdade AGES. email: rondcontabeisdpt@gmail.com1
Orientadora: Catrine Cadja Indio do Brasil da Mata –
Orientadora –Professora Universitária de Direiro na AGES Senhor do Bonfim (Anima Educação), Mestra em Economia Regional e Políticas Públicas pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Doutoranda em Direito pela Universidades Federal de Santa Catarina (DINTER UFDS/UESC), especialista  em Direito Público pela Universidade Cruzeiro do Sul (UNICID), bacharel  em direito pelo Centro de Ensino Superior de Ilhéus. E-mail: catrine.mata@ages.edu.br2