ADOÇÃO INTUITU PERSONAE: UM ESTUDO ACERCA DA LEGALIZAÇÃO NO BRASIL COM A PARTICIPAÇÃO EFETIVA DO ESTADO

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.10206103


Raquel Pereira¹
Mariana Pires²


RESUMO

A presente pesquisa tem como tema Adoção Intuitu Personae: Um estudo acerca da legalização no Brasil com a participação efetiva do Estado. Adoção Intuitu Personae é uma modalidade de adoção em que na entrega voluntária pela gestante, esta ainda imbuída do Poder Familiar, indica a família que lhe substituirá, sem que estes adotantes estejam previamente inscritos no Cadastro Nacional de Adoção. O que possui o seguinte problema: De que forma a legislação brasileira pode garantir com maior eficiência e eficácia por meio da participação efetiva do Estado o modelo de Adoção Intuitu Personae? O objetivo geral do presente artigo é analisar a legislação brasileira e as possibilidades de garantias com a maior eficiência e eficácia por meio da participação efetiva do Estado. E como objetivos específicos preconiza-se contextualizar a legislação de Adoção Intuitu Personae; compreender como é realizada a participação efetiva do Estado, nos casos de Adoção Intuitu Personae; e identificar casos já julgados no Brasil com o modelo Intuitu personae. A metodologia aplicada para esta análise é a bibliográfica de cunho qualitativo. Serão apreciados nesta pesquisa os benefícios da adoção intuitu personae como uma escolha a mais no processo de adoção visando o princípio do melhor interesse da criança apregoado no Estatuto da Criança e do Adolescente, mantendo a opção já existente em que a criança é institucionalizada para os casos em que a gestante não tivesse uma pessoa para direcionar a adoção.

Palavra-Chave: Adoção Intuitu Personae. Entrega Voluntária. Estado. Cadastro Nacional de Adoção. Estatuto da Criança e do Adolescente.

1.INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema Adoção Intuitu Personae: Um estudo acerca da legalização no Brasil com a participação efetiva do Estado, com o intuito de apresentar a respeito dessa modalidade de adoção direcionada que é quando a genitora manifesta sua vontade em direcionar a adoção por meio do exercício do seu poder familiar para uma família previamente escolhida por ela, que não está inscrita no Cadastro de Adotantes. É indispensável destacar que esta modalidade se difere das diversas formas ilícitas de filiação clandestina como a “adoção à brasileira” e a “adoção pronta”.

No modelo de perfilhação direcionado, no período gestacional a mulher escolhe o adotante e de forma judicial comunica seu desejo de entregar voluntariamente o nascituro, a família indicada então passa por uma avaliação psicossocial realizada por uma equipe multidisciplinar, para resguardar o interesse da criança e a sua segurança, ou seja, não se trata de regularizar um caso fático, pois não existe ainda o vínculo de convivência entre adotante e adotado. 

Após a promulgação da Lei de Adoção em 03 de Agosto de 2009 sob o número 12.010, a adoção intuitu personae tornou-se ainda mais evidente, pois é notória a falta de sua previsão legal correspondente a este tema, que não veda expressamente seu uso, muito menos fazer-se legítima, gerando severos debates jurisprudenciais e ocasionando conflitos na doutrina de direito da família. Incitado o questionamento de que forma a legislação brasileira pode garantir com maior eficiência e eficácia por meio da participação efetiva do Estado o modelo de Adoção Intuitu Personae?

Este trabalho tem como objetivo geral analisar a legislação brasileira e as possibilidades de garantias com a maior eficiência e eficácia por meio da participação efetiva do Estado. E como objetivos específicos preconiza-se contextualizar a legislação de Adoção Intuitu Personae; compreender como é realizada a participação efetiva do Estado, nos casos de Adoção Intuitu Personae; e identificar casos já julgados no Brasil com o modelo Intuitu personae. 

A justificativa para a presente pesquisa é que essa modalidade de adoção tem grande relevância para o Estado e a sociedade, pois traz a discussão a respeito de uma forma de adotar que não está prevista expressamente no Estatuto da Criança e do Adolescente, mas que é recorrente em julgamentos no Poder Judiciário, não podendo, portanto o legislador manter sua omissão a este tema de extrema necessidade, justamente por estar relacionado a vida do adotado.

A metodologia que será empregada para a composição do presente trabalho é a bibliográfica de cunho qualitativo, reunindo informações e conteúdos por meio de pesquisa documental, artigos científicos, livros, julgamentos dos Tribunais Brasileiros, leis, google, doutrinas, com o intuito de analisar de forma aprofundada a perspectiva de tornar a Adoção direcionada regulamentada pelo Ordenamento Jurídico Brasileiro listando as dificuldades enfrentadas por esta modalidade de adoção. 

O referencial teórico desta pesquisa perpassa por discussões que visam o melhor embasamento para o pensamento científico aqui mencionado. Posto que pretende-se  iniciar com a contextualização histórica a respeito da adoção no Brasil, seguido dos conceitos inerentes à pesquisa, tais como o de adoção e da modalidade intuitu personae. Apresentando as particularidades de cada etapa do processo de adoção, os desafios quanto à coibição de ilegalidades. A abordagem manterá como foco essencial a valorização do princípio de maior interesse da criança, garantido por meio da participação efetiva do estado em todo o processo proposto.

Após realizar um estudo aprofundado sobre o tema, busca-se entender as possibilidades de tornar legal o modelo de adoção Intuitu personae como uma forma a mais para adotar, trazendo celeridade ao processo, benefícios ao adotado e desatolar o Sistema Institucionalizado. 

2.METODOLOGIA 

Todo trabalho científico deve partir de um estudo detalhado e metódico do seu tema, traçando um caminho sistemático para o resultado final, sem os quais não seria possível a construção de uma lógica para ser apreciada, tornando impossível a cientificidade de um artigo. 

Assim, o método é o conjunto das atividades sistemáticas e racionais que, com maior segurança e economia, permite alcançar o objetivo – conhecimentos válidos e verdadeiros -, traçando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as decisões do cientista. (LAKATOS, 2003, p. 83) 

O trabalho possuirá como objeto de estudo a adoção Intuitu personae, modalidade a mais ao procedimento adotivo visando o maior interesse da criança e a celeridade no processo, com propósito de analisar a sua viabilidade serão utilizados instrumentos de pesquisa de maneira a permitir conhecimento detalhado e amplo do assunto partindo da escolha do tema, perpassando pela fase do fichamento, interpretação e análise.

O tipo de pesquisa que será empregada para a realização deste estudo é a bibliográfica que utiliza materiais já existente, levantando obras e textos que ajudará a analisar de modo mais criterioso o tema escolhido, provendo bagagem teórica para alcançar os resultados almejados, para isso a análise será realizada em livros, artigos científicos, teses, legislação, julgados dos tribunais brasileiros, sites da internet e demais fontes que apreciem a temática. 

A pesquisa bibliográfica é um apanhado geral sobre os principais trabalhos já realizados, revestidos de importância, por serem capazes de fornecer dados atuais e relevantes relacionados com o tema. O estudo da literatura pertinente pode ajudar a planificação do trabalho, evitar publicações e certos erros, e representa uma fonte indispensável de informações, podendo até orientar as indagações. (LAKATOS, 2003, p. 158) 

A metodologia aplicada para a exploração desta tese consistirá na descritiva que tem como objetivo destacar as características de determinada circunstância, não possuindo a finalidade de explicar a problemática, apenas trazer levantamentos das informações que servirão posteriormente de base para responder os questionamentos acerca do conteúdo. 

As pesquisas descritivas têm como objetivo primordial a descrição das características de determinada população ou fenômeno ou, então, o estabelecimento de relações entre variáveis. São inúmeros os estudos que podem ser classificados sob este título e uma de suas características mais significativas está na utilização de técnicas padronizadas de coleta de dados, tais como o questionário e a observação sistemática. (GIL, 2002, p. 42) 

E, portanto, a presente pesquisa será descritiva porque produzirá arcabouço suficiente para analisar a viabilidade da adoção intuitu personae na legislação brasileira. Consequentemente abordar questões da responsabilidade em permitir o reconhecimento dessa modalidade de adoção, bem como as dificuldades, riscos e ilegalidades que permeiam o tema que envolve estritamente crianças em situação vulnerável.

Com relação a escolha da abordagem deverá ser a qualitativa pois ela que analisará os conteúdos a serem abordados de forma subjetiva, tratando as motivações e concepções da aceitação ou rejeição a modalidade de adoção que vai ser objeto de estudo. Com o propósito de descrever a abordagem qualitativa o autor Mário Almeida diz que:

Utilizando o enfoque indutivo na análise de dados e dando maior importância aos significados atribuídos pelas pessoas às coisas e à vida. Não é necessária a utilização de ferramentas estatísticas de análise de dados, e ainda assim a pesquisa é eminentemente descritiva. (ALMEIDA, 2014, p. 26)

A amostra desta pesquisa será dedicada a esta temática por sua relevância para população brasileira, concernente à omissão legislativa. Por isso, o procedimento será realizado no âmbito nacional do Brasil, focando na criança que será adotado e na família interessada na adoção, para identificar pontos positivos e negativos desta perfilhação, enriquecendo a investigação.  

3.ADOÇÃO INTUITU PERSONAE E A LEGALIZAÇÃO NO BRASIL COM A PARTICIPAÇÃO EFETIVA DO ESTADO

3.1 SUCINTO HISTÓRICO DA ADOÇÃO INTERNACIONAL E NACIONAL

O ordenamento jurídico brasileiro é responsável por promover o acolhimento de crianças que por diversos motivos não podem ser cuidadas por seus pais biológicos, passando pelo processo adotivo estabelecido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Mas esta demanda não surgiu recentemente, a adoção vem desde o início da humanidade. E conhecer o processo histórico da adoção, serve para compreender melhor a adoção intuitu personae que levam aos debates jurídicos sobre a sua legalização no país.

Para Sílvio de Sálvio Venosa (2003 apud CARBONNIER, 1999, p.337), a adoção foi criada com fundamentos religiosos, em que, aqueles que não podiam ter filhos procuravam uma forma para multiplicar a sua família, como sinal de honra. Como exemplo tem-se a história bíblica da filha de faraó em Êxodo versículo 2 e capítulo 10 (BÍBLIA, 2009), que decidiu adotar uma criança que achou nas margens do rio.  Para a sociedade como toda, a adoção tem o significado de constituir uma família, por meio do vínculo afetivo, principalmente para casais que não podem conceber. 

Suely Kusano indica como marco inicial de grande importância para esta temática o que aconteceu na França, com a publicação da Constituição Francesa. Este Código foi estabelecido em 1804, e nele o que fica mais destacado é a importância dada ao interesse do menor que antes era completamente renegado. Ainda na França o desenvolvimento da Constituição do país com essa temática, serviu como modelo legislativo para outros países da Europa e para a América (KUSANO, 2011, p. 85).

Em 25 de outubro de 1980 na cidade de Haia, no continente Europeu, signatários de diversos países firmou uma convenção em que seu conteúdo tratava sobre o rapto internacional de crianças, que propiciou ao Brasil por meio de convenções americanas assinar a convenção interamericana de tráfico infantil, ponto importante para o procedimento da adoção visto que o processo adotivo da época estava sendo usado para traficar crianças. O tema das convenções gerou a Conferência de Haia no ano de 1988, que abordou a adoção internacional (KUSANO, 2011, p. 85). 

Essa conferência gerou mudanças significativas, pois ficou acordado que a adoção seria realizada preferencialmente em âmbito nacional e após esgotada essa possibilidade é que seria feito internacionalmente, entretanto o Brasil unicamente participou desta conferência como membro ad hoc, aprovando seu texto apenas no ano de 1999. Mas desde o ano de 1986 que o país já abordava sobre a adoção em âmbito nacional e instituiu um congresso neste período com este tema, formulando recomendações como a do controle judicial para todo tipo de adoção, seja nacional ou internacional (KUSANO, 2011, p. 85).

No Brasil o instituto da adoção ainda não estava estabelecido no ordenamento jurídico e por isso usava-se como fonte legislações de outros países, a primeira legislação Brasileira ocorreu em 1693, mas o marco significativo veio com a ingresso do Código Civil de 1916 que permitia ao maior de 50 anos adotar e ofertava alguns direitos ao adotado (KUSANO, 2011, p. 85). Contudo, infelizmente o infante não possuía a mesma legitimidade do filho biológico, o que ocasionou o surgimento da adoção à brasileira, em que as famílias simulavam que a criança era seu filho biológico para poder ter o mesmo privilégio.

Com a crescente mobilização dos movimentos de proteção às crianças a partir do ano de 1980, pedindo a atualização dos direitos para as crianças e adolescentes que estavam para a adoção, entregou em sua nova Carta Magna a Constituição Federal de 1988, direitos e garantias que conferem ao procedimento adotivo maior confiabilidade e proteção aquele que vai ser entregue a uma nova família (KUSANO, 2011). Posteriormente a sua promulgação houve a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente em 13 de julho de 1990, bem como a Lei 13.509 de 22 de novembro de 2017 (Lei de Adoção), que dispõe sobre a entrega voluntária da criança ao lar de acolhimento, com a destituição do poder familiar, regulamentando a guarda e a adoção do infante por outra família interessada.

Com isso é imprescindível ser observado que a adoção deve buscar primordialmente o interesse da criança, satisfazendo o que é melhor para ela, buscando sempre que este procedimento seja auxiliado por equipe multidisciplinar para torná-lo menos pesaroso possível e combater o tráfico infantil. Pois a criança está momentaneamente vulnerável tanto juridicamente falando, quanto psicologicamente, e este processo deve resguardá-la de possíveis traumas futuros.

Com relação a adoção Intuitu personae no Brasil não foi regulamentada, enquanto já é prevista legalmente em alguns países. O que se observa é que não há qualquer previsão legal no histórico brasileiro, que nem descarta, nem aprova legislativamente a sua utilização, embora seja matéria de diversos julgados nos tribunais do país e seja motivo de discussão doutrinária, infelizmente ainda ocorre a sua omissão.  Mesmo que trate de conteúdo relacionado ao menor de idade e do seu futuro com o Sistema Nacional de Adoção.

3.2 CONCEITO E PARTICULARIDADES DA ADOÇÃO

Adoção é o ato de receber como filho alguém que lhe é estranho, com o objetivo de formar vínculo afetivo duradouro. Possuindo ou não relação de parentesco, a condição de filho é por meio fictício de filiação. A expressão vem do latim adoptio que de acordo com o doutrinador Ferreira (2004, p.15) tem o significado de “ato ou efeito de adotar”. Sendo ainda uma manifestação de vontades, que é efetivada por decisão judicial, o que a torna um ato jurídico solene.

 A adoção vem a ser o ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha. (DINIZ, 2010, P.522)

A adoção é a forma mais completa utilizada pela legislação brasileira de introduzir a criança em uma família substituta, transformando-o em um membro do novo lar. Esta modalidade beneficia a criança, pois mesmo ocorrendo filiação apenas afetiva, o ordenamento jurídico brasileiro estabelece igualdade de direitos entre os filhos por adoção e os biológicos, inclusive a mesma proteção legal, isso porque com a efetivação da adoção o registro anterior da criança é cancelado, recebendo nova Certidão com as informações dos adotantes. 

A adoção é a forma de família substituta que mais se aproxima da família natural, isto porque além de ser irrevogável, e do adotado ter seu registro civil anterior cancelado, recebendo assim, o nome dos adotantes, a Constituição Federal dispõe que todos os filhos, naturais e adotados, possuem os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios. (FREIRE, 1994, p. 206)

Essa imposição de que os direitos são idênticos entre filhos biológicos e adotados vem do Artigo 227 da Constituição Federal do Brasil (1988, n.p), em seu parágrafo 6° “terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”. Contudo, para a sua regulamentação é preciso saber a idade do adotado para só então definir o seu procedimento de adoção, isso porque a adoção de maiores de dezoito anos é disciplinada pelo Código Civil, enquanto a da criança é regulamentada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e pela legislação especial.

3.2.1Cadastro de adotantes

No Brasil a adoção é realizada por meio do prévio cadastro dos interessados em adotar no Sistema Nacional de Adoção. Em que os interessados passam por um procedimento de habilitação extremamente burocrático para só em seguida ingressar na lista de espera para poder encontrar uma criança disponível para a adoção que tenha o mesmo perfil, a realidade fática é a espera de um a dois anos para conseguir ou não a habilitação, mas em regra esse processo de habilitação deveria ser realizado em quatro meses, conforme o Estatuto da criança e do Adolescente (BRASIL, 1990, n.p) em seu artigo 197-F “O prazo máximo para conclusão da habilitação à adoção será de 120 (cento e vinte) dias, prorrogável por igual período, mediante decisão fundamentada da autoridade judiciária.”.

Entretanto, a demora do processo adotivo pode levar até 5 anos para terminar, quando a lei estabelece 120 dias. Por isso números tão significativos de desistência. A institucionalização da criança pode ocorrer por diversos motivos, como abandono, negligência e abusos sexuais, ela é vista como uma medida temporária, até que haja uma solução permanente como a adoção. 

O Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990, n.p) prioriza essa institucionalização como dita seu artigo 50, in verbis: “A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção”. No entanto, esse período curto se transforma em anos de burocratização na espera de ser adotado, que causam problemas a criança como problemas de saúde físicos e emocionais, além de desenvolvimento educacional e cognitivos precários. 

3.2.2Ilegalidades

O Sistema de Adoção tem inicialmente o dever de organizar o procedimento do ato jurídico, mas com o tempo passou a criar barreiras impeditivas. Como este mecanismo institucionalizado causa demora e dificulta a efetiva filiação muitos casais infelizmente passaram a optar por modelos ilegais para adotar uma criança, além disso o comércio ilegal aproveitam esse momento de vulnerabilidade da criança para o tráfico infantil com a intenção de vender para casais que não querem esperar na fila ou para fins de escravidão ou prostituição. Vejamos alguns exemplos de ilegalidades que ocorrem no âmbito da adoção.

O tráfico de crianças e adolescentes é um problema extremamente grave que permeia a adoção. Em que organizações criminosas sequestram crianças, para vende-las para indivíduos que desejam adotar burlando a lista de espera ou utilizam esse período de adoção para trafica-las como objeto de prostituição ou escravidão, ignorando os tramites legais. Para combater essa ilegalidade, o Estado tem a obrigação de fortalecer o sistema de proteção à infância de pessoas que usam o processo adotivo visando lucro pessoal e outras conveniências nefastas (KUSANO, 2011. p. 68). Esta prática está tipificada no artigo 149-A do Código Penal Brasileiro.

Art. 149-A.  Agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de: I – remover-lhe órgãos, tecidos ou partes do corpo; II – submetê-la a trabalho em condições análogas à de escravo; III – submetê-la a qualquer tipo de servidão; IV – adoção ilegal; ou V – exploração sexual. (BRASIL, 1940, n.p)       

A adoção a brasileira é aquela que os genitores biológicos entregam a criança para os pais adotivos e estes registram em cartório a criança recém nascida como se sua fossem, isso acontecia principalmente antes da legislação igualar os direitos dos filhos, pois os casais muitas vezes optavam por essa forma de adoção para torna-los iguais em direitos, pois o filho adotivo se tornaria “biológico” por conta do registro ilegal. Atualmente essa prática embora em menor escala ainda acontece motivada pela demora no procedimento institucional (KUSANO, 2011, p. 63). O Código Penal (BRASIL, 1940, n.p) estabelece essa prática como crime e sua penalidade por praticar tal ato é a prisão, conforme artigo 242 “Dar parto alheio como próprio; registrar como seu o filho de outrem; ocultar recém-nascido ou substituí-lo, suprimindo ou alterando direito inerente ao estado civil: Pena – reclusão, de dois a seis anos. Infelizmente, esta prática ainda é rotineira no país.

A adoção pronta, é aquela que vem disfarçada de abandono, em que os pais adotivos vão ao juizado com uma determinada criança que “acharam em frente a sua casa” (foi abandonada) sem que se saiba sua origem ou quem são seus genitores. Momento este em que pedem o direito de guarda e ingressão com o pedido de adoção, mas que na verdade é uma simulação da real verdade (KUSANO, 2011. p. 66). Esta forma de ilegalidade já é vedada pela Lei 12.010 de 2009.

4.REALIZAÇÃO DA ADOÇÃO INTUITU PERSONAE NO BRASIL

4.1ADOÇÃO INTUITO PERSONAE PELA GESTANTE

Adoção Intuitu Personae, expressão em latim que significa “em consideração à pessoa”, é uma modalidade de adoção em que a genitora estando imbuída do seu poder familiar, manifesta seu anseio de disponibilizar a seu filho a adoção, designando o adotante ao judiciário, antes mesmo de o indicado possuir vínculo com a criança. Isto é possível porque a gestante não perde o poder familiar dela até o momento em que é efetivada a adoção, logo não seria justo proibir de escolher a quem ela quer direcionar essa criança.

A indicação do adotante é realizada pela gestante genitora do feto que aciona a justiça mostrando para quem ela deseja direcionar a criança, expondo seus motivos.

E nada, absolutamente nada impede que a mãe escolha quem sejam os pais de seu filho. Às vezes é a patroa, às vezes uma vizinha, em outros casos um casal de amigos que têm uma maneira de ver a vida, uma retidão de caráter que a mãe acha que seriam os pais ideais para o seu filho. É o que se chama de adoção intuitu personae, que não está prevista na lei, mas também não é vedada. A omissão do legislador em sede de adoção não significa que não existe tal possibilidade. Ao contrário, basta lembrar que a lei assegura aos pais o direito de nomear tutor a seu filho (CC, art. 1.729). E, se há a possibilidade de eleger quem vai ficar com o filho depois da morte, não se justifica negar o direito de escolha a quem dar em adoção. (DIAS, 2009, p. 1)

O processo de adoção não seria realizado de forma descuidada, pois a família indicada passaria por uma equipe multidisciplinar que faria um estudo psicossocial, pesquisando se a família poderá ser um candidato realmente satisfatório para atender as necessidades da criança, procurando sinais de desejo para o tráfico, se são adequados e tem estrutura para receber a criança. 

Não se trata de regularizar situação fática anterior, desnecessário que o indicado esteja previamente inscrito no cadastro de adotantes; embora deva ser submetido, antes da pronúncia de adoção, à avaliação psicossocial por equipe interdisciplinar, a fim de assegurar efetivo atendimento dos interesses prioritários do adotando. (KUSANO, 2006, p. 137)

Nesse caso não há a necessidade da família escolhida pela mãe ter sua inscrição no Cadastro Nacional de Adotantes, pois a intenção desta modalidade de adoção é a celeridade visando o interesse da criança, e a avaliação psicossocial seria realizadas já no caso concreto em que são identificados o adotante e o adotando, não meramente por idealização de perfis parecidos. 

4.1.1Princípio do maior interesse da criança

O Princípio do maior interesse da criança é fundamental na legislação brasileira, ele estabelece que o interesse e o bem estar da criança devem prioritariamente ser considerados, principalmente quando diz respeito à adoção, em que a criança está vulnerável, logo a decisão sobre a colocação do adotando para a adoção deve considerar suas necessidades, desenvolvimento emocional e sua segurança, o interesse da criança é o foco primordial dessa adoção, por isso o Estatuto da Criança e do Adolescente regulamenta que:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. (BRASIL, 1990, n.p)

Qualquer tomada de decisão em relação a adoção tem impactos significativos na vida da criança, por isso a adoção deve ser baseada neste princípio, que inclusive pode levar em consideração o direito da criança manter sua identidade cultural e étnica, proporcionando um ambiente amoroso, seguro e com estabilidade para crescer e se desenvolver.

4.1.2Malefícios da adoção tardia e benefícios da adoção imediata 

A adoção tardia apresenta desafios e dificuldades desmesurados, tanto para os adotados quanto para a família que o recebe em seu seio familiar. Isso ocorre porque muitas crianças que são adotadas tardiamente desenvolvem experiências traumáticas pois sua história de vida é repleta de abandono, negligência ou abusos, que afetam seu desenvolvimento emocional, comportamental, cognitivo e psicológico, fazendo com que a adaptação ao novo ambiente familiar seja desafiador, pois já existe uma identidade de consciência na criança, que entende a sua história e origem, sem conhecer o que é afeto e cuidado familiar (KUSANO, 2011).

Importante salientar que não são todas as crianças adotadas tardiamente que vão enfrentar tais problemas, no entanto é importante manter a ciência dos desafios em potencial, para que se construa um ambiente de cuidado e apoio com profissionais adequados a ajudar no processo de adoção. Embora o ideal seja a escolha da adoção imediata sempre que possível.

A adoção imediata, é aquela que acontece logo após o nascimento e oferece diversos benefícios para todos os envolvidos no processo de adoção. Isso porque possibilita que a criança constitua um vínculo afetivo com seus novos genitores desde os primeiros momentos de vida, fortalecendo o relacionamento posterior entre eles e contribuindo para o desenvolvimento emocional cognitivo e social do adotando ainda em seus primeiros anos de vida, que é inserido em um ambiente estável e seguro para a criança desde o início (DIAS, 2019).

Esse vínculo afetivo profundo que é formado oferece ao novo integrante do seio familiar um ambiente estável e amoroso, que lhe proporciona segurança emocional e psicológica, pois os pais adotivos acompanham de perto o crescimento e desenvolvimento do seu filho desde o seu nascimento.

4.1.3A participação efetiva do Estado 

A participação efetiva do Estado na adoção intuitu personae deve ocorrer para propiciar que as garantias e direitos do adotado estão sendo respeitados assim como acompanhar o processo de adoção em sua integralidade. Devendo avaliar minuciosamente se os adotantes em potencial possuem os requisitos mínimos legais e estejam aptos para o cuidado da criança, essa avaliação inclui estabilidade financeira, antecedentes criminais e visitas domiciliares para entender o ambiente domiciliar dos adotantes (DIAS, 2014). 

Revisando criteriosamente os documentos apresentados e supervisionando todas as etapas do processo, para que sejam transparentes e estejam em conformidade com os padrões internacionais. Isso porque o Estado tem o dever de oferecer proteção ao infante, ofertando todo o suporte antes, durante e após o processo de Adoção, acompanhando o desenvolvimento da criança no ambiente familiar com o objetivo de garantir o bem estar do adotando visando o maior interesse da criança, promovendo um processo seguro e responsável (DIAS, 2014). 

Entretanto é notório a omissão do Estado no que diz respeito a legalização da adoção direcionada, visto que a Lei de Adoção e o Estatuto da Criança e do Adolescente disponibiliza regulamentos com relação ao procedimento de adoção, como funciona o sistema de cadastro e  tudo mais, contudo não existe previsão na legislação do Brasil essa modalidade, mesmo após alteração recente de 2009, advinda da lei de adoção. Sendo que por conta dessa ausência de norma os tribunais brasileiros entram em conflito com suas decisões, possuindo diversos julgados favoráveis e contrários acerca da Adoção Intuitu Personae

É importante ressaltar que apesar da ausência de lei para essa demanda, não pode ser utilizada como um critério absoluto para negar a adoção de uma criança, na hipótese em que todos os demais requisitos legais exigidos pelas leis estejam preenchidos, pois o principal propósito é a qualidade do vínculo afetivo entre os adotantes e o adotando, proporcionando uma família estável para a criança, conforme vejamos a decisão:

BRASIL. Tribunal De Justiça do Rio De Janeiro, AGRAVO DE INSTRUMENTO ADOÇÃO. PAIS AFETIVOS. NÃO OBEDIENCIA À LISTA DE ADOÇÃO. INTERESSE DO MENOR. I. Não se contesta a validade da lista de adoção, que, sem dúvida, deve ser obedecida, a fim de evitar-se possíveis irregularidades no procedimento de adoção. 2. Todavia, in casu, determinar a ida do menor para um abrigo, retirando-o dos braços e cuidados dos agravantes não parece ser a melhor solução para o caso, mormente porque a criança se encontra, desde o primeiro dia de vida, conforme o depoimento da própria mãe biológica do menor, sob os cuidados dos agravantes, devendo-se ponderar entre o interesse do menor e a autoridade da lista de adoção. Prevalência do interesse do menor. 3. Provimento do recurso”. (RIO DE JANEIRO SANTA CRUZ REGIONAL 2 VARA INF JUV IDO, Relator: JOSE CARLOS PAES, Data de Julgamento: 12/12/2008, DÉCIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 17/12/2008)

Por conta disso, os Tribunais de Justiça usam de sua autonomia para interpretar e aplicar a legislação de acordo com as particularidades do caso em concreto, inclusive para afastar a exigência do prévio cadastramento, se assim acharem pertinentes ao melhor interesse da criança, possibilitando até mesmo o afastamento da regra do artigo 50 do Estatuto da Criança e do adolescente, permitindo que a criança não seja institucionalizada, como consta:

BRASIL. Tribunal De Justiça do Rio De Janeiro, Agravo de instrumento. Adoção. Menor que, com dois dias de vida, foi entregue pela mãe biológica aos agravantes. Adoção dirigida ou intuitu personae que permite à mãe biológica entregar a criança a terceiros, que passam a exercer a guarda de fato. Juízo a quo que indefere pedido de guarda provisória determinando a busca e apreensão da criança e a colocação em abrigo ao argumento de que o art. 50 do ECA privilegia o processo de habilitação para adoção. Tecnicismo da lei que não deve ser empecilho para manter-se a criança com o guardião provisório em lugar de manter a mesma em abrigos públicos estes que despersonalizam as relações humanas e institucionalizam o emocional. Teoria do apego que oriunda da psicologia não pode ser ignorada pelo Judiciário. Comprovação nos autos de que os agravantes vem cuidando da criança com afeto, respeito e extremada atenção material e moral durante meses. Disser da sociedade e do poder público de proteger e amparar o menor, assegurando-lhe o direito à convivência familiar e à dignidade. Inteligência dos arts. 1 III c 227 da CF 88. Recurso a que se dá provimento para conceder a guarda provisória do menor aos agravantes, até a prolatação da sentença. (RIO DE JANEIRO NILOPOLIS 2 VARA FAM INF JUV IDO, Relator: CRISTINA TEREZA GAULIA, Data de Julgamento: 21/11/2007, SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 26/11/2007)

O relator deste deslinde prioriza o maior interesse do menor, oportunizando a permanência da criança no lar familiar, ademais ainda reconhece posteriormente a validade da adoção intuitu personae ditando que concorda ser possível que a genitora biológica faça a entrega do seu filho a outros de forma direta, não obstante afirma ainda que o tecnicismo da lei não pode torna-se empecilho para a guarda de uma criança, pois o dever é buscar assegurar a esta a convivência familiar e a dignidade.

Existem preocupações legítimas de que esse tipo de adoção possa abrir margem para a mercantilização, onde gestantes biológicas possam selecionar adotantes com base em critérios questionáveis, como status socioeconômico ou outros fatores não relacionados ao bem-estar da criança. A prioridade máxima em qualquer procedimento de adoção deve ser sempre o melhor interesse da criança. Tanto a gestante biológica quanto os adotantes devem fazer escolhas que estejam em sintonia com o bem-estar e os direitos da criança. Para garantir isso, a avaliação psicossocial desempenha um papel essencial. 

Entende-se indispensável a verificação da idoneidade do adotante para assumir a responsabilidade definitiva e irrevogável da adoção. imprescindível também quando se tratar de adoção intuitu personae de crianças e de adolescentes, mesmo que dispensável a prévia inscrição no cadastro de adotantes. (KUSANO, 2011, p. 169)

Esta avaliação visa determinar se os futuros pais adotivos possuem a capacidade emocional, financeira e psicológica necessária para proporcionar um ambiente seguro e amoroso para a criança. A legalização da adoção intuitu personae deve, igualmente, incorporar mecanismos de acompanhamento pós-adoção para garantir que a criança esteja se adaptando de maneira saudável ao novo ambiente familiar. Isso é fundamental para identificar e solucionar eventuais desafios que possam surgir após o processo de adoção. 

Entendemos que após a criança ou adolescente for morar com a nova família é importante ter um acompanhamento psicológico para que se possa ter uma avaliação e perícias psicológicas, visando analisar o adotado e o adotante através de métodos e técnicas, para tornar o processo mais humano e proporcionar uma melhor comunicação entre todos os envolvidos. (Documento eletrônico assinado por Rejane Dias (PT/PI), através do ponto SDR_56116, na forma do art. 102, § 1º, do RICD c/c o art. 2º, do Ato da Mesa n. 80 de 2016.)

O acompanhamento pós-adoção também pode oferecer apoio tanto aos pais adotivos quanto à criança, garantindo que eles tenham acesso a recursos e serviços necessários para uma transição tranquila. Por isso, é crucial que a legislação seja desenvolvida de maneira meticulosa, com um compromisso claro com o bem-estar da criança e a integridade do processo de adoção. A implementação da adoção intuitu personae no sistema jurídico brasileiro traria diversas vantagens significativas, mesmo que ainda não tenha sido oficialmente adotada. 

Quando a gestante genitora tem a possibilidade de indicar o adotante antes do nascimento da criança, teoricamente, isso poderia resultar em uma substancial redução da burocracia associada ao processo de adoção. Para embasar essa perspectiva, podemos observar as experiências de países que já adotaram esse modelo, como os Estados Unidos e a Suécia (KUSANO, 2011). Nesses países, as mães biológicas têm a liberdade de escolher as famílias adotantes, o que frequentemente acelera o processo de adoção e proporciona um ambiente familiar estável para a criança em um tempo mais curto, respeitando o maior interesse da criança.


5.CONCLUSÃO

O tema aqui tratado, a saber Adoção Intuitu Personae: Um estudo acerca da legalização no Brasil com a participação efetiva do Estado. É uma temática necessária nas discussões acadêmicas, no congresso nacional, em pesquisas, nas discussões jurídicas e em outras esferas sociais. Não podendo ser negligenciada sua realidade já existente e seus impactos sociais.  

A problematização proposta inicialmente inquirindo de que forma a legislação brasileira poderia garantir com maior eficiência e eficácia, por meio da participação efetiva do Estado, o modelo de Adoção Intuitu Personae? Se responde pois, embora não seja prevista na legislação brasileira, surge como uma alternativa eficaz para agilizar o processo de adoção, priorizando o bem-estar da criança. Ao permitir que uma gestante indique os adotantes antes do nascimento, essa modalidade de adoção busca reduzir a burocracia associada ao procedimento, proporcionando um ambiente familiar estável e amoroso desde os primeiros momentos de vida da adoção. 

Contudo, a participação efetiva do Estado é crucial nesse contexto, garantindo que os adotantes atendam aos requisitos legais mínimos por meio de acompanhamento pré e pós-adoção. Para regulamentar essa modalidade, a avaliação psicossocial se impõe, alinhada ao princípio do melhor interesse da criança. Portanto, a avaliação psicossocial desempenha um papel essencial na verificação da idoneidade dos adotantes, evoluindo para a criação de um ambiente seguro e propício ao desenvolvimento da criança. 

Apesar das recomendações legítimas sobre possíveis abusos, é imperativo considerar que a adoção intuitu personae, quando regulamentada especificamente, pode oferecer vantagens significativas, como a redução do tempo de espera e a promoção de um vínculo afetivo precoce entre a criança e os adotantes. A identificação de casos julgados com esse modelo permite evidenciar as divergências e desafios enfrentados pelos tribunais diante da falta de legislação específica, destacando o princípio do maior interesse da criança como guia para as decisões judiciais e a atuação estatal em busca do bem-estar da criança.

Ao examinar o panorama da legislação brasileira e suas garantias no contexto da Adoção Intuitu Personae, constata-se o sucesso dos objetivos almejados. O artigo não apenas contextualizou a legislação sobre esse tipo de adoção, mas também explorou a efetiva atuação do Estado, identificando casos julgados no Brasil sob esse modelo. A lacuna normativa específica para a Adoção Intuitu Personae no ordenamento jurídico brasileiro, decorrente da negligência estatal que contribui para a insegurança jurídica, apesar das decisões judiciais existentes e a morosidade no processo de adoção surge como um problema significativo, propiciando adoções ilegais e até tráfico de crianças. 

O percurso histórico de adoção, desde suas origens com fundamentos religiosos até os marcos legais estabelecidos na França em 1804 e as convenções internacionais, revela a evolução do entendimento sobre os direitos da criança. No Brasil, a trajetória normativa culminou na promulgação da Constituição de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990.  Contudo, o sistema de cadastro de adoção enfrenta desafios burocráticos, prolongando o tempo de espera e impactando o bem-estar de crianças institucionalizadas. A adoção, especialmente nesse contexto “intuitu personae”, revela um cenário complexo com desafios que podem gerar ilegalidades, estimulando práticas como o tráfico de crianças e adolescentes. 

Apesar de não ser explicitamente previsto na lei, essa abordagem destaca a importância de considerar o bem-estar da criança acima dos formalismos legais. A avaliação psicossocial da família indicada é crucial para garantir um ambiente propício ao desenvolvimento do adotando. A adoção imediata surge como uma alternativa benéfica, proporcionando estabilidade à criança desde os primeiros momentos de vida. A formação precoce de vínculos afetivos contribui significativamente para o desenvolvimento da criança, contrastando com os desafios enfrentados por aqueles adotados tardiamente, muitas vezes marcados por traumas e dificuldades. 

A participação efetiva do Estado na adoção intuitu personae é crucial para garantir o respeito aos direitos e garantias, embora a legislação brasileira não a tenha previamente explicita, os tribunais têm autonomia para interpretar e aplicar a lei conforme as especificações, priorizando sempre o interesse do menor. A legalização da adoção intuitu personae no Brasil traria vantagens significativas, agilizando o processo para permitir que uma gestante indique a adoção antes do nascimento, seguindo exemplos de outros países, como os supracitados. No entanto, essa legalização deve ser acompanhada por mecanismos rigorosos de avaliação, garantindo a idoneidade emocional, financeira e psicológica dos adotantes. 

Portanto, é crucial enfatizar a urgência de uma regulamentação mais precisa e específica para a adoção intuitu personae no Brasil, garantindo a segurança jurídica e a efetividade nos procedimentos adotivos. Destaca-se a importância da participação ativa do Estado em todas as etapas desse processo, desde a avaliação dos adotantes até o acompanhamento pós-adoção, com o objetivo de garantir a constante priorização dos direitos e interesses da criança.

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¹Artigo apresentado à Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas, como parte dos requisitos para obtenção do Título de Bacharel em Direito, em 2023.
 ²Graduanda em Direito na Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas FACISA, em Itamaraju (BA). E-mail: raquelcrm1997@gmail.com.
 ³Professora orientadora. Graduada em Direito na Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas – FACISA. Pós-graduada no Curso de Especialização em Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça, pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) – Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher. Pós-graduada no Curso de Especialização em Gestão Pública Municipal, pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Pós-graduada no Curso Lato Sensu em Processo Civil Aplicado, pela Escola Brasileira de Direito (EBRADI) – E-mail: maryanarocha@hotmail.com.