COMPARAÇÃO DOS RESULTADOS DA LIBERAÇÃO DO TÚNEL DO CARPO POR MEIO DO QUESTIONÁRIO DE LEVINE

COMPARISON OF THE RESULTS OF CARPAL TUNNEL RELEASE USING THE LEVINE QUESTIONNAIRE

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10185192


Juliano de Carvalho Villa
Gustavo Maia Barbosa
Bruna Mendes Lopes
Thiago Paim Lima
Danilo Simões Rocha


Resumo

A Síndrome do Túnel do Carpo (STC) é uma síndrome compressiva caracterizada por dor e parestesia na mão devido à compressão do nervo mediano (NM), que pode ser causada por proliferação tenossinovial e anormalidades anatômicas do punho. Estima-se que afete 3% da população e seja a neuropatia compressiva mais comum. Os fatores de risco incluem movimentos repetitivos, sexo feminino e idade avançada. O tratamento pode ser cirúrgico ou conservador. Este último está associado a maiores taxas de recorrência dos sintomas, enquanto o primeiro apresenta resultados satisfatórios na maioria dos casos. 

Objetivo: Comparar os resultados da liberação cirúrgica da STC por meio do questionário de Levine.

Métodos: Trata-se de estudo observacional e analítico, com delineamento longitudinal prospectivo. Realizou-se a aplicação do questionário de Levine junto ao paciente antes e após a cirurgia. O estudo foi dividido na análise descritiva e de associação. Os dados foram compilados em planilha de dados do Microsoft Excel (2016) e submetidos a análise estatística.

Resultados: Foram analisados 9 questionários aplicados em 8 pacientes. O escore médio das respostas pré-cirurgia foi de 3,16, enquanto o final foi 1,92. Não houve associação estatística significativa entre a diferença dos resultados do questionário com lateralidade (p=0,381) e nem com idade (p=0,966).

Conclusão: O presente estudo evidenciou uma diminuição na gravidade dos sintomas após a liberação cirúrgica do túnel do carpo por meio da comparação de escores questionário de Levine coletados antes e após 30-60 dias de cirurgia.

Palavras-chave: Síndrome do Túnel do Carpo; Questionário de Levine; Cirurgia de Mão;

Abstract

Carpal Tunnel Syndrome (CTS) is a compressive syndrome characterized by pain and paresthesia in the hand due to the median nerve (MN) joint, which can be caused by tenosynovial problems and anatomical abnormalities of the wrist. It is estimated to affect 3% of the population and is the most common compressive neuropathy. Risk factors include repetitive movements, female sex and advanced age. Treatment can be surgical or conservative. The latter is associated with higher rates of symptom recurrence, while the former has overwhelming results in most cases.

Objective: To compare the results of surgical release of the CTS using the Levine questionnaire.

Methods: This is an observational and analytical study, with a prospective longitudinal design. The Levine questionnaire was applied to the patient before and after surgery. The study was divided into descriptive and association analysis. The data was compiled in a Microsoft Excel (2016) spreadsheet and examined for statistical analysis.

Results: 9 questionnaires applied to 8 patients were analyzed. The average score for pre-surgery responses was 3.16, while the final score was 1.92. There was no significant statistical association between the difference in questionnaire results with laterality (p=0.381) or age (p=0.966).

Conclusion: The present study showed a decrease in the severity of symptoms after surgical release of the carpal tunnel by comparing Levine’s questionnaire scores removed before and after 30-60 days of surgery.

Keywords: Carpal Tunnel Syndrome; Levine Questionnaire; Hand Surgery;

INTRODUÇÃO  

O nervo mediano está localizado juntamente aos tendões flexores superficiais e profundos dos dedos e flexor longo do polegar, no túnel do carpo. A compressão desta região é conhecida como síndrome do túnel do carpo (STC), que pode ser causada por qualquer proliferação tenossinovial, anormalidade da articulação do punho, tumor ou anomalia muscular1,2. Esta síndrome é caracterizada por parestesias e queimação, principalmente à noite, que melhoram com a movimentação2

Trata-se da neuropatia compressiva mais comum da população geral, com prevalência entre 2,1% e 3%, ocorrendo mais frequentemente em mulheres entre 40 e 60 anos (6) 1,2,3. O diagnóstico pode ser feito de forma clínica e com estudo eletrofisiológico e, iniciando tratamento de forma precoce, é possível a cura completa na maioria dos casos 1. O tratamento pode ser conservador ou cirúrgico. 

O tratamento conservador da STC pode ser feito com adaptação das atividades diárias, imobilização noturna do punho, injeção de corticosteroides no canal, bem como medicações orais4. A injeção de corticosteroides no canal do carpo associada à imobilização noturna tem taxa de sucesso precoce de cerca de 80% na melhora dos sintomas. Todavia, após 12 a 18 meses, somente 22% dos pacientes permanecem assintomáticos 4.

O tratamento cirúrgico pode ser realizado de    forma aberta ou    via endoscópica,     e possui resultados satisfatórios em cerca de 90% dos casos4,5. A incidência de sintomas persistentes após a cirurgia varia entre 1% e 25%1; chegando a até 40%2. A causa mais comum é a liberação incompleta do canal do carpo4.

A aplicação de questionários para a avaliação de melhora dos sinais e sintomas após introdução terapêutica é importante para padronização e reprodução de estudo comparativo posterior. Assim, foi escolhido como ferramenta para este estudo o Questionário de Levine, instrumento já validado e utilizado habitualmente, com alta reprodutibilidade11.

MÉTODOS

Trata-se de estudo observacional e analítico, com delineamento longitudinal prospectivo. A população estudada inclui pacientes com STC de um mesmo serviço de ambulatório de mão da ortopedia, que foram encaminhados para abordagem por cirurgia aberta durante o ano de 2023. Pacientes menores de idade, com função cognitiva alterada a ponto de impedir interação para resposta do questionário ou que realizaram o procedimento com uma equipe cirúrgica distinta dos outros participantes foram excluídos do estudo. 

Dados gerais dos pacientes foram adquiridas por prontuário eletrônico e a sintomatologia foi avaliada pela aplicação do questionário de Levine junto ao paciente em dois momentos: anterior e posteriormente à cirurgia. 

O questionário utiliza de perguntas simples para identificar sintomas clássicos da síndrome, tais como dor na mão ou punho, despertares noturnos por dor, parestesias e fraquezas no punho ou mão e dificuldade de pegar e usar pequenos objetos. Além disso, também permite a avaliação da intensidade desses sintomas entre 1 e 5, progredindo de acordo com a presença e gravidade. Foi considerado sucesso cirúrgico naqueles pacientes que apresentaram melhora em mais de 50% dos sintomas descritos no questionário. 

O estudo foi dividido na análise descritiva e de associação. Os dados foram compilados em planilha de dados do software   Microsoft    Excel   (2016) e analisados por meio do programa SPSS (Statistical Package for the Social Sciences), versão 23 (IBM Corp., 2015), com testes bilaterais e nível de significância de 5%.

RESULTADOS

Foram realizados 16 questionários pré-operatórios em 13 pacientes, dos quais 5 não foram submetidos ao tratamento cirúrgico até o presente momento e 2 foram realizados por outra equipe e não tiveram seguimento. Isso resultou numa população de estudo final de 9 questionários em 8 pacientes. O escore médio das respostas pré-cirurgia foi de 3,16, enquanto o final foi de 1,92, como demonstrado na Tabela 1.

Observa-se na Tabela 2 que houve diferença antes e depois da cirurgia para as seguintes questões: Qual a intensidade da dor na mão ou no punho que você sente à noite?, Com que frequência você sente dor na mão ou no punho durante o dia?, Você tem adormecimento (perda de sensibilidade) em sua mão?, Você tem fraqueza na mão ou punho?, Você tem sensação de formigamento em sua mão?, Qual a intensidade do adormecimento (perda de sensibilidade) ou do formigamento à noite?, Com que frequência o adormecimento ou o formigamento acordaram você durante uma noite típica, nas duas últimas semanas?, Você tem dificuldade em pegar e usar pequenos objetos, tais como chaves ou canetas?, além do escore médio. Em todos os casos houve redução significativa dos valores.

A diferença do escore médio (pós menos pré-cirurgia) foi associada à lateralidade e à idade dos pacientes para verificar se melhores resultados foram influenciados pela lateralidade ou idade. Não houve associação estatística significativa entre a lateralidade e a diferença dos resultados do questionário Levine (p=0,381). Também não houve correlação significativa desta diferença com a idade dos pacientes operados (p=0,966).

DISCUSSÃO

Concordando com a literatura, que apresenta uma prevalência maior do sexo feminino5,6,7,     nosso estudo apresentou 100% de pacientes do sexo feminino, com maior prevalência de idade entre 40 e 59 anos, tal como apresentado por Gelfman et al. O acometimento da mão direita isoladamente foi mais comum em nosso estudo (69%), seguido pelo acometimento bilateral (23%) e apenas um na mão esquerda isoladamente. Estes achados fogem do padrão encontrado em outros estudos, em que o bilateral é mais prevalente9,10.

Optamos por comparar os resultados da liberação cirúrgica do túnel do carpo por meio do questionário de Levine traduzido11 devido sua alta reprodutibilidade11.

             Os resultados satisfatórios encontrados em nossa pesquisa corroboram o de outros estudos4,12. A redução significativa gravidade dos sintomas, observada pela queda dos escores médios de Levine (de 3.16 para 1.92), corrobora os achados de Zyluk et al. 

É importante salientar que o presente estudo não considerou o impacto da expectativa e compreensão da doença para justificar as respostas insatisfatórias encontradas, apesar de entendermos o impacto desses fatores no resultado da cirurgia 14

             Não observamos  complicações relacionadas ao procedimento cirúrgico, tais como lesões nervosas e vasculares, nem infecções de ferida operatória, reforçando a baixa incidência relatada na literatura 13, 15.

CONCLUSÃO

O presente estudo evidenciou uma diminuição na gravidade dos sintomas após a liberação cirúrgica do túnel do carpo por meio da comparação de escores questionário de Levine coletados antes e após 30-60 dias de cirurgia.

Este estudo não recebeu nenhum suporte financeiro de fontes públicas, comerciais ou sem fins lucrativos.

REFERÊNCIAS

1.                 KOUYOUMDJIAN   JA. Síndrome do túnel do carpo: aspectos clínico-epidemiológicos em 668 casos. Arq Neuro-Psiquiatr. 1999;57(2A):202-207.

2.                 Paula SEC de, Santos LL dos, Meirelles LM, et al.. Avaliação clínica a longo prazo – pelo sinal de Phalen, Tinel e parestesia noturna – dos pacientes submetidos a cirurgia de liberação do túnel do carpo com instrumento de Paine®. Acta ortop bras. 2006;14(4):213-216.

3.                 Paiva HR, Paiva VDGN, Oliveira EF, Rocha MA. PROFILE OF PATIENTS WITH CARPAL TUNNEL SYNDROME TREATED AT A REFERRAL SERVICE. Acta Ortop Bras. 2020;28(3):117-120.

4.                 Alves M de PT. Estudo prospectivo comparativo entre a descompressão do canal do carpo pela miniincisão transversa proximal e a incisão palmar longitudinal convencional. Rev bras ortop. 2010;45(5):437-444.

5.                 Ashworth NL. Carpal Tunnel Syndrome. Am Fam Physician.  2016 Nov 15;94(10):830-831. PMID: 27929273.

6.                 Cortez M, Costi LE, Machado GS, Ribeiro FGL, Silva PFS. Liberação endoscópica do túnel do carpo pela técnica de Agee com instrumental modificado. Rev Bras Ortop. 1997; 32:75-8.

7.                 Paula, S. E. C. de ., Santos, L. L. dos .Meirelles, L. M., Santos, J. B. G. dos ., Faloppa, F., Albertoni, W. M., & Fernandes, C. H.. (2006). Avaliação clínica a longo prazo – pelo sinal de Phalen, Tinel e parestesia noturna – dos pacientes submetidos a cirurgia de liberação do túnel do carpo com instrumento de Paine®. Acta Ortopédica Brasileira, 14(4), 213–216.

8.                 Gelfman R, Melton LJ 3rd, Yawn BP, Wollan PC, Amadio PC, Stevens JC. Longterm trends in carpal tunnel syndrome. Neurology. 2009;72(1):33-41

9.                 Middleton SD, Anakwe RE. Carpal tunnel syndrome. BMJ. 2014 Nov 6;349:g6437.    doi: 10.1136/bmj.g6437. PMID: 25378457.

10.             Dec P, Zyluk A. Bilateral carpal tunnel syndrome – A review. Neurol Neurochir Pol. 2018 Jan-Feb;52(1):79-83. doi: 10.1016/j.pjnns.2017.09.009. Epub 2017 Oct 2. PMID: 28992938.

11.              Campos, C. C. de ., Manzano, G. M., Andrade, L. B. de ., Castelo Filho, A., & Nóbrega, J. A. M.. (2003). Tradução e validação do questionário de avaliação de gravidade dos sintomas e do estado funcional na síndrome do túnel do carpo. Arquivos De Neuro-psiquiatria, 61(1), 51–55.

12.              Chammas M, Boretto J, Burmann LM, Ramos RM, Neto FS, Silva JB. Carpal tunnel syndrome – Part II (treatment). Revista Brasileira de Ortopedia (English Edition) [Internet]. 2014 Sep;49(5):437–45. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4487430/

13.              Zyluk A, Puchalski P. A comparison of the results of carpal tunnel release in patients in different age groups. Neurol Neurochir Pol. 2013;47(3):241-246.

14.              Sun PO, Walbeehm ET, Selles RW, Slijper HP, Ulrich DJO, Porsius JT; Hand Wrist Study Group. Patient Mindset and the Success of Carpal Tunnel Release. Plast Reconstr Surg. 2021 Jan 1;147(1):66e-75e. doi:   10.1097/PRS.0000000000007441. PMID: 33370055.

15.              Thurston A, Lam N. Results of open carpal tunnel release: a comprehensive, retrospective study of 188 hands. Aust N Z J Surg. 1997;67(5):283-288.

SUPLEMENTOS

Tabela 1. Análise das variáveis quantitativas de pacientes que responderam ao questionário Levine antes e 30 a 60 dias após ser submetido ao tratamento cirúrgico do túnel do carpo.

 nMédiaMedianaDesvioPadrãoMínimoMáximoAmplitudeinterquartil
Idade (anos)951,8949,009,5736,0067,0012,50
Escore médio Précirurgia93,163,090,502,363,820,91
Escore médio Póscirurgia91,922,090,681,002,821,27

Tabela 2. Análise de associação comparando os resultados do questionário Levine antes e 30 a 60 dias após o paciente ser submetido ao tratamento cirúrgico do túnel do carpo.

   Cirurgia 
PréPós P*
MedianaAmplitudeMedianaAmplitude
Qual a intensidade da dor na mão ou no punho que você sente à noite?43 – 521 – 40,016
Quantas vezes a dor na mão ou no punho acordou você durante uma noite típica, nas duas últimas semanas?31 – 521 – 30,071
Você usualmente sente dor na mão ou no punho durante o dia?22 – 321 – 30,058
Com que frequência você sente dor na mão ou no punho durante o dia?32 – 521 – 30,040
Quanto tempo em média duram os episódios de dor durante o dia?32 – 321 – 30,129
Você tem adormecimento (perda de sensibilidade) em sua mão?32 – 521 – 30,027
Você tem fraqueza na mão ou punho?32 – 521 – 30,024
Você tem sensação de formigamento em sua mão?32 – 521 – 30,024
Qual a intensidade do adormecimento(perda de sensibilidade) ou do formigamento à noite?32 – 511 – 30,034
Com que frequência o adormecimento ou o formigamento acordaram você durante uma noite típica, nas duas últimas semanas?32 – 511 – 30,017
Você tem dificuldade em pegar e usar pequenos objetos, tais como chaves ou canetas?32 – 421 – 30,010
Escore médio3,092,36 –3,822,091,00 –2,820,012

* Teste de Wilcoxon.