TRATAMENTO CIRÚRGICO DA DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO: REVISÃO DE LITERATURA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10149126


David Góes de Alcântara;
Coautor: Francisco Soares de Alcantara Neto;
Orientadora: Dr.ª Thais Gomes Falcão Borges.


RESUMO 

A Doença do Refluxo Gastresofágico (DRGE) é extremamente prevalente, sendo a afecção benigna mais comum do estômago e do esôfago. Apesar disso, ainda há bastante divergências na literatura médica quanto ao seu tratamento. Tal fato ocorre, principalmente, em relação ao tratamento cirúrgico, pois ainda não há consenso quando este deve ser indicado, incluindo quais exames pré-operatórios seriam necessários, e nem quanto à melhor técnica cirúrgica a ser empregada. Com o avanço dos inibidores de bomba de prótons (IBPs), tornando-se bastante eficazes no tratamento e melhorando os sintomas de quase todos os pacientes, o tratamento cirúrgico se tornou exceção. Este, porém, quando bem selecionado e aplicado, pode trazer enorme benefício para o paciente. O presente estudo foi realizado com base na pesquisa de artigos recentes em bases de dados como Pubmed, Springer e Scielo, tendo como objetivo principal, avaliar qual perfil de paciente se beneficia com a indicação cirúrgica e qual técnica operatória se sobrepõe, servindo como orientação para médicos e podendo melhorar a qualidade de vida de pacientes. Para isso, deve-se lançar mão de exames específicos, que não devem ser ignorados na prática clínica, como a manometria, a phmetria, a endoscopia e o esofagograma. A cirurgia antirrefluxo somente deve ser indicada após a confirmação da exposição esofágica anormal ao refluxo gástrico por estes exames. É importante salientar que a evidência de esôfago de Barrett à endoscopia constata DRGE, porém não deve ser considerada por si só indicação de cirurgia. Observou-se que a laparoscopia na cirurgia antirrefluxo diminuiu a morbidade perioperatória, o tempo de internação hospitalar e os custos em comparação a cirurgia aberta. Além disso, a correta construção da fundoplicatura reduz o risco de disfagia no pós-operatório, a herniação do fundo gástrico e a recorrência dos sintomas. Não há, porém, soberania entre as técnicas. Os estudos mostram que a fundoplicatura parcial possui uma maior taxa de recorrência em relação à fundoplicatura total. Esta por sua vez, apresenta uma maior taxa de complicação. A conduta, portanto, deve ser bem individualizada em relação ao perfil do paciente, que deve ser avaliado de forma criteriosa no pré-operatório.  

Palavras-chave: Doença do refluxo gastresofágico. Cirurgia antirrefluxo. Fundoplicatura. Laparoscopia.      

ABSTRACT 

Gastroesophageal reflux disease (GERD) is the most common benign medical condition of the stomach and esophagus. However there is some divergences what concern about treatment. This is seen especially on the surgical treatment and when it should be indicated, which is the best preoperative evaluation and which is the best technique. With the advancement of proton pump inhibitors (PPIs), becoming quite effective in treating and improving the symptoms of almost all patients, surgical treatment became an exception. This, however, when well selected and applied, can bring enormous benefit to the patient. The present study was carried out based on the research of recent articles in databases such as Pubmed, Springer and Scielo, whose main objective was to evaluate which patient profile benefits from the surgical indication and which surgical technique is better, serving as a guideline for physicians and as a way to improve the quality of life of patients. For this, specific tests should be used, which should not be ignored in clinical practice, such as manometry, phmetry, endoscopy and esophagogram. Anti-reflux surgery should only be indicated after confirmation of abnormal esophageal exposure to gastric reflux by these examinations. It is important to note that the evidence of barrett esophagus to endoscopy confirms GERD, but should not be considered an indication for surgery alone. It was observed that laparoscopy in the anti-reflux surgery decreased perioperative morbidity, length of hospital stay and costs compared to open surgery. In addition, correct fundoplication reduces the risk of postoperative dysphagia, herniation of the gastric fundus, and recurrence of symptoms.  There is, however, no sovereignty between techniques. Studies have shown that partial fundoplication has a higher rate of recurrence compared to total fundoplication. This, in turn, presents a higher rate of complication. The conduct, therefore, should be well individualized in relation to the patient’s profile, which should be evaluated carefully in the preoperative period. 

Keywords: Gastroesophageal reflux disease. Antireflux surgery. Fundoplication. Laparoscopy.     

1 INTRODUÇÃO 

A Doença do Refluxo Gastresofágico (DRGE) é um distúrbio muito comum, com prevalência crescente, podendo levar a uma considerável perda de saúde e afetar, bastante, a qualidade de vida do doente. Ela resulta basicamente da falha dos mecanismos antirrefluxo proporcionados pelo esfíncter esofagiano inferior (EEI) e pelo clearence esofágico. Seu diagnóstico não costuma ser complicado e é, geralmente, feito clinicamente baseado na presença dos sintomas típicos e na melhora do quadro após a terapia com inibidor de bomba de prótons (EL-SERAG et al., 2014).    

Dessa forma, esta afecção, por ser tão prevalente, faz parte da prática clínica diária de várias especialidades médicas, sendo, portanto, fundamental o estudo exaustivo da sua fisiopatologia e do seu manejo clínico e cirúrgico.  

Durante a residência médica, vários pacientes vinham encaminhados ao Serviço de Cirurgia Geral provenientes de Serviços de Clínica Médica e Gastroenterologia. Percebi, porém, que muitos não possuíam indicação cirúrgica. Sabemos, hoje, que o tratamento cirúrgico quando mal indicado e/ou mal efetuado pode trazer vários danos à saúde do paciente (TOWNSEND et al., 2017).  

Em relação ao procedimento, as evidências na literatura apontam que o surgimento da laparoscopia para cirurgia antirrefluxo diminuiu a morbidade Peri operatória, tempo de permanência e custo comparado com operações abertas. Apesar disso, ainda vemos falhas e efeitos colaterais neste tipo de tratamento, como disfagia, incapacidade de eructar ou vomitar, plenitude pósprandial e dor abdominal (LUNDELL et al., 2001; TOWNSEND et al., 2017).  

O resultado do tratamento cirúrgico depende, principalmente, das características individuais do paciente encontradas em um pré-operatório bem feito e da escolha da técnica adequada (CAMERON, 2004).  

Dessa forma, em nosso serviço, procurávamos sempre avaliar bem o paciente e solicitar todos os exames necessários antes da cirurgia.  

Este estudo tem, portanto, o objetivo de diminuir a má indicação cirúrgica por parte de médicos generalistas e cirurgiões gerais. Procura, também, nortear a escolha do cirurgião acerca de qual tipo de procedimento este deve realizar e, assim, proporcionar um melhor desfecho clínico para o paciente. 

Dessa forma, foi realizada uma revisão de literatura deste tema, com base em artigos científicos recentes e em livros consagrados pela classe médica. A ênfase foi dada na correta indicação cirúrgica com base na avaliação pré-operatória minuciosa, que é constantemente negligenciada, procurando sempre a individualização do paciente. Além disso, foram revisados os trabalhos comparativos entre as principais técnicas cirúrgicas.     

2 OBJETIVO  

Realizar uma revisão de literatura sobre o tratamento cirúrgico da doença do refluxo gastroesofágico, incluindo indicação, cuidados transoperatórios, técnicas cirúrgicas, complicações e seu manejo.   

3 REVISÃO DA LITERATURA 

3.1 Fisiopatologia  

A doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) é uma condição em que o refluxo de conteúdo gástrico para o esôfago provoca sintomas ou complicações que impactam na qualidade de vida. Os sintomas típicos são pirose e regurgitação, porém manifestações extra esofágicas também podem ocorrer, como asma, tosse crônica e laringite. Sua patogênese é multifatorial, envolvendo relaxamentos transitórios e baixa pressão do esfíncter esofagiano inferior (EEI). Como resultado, ocorre refluxo de ácido, bile, pepsinas e enzimas pancreáticas, causando danos à mucosa esofágica (De GIORGI et al., 2006).   

Fisiologicamente, o relaxamento do EEI, após contrações esofágicas, permite a passagem do alimento até o estômago. Em condições de repouso, o esfíncter mantém uma zona de alta pressão de 15-30 mmHg acima da pressão gástrica. Uma minoria dos pacientes com DRGE possuem uma baixa pressão esfincteriana constante que permite o refluxo quando a pressão gástrica aumenta. Isso acontece quando a pressão do esfíncter é menor que 6 mmHg (RICHTER, 1999).  

Fatores que diminuem o tônus incluem hormônios endógenos (colecistocinina, progesterona na gravidez), medicações (nitratos, bloqueadores do canal de cálcio), comidas gordurosas e chocolate e alguns hábitos como uso de cigarros, cafeína e bebidas alcoólicas (De GIORGI et al., 2006).   

Na verdade, a maioria dos pacientes com DRGE possuem um tônus de repouso normal e não apresentam hérnia hiatal. O relaxamento transitório do EEI passou a ser evidenciado em alguns estudos, estando presente em indivíduos normais durante o sono e em períodos pós-prandiais (DENT et al., 1980).   

Pacientes com DRGE possuem uma frequência semelhante de relaxamentos transitórios comparado com pessoal saudáveis, porém eles possuem uma maior porcentagem de relaxamento associado ao refluxo (MITTAL; McCALLUM, 1988). 

Os fatores que contribuem para a doença são muitos, incluindo a hérnia hiatal, deficiência do clearence esofágico, esvaziamento gástrico lento e deficiência dos mecanismos protetores da mucosa esofágica.  

A hérnia de hiato é frequentemente associada à DRGE, pois pode comprometer a eficiência do EEI. Ela está presente em 90% dos pacientes com esofagite erosiva severa, especialmente se há complicações como a estenose e o esôfago de Barrett. Um estudo avaliando os pacientes com displasia evidenciou que 96% destes pacientes possuíam hérnia hiatal maiores que 2cm (CAMERON, 1999; KAHRILAS et al., 1999).    

Apesar de que qualquer tipo de hérnia de hiato pode resultar em incompetência do EEI, a hérnia do tipo 1 (hérnia por deslizamento) é a mais comum envolvida. Ela ocorre quando a junção gastroesofágica (JGE) não se mantém na cavidade abdominal pelo ligamento frenoesofágico. (GALMICHEl; JANSSENS, 1995). 

É importante salientar, porém, que a presença de hérnia não implica necessariamente em DRGE e, portanto, não possui indicação absoluta de correção. Estudos mostraram que o tamanho da hérnia tem relação direta com a DRGE. Muitos pacientes, portanto, possuem pequenas hérnias de hiato tipo 1 e são assintomáticos, não necessitando de tratamento cirúrgico (SCHLOTTMANN et al., 2018). 

Enquanto a patogênese dos sintomas esofágicos é bem conhecida, os mecanismos por trás dos sintomas respiratórios extra esofágicos ainda não estão totalmente esclarecidos. Parecem estar implicados o contato direto do refluxo ácido com as vias aéreas superiores e o reflexo vago-vagal gerado pela acidez do esôfago distal, gerando broncoespasmo (STEIN, 2003). 

3.2 Apresentação clínica 

As manifestações típicas da DRGE são pirose e regurgitação.  

A pirose possui uma prevalência em torno de 80%. Ela ocorre em geral após a alimentação, especialmente se a alimentação for copiosa, rica em gordura, condimentada e ácida, sendo caracterizada como a sensação de queimação retroesternal que se irradia do manúbrio do esterno à base do pescoço, podendo atingir a garganta. Tipicamente, ela não irradia para as costas e não apresenta uma sensação de aperto, como na pancreatite aguda e na síndrome coronariana respectivamente. 

A regurgitação possui uma prevalência em torno de 54%. Ela representa o retorno do conteúdo ácido ou alimentos para a cavidade oral. Situações que elevam a pressão na cavidade abdominal podem piorar o sintoma. A presença de tal sintoma, frequentemente, indica progressão da doença. Pacientes podem experimentar um gosto azedo na boca, descrevendo como ácido ou bile e caracterizando a azia. 

Apesar desses sintomas poderem estar presentes em outras doenças, quando concomitantes a chance de o paciente possuir DRGE é superior a 90%. 

É importante salientar que a intensidade e frequência dos sintomas são fracos preditores da presença ou intensidade da esofagite, mas a duração da doença está associada ao aumento do risco para o desenvolvimento do esôfago de Barrett.  

Manifestações extra esofágicas são decorrentes do acometimento do trato respiratório, gerando sintomas laríngeos e pulmonares, como disfonia, laringoespamos, tosse e asma. Acredita-se que o refluxo esofágico proximal e a microaspiração de conteúdo gástrico causam injúria direta à laringe e ao trato respiratório baixo, sendo este o principal mecanismo. Outra teoria seria que a exposição ácida esofágica distal gera um reflexo vagal causando tosse e broncoespasmo. Tal fato ocorre pela inervação vagal comum entre a traqueia e o esôfago. (GALMICHE; JANSSENS, 1995). 

Definir se os sintomas extra esofágicos não possuem uma causa laríngea ou pulmonar primária pode ser desafiador. A falta de melhora de tais sintomas com a terapia de inibidor de bomba de prótons não afasta a possibilidade da DRGE ser a causadora dos mesmos. Apesar desta terapia poder melhorar ou resolver completamente os sintomas típicos, pacientes com sintomas atípicos possuem uma resposta variável a ela (WARING et al., 1995; CHANG et al., 2006). 

Isto pode ser explicado por evidências que sugerem que o ácido não é o único agente cáustico que promove injúrias laríngeas e pulmonares, como a microaspiração de bile e pepsina. Estes pacientes apresentam uma melhora em 70% dos sintomas com o tratamento cirúrgico. Eles devem, porém, ser avaliados previamente por um otorrinolaringologista e por um pneumologista para descartar afecções não gastrointestinais (MAINIE et al., 2006; WASSENAAR et al., 2011; WORRELL et al., 2013).   

A terapia antissecretória está associada a uma melhora de apenas 25% a 50% dos sintomas respiratórios nos pacientes com asma induzida por doença do refluxo gastroesofágico. E menos de 15% apresentam melhora significativa na função pulmonar (BOWREY; PETERS; DEMEESTER, 2000).  

A cirurgia antirrefluxo nestes pacientes está associada a uma melhora dos sintomas em 90% das crianças e 70% nos adultos. Dessa forma, estudos sugerem que este grupo de pacientes, quando tratados cirurgicamente, apresentam uma melhora mais significativa dos sintomas da asma, menor uso de esteroides e melhora mais acentuada da função pulmonar em relação aos tratados com terapia medicamentosa (WORRELL et al., 2013). 

4 METODOLOGIA 

Foi realizada pesquisa bibliográfica da literatura nacional e internacional, sendo utilizados como descritores-chave os termos: Doença do refluxo gastresofágico; Cirurgia antirrefluxo; Fundoplicatura; e Laparoscopia. Os critérios de inclusão incluíram relatos de caso, estudo de casos, artigos de revisão, artigos originais e meta-análises publicadas nas últimas décadas e escritas nas línguas inglesa e portuguesa. Artigos publicados nos últimos cinco anos foram selecionados, com a inclusão de alguns artigos publicados anteriormente, mas que apresentam significativa relevância para a discussão do tema. 

 As principais fontes de pesquisa foram livros-texto de Cirurgia Geral e Digestiva, bases de dados como Pubmed, Springer e Scielo. Esse material serviu como base para a elaboração e criação do estudo de revisão, que foi complementado e aprimorado pela experiência dos médicos do serviço.  

5 DIAGNÓSTICO 

Geralmente o diagnóstico é feito clinicamente baseado na presença dos sintomas típicos e na melhora do quadro após a terapia com inibidor de bomba de prótons. Entretanto, quando se pensa em indicar a cirurgia antirrefluxo para o paciente deve-se realizar quatro exames para melhor avaliação: 

  1. Phmetria ambulatorial, que confirma a elevada exposição do esôfago distal ao conteúdo ácido do estômago. 
  2. Manometria esofágica para identificar as desordens de motilidade, influenciando no tipo de cirurgia que será realizada.  
  3. Endoscopia digestiva alta, que identifica a competência da válvula antirrefluxo e as alterações da mucosa esofágica. 
  4. Esofagograma baritado para detalhar a anatomia do esôfago e do estômago, detalhando a presença de hérnia de hiato por exemplo. 

A disfagia pode estar presente nos pacientes com DRGE. Os exames acima nos ajudam a fazer o diagnóstico diferencial com outras causas de disfagia, como: estenose péptica, anel de Schatzki, neoplasias e corpo estranho. Ajudam a identificar, também, desordens de motilidade esofágica, como espasmos esofagianos difusos, esôfago em quebra nozes e acalasia. Alguns pacientes com DRGE apresentam disfagia sem qualquer alteração anatômica ou fisiológica. Nesses casos, a cirurgia costuma apresentar-se como boa opção terapêutica. 

A estenose péptica associada à DRGE é patognomônico de refluxo de longa data, que causa uma inflamação crônica da mucosa esofágica. Os pacientes podem apresentar disfagia severa nesses casos. É importante ressaltar que a phmetria pode ser falso negativa nesses indivíduos, pois a estenose pode diminuir o refluxo gástrico. Dessa forma, podemos abrir mão de determinado exame quando há estenose péptica associada ou realizá-lo apenas após devida dilatação da estenose. 

Além disso, a biopsia da mucosa deve ser feita para descartar metaplasias, displasias e neoplasias. A maioria desses pacientes são tratados com IBPs e dilatação endoscópica. Nos casos refratários a cirurgia antirrefluxo deverá ser considerada. Para aqueles que não estão aptos ou não querem realizar a cirurgia, a injeção de corticoide tem mostrado alguns resultados na dilatação (WONG et al., 2000). 

Biópsias deverão ser realizadas na suspeita de Esôfago de Barrett durante a endoscopia. A incidência de adenocarcionama nos pacientes com presença de displasia é quarenta vezes maior do que na população em geral. É de se esperar que a cirurgia diminua a exposição ácida e alcalina da mucosa esofágica e, portanto, cause regressão da metaplasia intestinal ou reduza os riscos de displasia e câncer. As evidências na literatura, porém, não são conclusivas. Há estudos que mostram uma regressão da metaplasia em torno de 55% dos pacientes tratados cirurgicamente (KAUFMAN et al., 2006).   

Uma revisão feita por Rossi et al. (2006) comparou a eficácia da fundoplicatura de Nissen e a terapia medicamentosa na regressão da displasia de baixo grau nos pacientes com esôfago de Barrett. Dezoito meses depois da terapia com altas doses de inibidores de bomba de prótons ou fundoplicatura laparoscópica, 12 de 19 (63%) dos tratados clinicamente e 15 de 16 (94%) dos cirúrgicos apresentaram uma regressão da displasia de baixo grau do esôfago de Barret (P = .03).  

A obesidade é um grande fator de risco para DRGE, pois aumenta a pressão intra-abdominal, diminui a pressão do EEI e favorece relaxamentos transitórios do EEI com maior frequência. A literatura é divergente sobre a capacidade da cirurgia antirrefluxo promover melhora dos sintomas a longo prazo nesses pacientes (LUKETINA et al., 2015). 

Nos pacientes adequadamente selecionados, o by-pass gástrico laparoscópico em Y-de-Roux é o melhor método de perda de peso e controle das comorbidades relacionadas à obesidade como a DRGE (PÉREZ; MONCURE; RATTNER, 2001; MION; DARGENT, 2014).  

6 PROCEDIMENTO CIRÚRGICO 

A fundoplicatura pode ser confeccionada de três formas: parcial anterior, parcial posterior (Toupet) e completa (Nissen). Há um grande debate na literatura sobre qual forma é mais eficaz no tratamento dos sintomas e possui menor efeito colateral. Os estudos tentam atrelar o tipo de cirurgia à avaliação pré-operatória do paciente. 

Nos pacientes que apresentam dismotilidade esofágica, tem-se sugerido a fundoplicatura parcial. Uma vez que a Nissen pode ocasionar uma maior taxa de disfagia pós-operatória nestes casos. Estudo randomizado controlado em pacientes estratificados por manometria mostrou que após um ano de cirurgia não houve diferença nos resultados na melhora dos sintomas entre a cirurgia de Nissen e a de Toupet. Disfagia foi mais frequente no grupo que realizou a fundoplicatura total (BOOTH et al., 2006).  

Entretanto, nos pacientes sem disfunção de motilidade, a cirurgia de Nissen apresenta taxas semelhantes de disfagia pós-operatória em relação a de Toupet.  

Em uma revisão de nove estudos randomizados, que avaliavam a cirurgia laparoscópica anterior, parcial posterior e total, mostrou-se que a anterior está mais relacionada com a recorrência dos sintomas. Nissen está associada a maior taxa de disfagia, mas esses pacientes requerem tratamento mínimo e não costumam serem reoperados (FEIN; SEYFRIED, 2010).    

Outra revisão foi feita por Shan et al. (2010) comparando as fundoplicaturas de Nissen e Toupet. Nenhuma diferença foi encontrada em relação a satisfação dos resultados ou em relação morbidade e mortalidade peri operatória. Em 24 estudos que avaliavam a disfagia pós-operatória, não houve diferença entre as técnicas quando a motilidade esofágica era previamente normal. Entretanto, nos pacientes com disfunção de motilidade a cirurgia de Nissen foi relacionada com uma maior taxa de disfagia. Além disso, mostrou-se que a fundoplicatura total está relacionada a uma maior taxa de empachamento e incapacidade de eructar. Esta revisão, portanto, sugere que a fundoplicatura de Toupet é o tratamento de escolha, combatendo os sintomas com eficácia e resultando em menos efeitos colaterais pós-operatórios.  

Apesar dos inúmeros trabalhos, ainda há bastante discordância em qual tipo de fundoplicatura possui um maior controle do refluxo à longo prazo e qual apresenta menos efeitos colaterais. Os estudos são heterogêneos em relação às características dos pacientes, a seleção dos mesmos e as técnicas operatórias. Dessa forma, muitos cirurgiões ainda utilizam a técnica que mais lhe adequa, não atrelando a escolha ao tipo de dismotilidade esofágica. 

7 CONCLUSÃO 

DRGE é definida como a exposição anormal do esôfago distal pelo refluxo gástrico. É causado pela falha das barreiras antirrefluxo, como o esfíncter esofagiano inferior (EEI) e o mecanismo de clearence esofágico. A maioria dos pacientes que procuram assistência médica com pirose e regurgitação não se submete a exames detalhados, pois é tratada de forma eficaz com a terapia medicamentosa, principalmente com os inibidores de bomba de prótons (IBPs).   

Os IBPs são eficientes em quase todos os pacientes que apresentam sintomas típicos. Dessa forma, o tratamento empírico com essa medicação torna-se tanto diagnóstico quanto terapêutico. Além disso, a melhora dos sintomas com esta terapia é considerada preditora de boa resposta ao tratamento cirúrgico.  

A indicação da cirurgia para confecção da válvula antirrefluxo persiste, atualmente, como tema de grandes debates. Não é incomum vermos cirurgias sendo realizadas sem o devido estudo pré-operatório. Tal fato implica negativamente nas taxas de sucesso e de complicações no pós-operatório. Nos pacientes que apresentam persistência dos sintomas mesmo com a dose máxima de IBPs deve-se realizar um estudo detalhado para confirmar o diagnóstico. A phmetria e a manometria esofágica, a endoscopia e o esofagograma são as ferramentas utilizadas para este propósito. É importante salientar que os pacientes que não possuem melhora alguma com a terapia medicamentosa geralmente são os que não possuem DRGE. 

Para aqueles pacientes que possuem elevada exposição esofágica distal ao refluxo ácido confirmada e sintomas importantes apesar da dose máxima de IBPs, a cirurgia está fortemente indicada. Outra discussão bastante comum é que as evidências endoscópicas de injúrias esofágicas como úlceras, estenoses e esôfago de Barrett corroboram o diagnóstico de DRGE, porém não são indicativas de tratamento cirúrgico por elas mesmas. 

A aplicação da laparoscopia na cirurgia antirrefluxo diminuiu a morbidade perioperatória, o tempo de internamento e os custos em comparação com a cirurgia aberta. Entretanto, esta deve ser realizada por um cirurgião experiente. A técnica e a construção correta da fundoplicatura diminui os riscos de disfagia pós-operatória causada por uma fundoplicatura indevidamente apertada, herniação do fundo gástrico e fundoplicatura escorregadia. Os sintomas recorrentes devem ser reavaliados por manometria e phmetria. A reoperação poderá ser feita novamente por via laparoscópica, frisando a necessidade de um cirurgião experiente em laparoscopia.  

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