AS DIFICULDADES VIVENCIADAS POR ESTUDANTES DE MEDICINA NO TOCANTE À SAÚDE E TRANSTORNOS MENTAIS: UMA REVISÃO INTEGRATIVA DA LITERATURA

THE DIFFICULTIES EXPERIENCED BY MEDICINE STUDENTS REGARDING HEALTH AND MENTAL DISORDERS: A INTEGRATIVE LITERATURE REVIEW

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10095600


Jéssica de Lima Rego Ferreira
Sheila Raíza Araújo Medeiros
José Lopes Pereira Júnior


RESUMO

INTRODUÇÃO: Os transtornos mentais são condições de padrões psicológicos que apresentam clínica significativa, estão associados a incapacidade, alterações dos processos afetivos e principalmente cognitivos. Existem diversos fatores relacionados a formação médica que podem ocasionar estresse e prejuízos a saúde mental dos acadêmicos. Embora exista uma significativa incidência de transtornos mentais e sofrimento psicológico entre esses estudantes, muitos não procuram uma assistência psicológica. OBJETIVO: Conhecer as dificuldades enfrentadas por acadêmicos de medicina em relação aos aspectos psíquicos. METODOLOGIA:Foi realizada uma revisão integrativa da literatura, de caráter descritivo, acerca de fatores relacionados a saúde mental dos estudantes de medicina. Foram selecionados artigos, referentes aos últimos seis anos, utilizando as bases de dados: PubMed, ScieElo e Google acadêmico. O período de coleta dos dados foi feito de 02 de fevereiro de 2022 ao dia 06 de janeiro de 2023. RESULTADOS E DISCUSSÃO: Foi realizada a análise comparativa entre 13 artigos que atingiram os objetivos propostos, demonstrando uma alta prevalência de ansiedade, depressão, síndrome de burnout e suicídio entre os acadêmicos de medicina. Os fatores de risco para o desenvolvimento de transtornos mentais estão associados com questões inerentes a formação médica, como: competitividade no ambiente acadêmico, privação de sono, alta carga horária de aulas e estudos, dificuldades em conciliar atividades de lazer com a vida acadêmica e o receio de cometer erros nas atividades profissionais. Os transtornos mentais comuns foram os mais prevalentes, e embora caracterizados como menos graves, ocasionam muitos prejuízos não só no âmbito acadêmico, mas em todo o contexto psicossocial. CONCLUSÃO: Torna-se necessária a criação de uma rede de apoio psicopedagógico de qualidade, que forneça o suporte necessário para auxiliar o estudante quanto aos aspectos de sua saúde mental, buscando, assim, evitar o desenvolvimento de transtornos mentais e suicídio.

Palavras-chave/Descritores: Estudantes de medicina; depressão; ansiedade; saúde mental; suicídio.

ABSTRACT

INTRODUCTION: Mental disorders are conditions of psychological patterns that present clinical significance, are associated with disability, changes in affective and mainly cognitive processes. There are several factors related to medical training that can cause stress and harm the mental health of students. Although there is a significant incidence of mental disorders and psychological suffering among these students, many do not seek psychological assistance. OBJECTIVE: To understand the difficulties faced by medical students in relation to psychic aspects. METHODOLOGY: A integrative review of the literature was carried out, of a descriptive nature, on factors related to the mental health of medical students. Articles were selected, referring to the last six years, using the databases: PubMed and ScieElo. The period of data collection was carried out from February 02, 2022 to January 06, 2023. RESULTS AND DISCUSSION: A comparative analysis was carried out between 13 articles that achieved the proposed objectives, demonstrating a high prevalence of anxiety, depression, burnout syndrome and suicide among medical students. Risk factors for the development of mental disorders are associated with issues inherent to medical training, such as: competitiveness in the academic environment, sleep deprivation, high workload of classes and studies, and difficulties in reconciling leisure activities with academic life and work. Fear of making mistakes in professional activities. Common mental disorders were the most prevalent, and although characterized as less serious, they cause a lot of damage not only in the academic sphere, but in the entire psychosocial context. CONCLUSION: It is necessary to create a quality psycho-pedagogical support network, which provides the necessary support to assist students with aspects of their mental health, thus seeking to prevent the development of mental disorders and suicide.

Keywords/Descriptors: Medical students; depression; anxiety; mental health; suicide.

INTRODUÇÃO

Transtornos ou doenças mentais são condições de padrões psicológicos que apresentam uma clínica significativa que, tendem a estar associados a incapacidade, alterações dos processos afetivos e principalmente cognitivos do desenvolvimento, ocasionando perturbações à nível de comportamento e raciocínio, além de mal-estar. É um estado que manifesta uma complexidade de sintomas que podem remitir ou expandir, de acordo com o grau de instabilidade ou situações em que o indivíduo está inserido (GOMES et. al., 2020).

Ingressar no ensino superior já é, por si, uma mudança abrupta no modo de vida, na forma em que o jovem lida com suas escolhas, no crescimento e desenvolvimento pessoal e, o ato de tornar-se médico acaba por ser um confuso exercício de aquisições de domínio, que resulta da comunicação de fatores genéticos e ambientais. Vale salientar que, o curso de medicina não traz tantos benefícios para a saúde do estudante, haja vista que, além do estresse que é inerente ao curso, tem-se a problemática da construção de uma identidade que se adeque a sua nova realidade, a necessidade de adquirir princípios e condutas éticas, além de, muitas vezes, uma mudança considerável do estilo de vida, que acaba levando à renuncias sociais ou pessoais (SILVA et. al., 2020).

Muito se tem discutido, recentemente, acerca da qualidade de vida dos estudantes de medicina, esta qualidade tende a ser considerada como a percepção que o próprio indivíduo tem a respeito da sua posição de vida e do contexto cultural e social em que está inserido; assim como as expectativas, padrões e preocupações que o circundam. Através disso, pode-se inferir que, a premissa de uma situação de estresse está atrelada tanto com a forma com que o indivíduo enfrenta situações divergentes de forma individual, como com as complexidades conjunturais (SILVA et. al., 2020).

Existem diversos fatores relacionados a formação médica que podem ocasionar estresse e prejuízos a qualidade de vida desses estudantes, como: competitividade no ambiente acadêmico, privação de sono, alta carga horária de aulas e estudos, dificuldades em conciliar atividades de lazer com a vida acadêmica e o receio de cometer erros nas atividades profissionais. Ademais, o contato com situações de dor, morte e sofrimento podem potencializar o medo e o estresse, uma vez que em muitos casos as instituições não estimulam a reflexão acerca do contato com o paciente e suas implicações emocionais (COSTA et. al., 2020).

As Instituições de Medicina proporcionam um ambiente estressante que tem uma alta probabilidade de prejudicar a saúde mental do discente, desempenho no âmbito acadêmico e bem-estar psicossocial, podendo ocasionar aflições e dificuldades em se relacionar. A tensão proveniente da formação médica, ocorre devido à uma alta competitividade no processo seletivo do curso, às expectativas da sociedade no que diz respeito ao papel do médico, à necessidade de aquisição de uma grande quantidade de conhecimentos, responsabilidades e ao individualismo presente na comunidade acadêmica (GRETHER et al., 2020). Ao comparar estudos brasileiros com informações da Organização Mundial de Saúde, percebeu-se que o desenvolvimento de depressão entre estudantes de medicina é sete vezes maior que na população geral (CAMPOS, 2020).

Ademais, observam-se maiores taxas de síndrome de Burnout em estudantes de medicina, essa síndrome vem do inglês to burnout, é compreendido como esgotar-se. Pode-se caracterizar como uma síndrome tridimensional: apresentando exaustão emocional, despersonalização e ausência de realização profissional. Dessa forma, o indivíduo passa a apresentar humor deprimido, diminuição do prazer em conquistas laborais, distanciamento afetivo e sintomas físicos (mialgia, cefaleia, alterações do sono, gastrointestinais e respiratórias) (CARRO, 2021). Essa Síndrome pode ocorrer em decorrência da dificuldade de adaptação do indivíduo a determinado trabalho com altas cargas de tensão e estresse. Em estudos recentes, observa-se que o Burnout acomete não somente profissionais, mas também estudantes, principalmente os acadêmicos de medicina (CORREIA, 2019).

Esse estudo tem como objetivo identificar os impactos dos transtornos mentais sofridos por estudantes de medicina e as fontes de estresse inerentes à formação médica. Vale ressaltar a necessidade de mais estudos e um olhar mais atento e empático das instituições de ensino sobre a temática.

METODOLOGIA

Esta pesquisa trata-se de um estudo de revisão integrativa da literatura, de caráter descritivo, que fornece uma junção de características, funções e a tentativa de levar compreensão das causas e efeitos acerca da saúde mental dos estudantes de medicina.

Para tal, foram utilizadas as subsequentes bases de dados: Biblioteca Eletrônica Científica On-line (SciELO), Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos (PubMed) e Google acadêmico, utilizando os seguintes descritores: “estudantes de medicina”, “depressão”, “ansiedade”, “saúde mental”, “suicídio”, “anxiety” e “medical students”, foram escolhidos conforme o DeCS (Descritores em Ciências da saúde) e relacionando-os com o operador booleano AND. O período para coleta de dados eletrônicos foi realizado de 02 de fevereiro de 2022 a 06 de janeiro de 2023.

Para a seleção dos artigos, foram utilizados os seguintes critérios de inclusão: artigos que abordassem a temática escolhida, disponíveis na língua portuguesa e inglesa, dos últimos 6 anos. Foram excluídos artigos que não se alinharam aos objetivos propostos pelo presente estudo e trabalhos com apenas o resumo disponível. Após a seleção dos artigos que atingiram os objetivos propostos, foi realizada a leitura integral, analisando as informações encontradas, discutindo tópicos e realizando comparação entre os estudos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

AutoresAno de publicaçãoObjetivoMétodoPrincipais achados
CARRO, Ana Carolina; NUNES, Rodrigo Dias2021Identificar a prevalência e fatores associados à síndrome de Burnout em estudantes de medicina.Estudo transversal com estudantes de Medicina de uma instituição privada de ensino na região Sul do Brasil. Utilizou-se o Maslach Burnout Inventory – Student Survey para a identificação da síndrome e um instrumento para a coleta de informações sociodemográficas, hábitos, rotina e situação acadêmica. Realizou-se análise descritiva dos dados e avaliaram-se associações entre as informações obtidas a partir do instrumento de coleta com a presença da síndrome de Burnout, utilizando-se razões de prevalência por meio do teste qui-quadrado ou teste de Fisher. Associações com valor de p < 0,25 foram inseridas em um modelo multivariado, em formato step-forward, utilizando-se regressão de Poisson. Foram consideradas significativas associações com valor de p < 0,05.A prevalência da síndrome de Burnout foi de 12,3%. As associações com síndrome de Burnout que possuíram valor de p < 0,25 foram “não viver com parceiro”, “residir sozinho”, “dormir até cinco horas por dia”, “ter até cinco horas semanais de lazer”, “possuir pensamento suicida” e “realizar acompanhamento psicológico”. Após inserir essas variáveis no modelo multivariado, identificou-se apenas 10% de maior probabilidade de síndrome de Burnout no estudante que relatou pensamento suicida, sendo esse o único fator associado encontrado à ocorrência de burnout (p < 0,001).
DOS SANTOS, Lais Silva et al2017Avaliar a associação entre a qualidade de vida e transtornos mentais comuns em estudantes de medicinaEstudo epidemiológico analítico, de corte transversal, realizado com 115 estudantes durante o segundo semestre de 2016.A prevalência de TMC foi de 32,2%. Observou-se uma diminuição dos domínios da qualidade de vida em indivíduos com suspeita de transtornos mentais. Foi perceptível que os domínios físico e psicológico da qualidade de vida são fatores de proteção para o desenvolvimento de transtornos mentais comuns em acadêmicos de medicina.
DE OLIVEIRA, Michelle Figueiredo; ARAUJO, Lais Moreira Borges2019Analisar a produção científica nacional e internacional acerca dos temas saúde mental e estudantes de medicinaRevisão bibliográfica realizada mediante pesquisa nos bancos de dados: PubMed e Scielo, com os descritores “ saúde mental”, “ depressão”, “ síndrome de burnout”, “mental health”, “students, medical”, “depression” e “burnout syndrome” no período de 2015 a 2019.A saúde mental do estudante de medicina possui maiores prejuízos quando comparado a população em geral, sendo observado pelo desenvolvimento da Síndrome de Burnout, depressão e ideação suicida.
GRETHER, Eduardo Otávio et al2020Identificar a prevalência de TMC entre os estudantes de Medicina da Universidade Regional de BlumenauEstudo transversal, realizado de agosto a outubro de 2017, com 340 alunos do curso de Medicina. Para o rastreamento de TMC foi utilizado o Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20)A prevalência de TMC foi de 50,9%. Os TMC foram associados a carga horária média por dia superior a 12 horas, menos de uma hora de lazer por dia, sentir que não recebe apoio emocional que é necessário, ter história médica de doença psiquiátrica, utilizar antidepressivo, nunca ter feito psicoterapia e ser usuário de álcool e outras substâncias.
COSTA, Deyvison Soares et al2020Estimar a prevalência de sintomas de estresse, depressão e ansiedade dos estudantes de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, associando-os com outros fatores.Estudo quantitativo epidemiológico, de caráter transversal. Os participantes da pesquisa foram estudantes de Medicina da UFRN. Foram aplicados 288 questionários, sendo validados 279.66,3% dos acadêmicos tinham estresse e a maioria se encontrava na fase de resistência (58,4%) com predomínio de sintomas psicológicos (42,3%). 28% dos estudantes apresentaram sintomas depressivos: 51,3% com sintomas de depressão leve a moderada, 35,9% com sintomas de depressão moderada e 12,8% com sintomas de depressão grave. 66,3% dos estudantes apresentaram sintomas de ansiedade em grau mínimo.
CORREIA, Marley Moreira et al2019Identificar a produção científica sobre síndrome de burnout e ideação suicida entre estudantes de medicina e analisar as produções selecionadas.Revisão bibliográfica realizada a partir da seguinte pergunta norteadora: Qual a produção científica sobre Síndrome de Burnout e Ideação Suicida entre estudantes de medicina? Os critérios de inclusão foram trabalhos publicados entre 2008 a 2018 e os critérios de exclusão foram teses, dissertações e monografias.Demonstrou que a síndrome de burnout está associada a uma maior probabilidade de ideias suicidas subsequentes. O suicídio é a segunda causa de morte entre os acadêmicos de medicina, ficando atrás apenas dos acidentes. Foi observado que alunos de medicina com melhor desempenho estão em um grupo de maior risco para a ocorrência de Síndrome de Burnout e suicídio.
ROCHA, Igor Lima; DA SILVA VARÃO, Fillype; NUNES, Jonatha Rospide2020Estimar a prevalência de TMC em estudantes de medicina a região norte do Brasil.Estudo exploratório e quantitativo. Foram aplicados formulários de duas etapas, sendo a primeira para caracterizar o perfil sociodemográfico dos participantes e a segunda parte para aplicação de um questionário SRQ 20 (Self Report Questionnaire).82,95% dos participantes foram classificados como rastreio positivo para transtornos mentais comuns. Demonstrando alta prevalência para os transtornos mentais comuns na população entrevistada e que os fatores associados estão relacionados aos aspectos sociodemográficos. Foi constatado que a pandemia da Covid-19 contribuiu para a alta prevalência desses transtornos.
MENDES, Tâmaro Chagas; DIAS, Ana Catarina Perez2021Identificar as prevalências (de depressão, ansiedade e estresse entre estudantes de medicina), os instrumentos de avaliação utilizados e os fatores associados na literatura nacional.Revisão da literatura realizada na base de dados Scielo e na Biblioteca Virtual em SaúdeA depressão foi o transtorno mais avaliado e os sintomas de estresse apresentaram a prevalência mais alta. Os fatores associados foram as características pessoais dos estudantes, questões familiares e financeiras, a percepção do estudante sobre seu desempenho acadêmico, fatores que afetam a saúde e a qualidade de vida, aspectos psicológicos como estresse e histórico de acompanhamento psiquiátrico.
ESTRELA, Yoshyara da Costa Anacleto et al2018Analisar as fases do estresse e seus correlatos com características de saúde e demográficas de estudantes de medicina de uma faculdade do interior da Paraíba.Estudo descritivo, transversal e quantitativo. A amostra foi composta por 138 alunos do curso de Medicina.21,02% dos acadêmicos não apresentaram estresse e 78,98% apresentaram: 0,72% foram caracterizados na fase de alerta; 61,59% na de resistência e 16,67% na de exaustão. Acadêmicos do sexo feminino, sem bolsa de estudo, que pensam em desistir do curso, utilizam medicamento e que não procuram tratamento psicológico possuem maiores indíces de estresse nas fases de resistência e exaustão.
MACEDO, Juliane et al2020Compreender a relação entre as novas metodologias ativas e seu impacto, junto ao isolamento social, nos estudantes de medicina da UniEVANGÉLICA, além de identificar possíveis formas pelas quais os estudantes podem estar lidando com as mudanças no contexto da COVID-19Foi elaborado um relato de caso, a partir das vivências acompanhadas pelo Núcleo de Apoio Psicopedagógico ao Discente do curso de medicina.O fornecimento de serviços de escuta ao estudante é uma forma significativa de promoção à saúde, diminuição de estresse e de desenvolvimento de atitudes adaptativas saudáveis por parte dos estudantes de medicina.
SOUZA, Gabriela Fonseca de Albuquerque et al.2022Determinar a prevalência e os fatores associados aos sinais e sintomas de ansiedade e depressão nos estudantes de Medicina durante o distanciamento social devido à pandemia pela Covid-19.Estudo de corte transversal entre o período de maio a junho de 2020, com acadêmicos de Medicina do Pernambuco. Foi realizado um questionário online pelo Google Forms com características sociodemográficas e clínicas e utilizada a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão.Os fatores associados ao maior risco de sinais e sintomas de ansiedade foram sexo feminino, reduzir ou aumentar o tabagismo, aumentar ou não alterar o consumo de medicamentos, diminuir ou não ter momentos de lazer, não preparação da faculdade para o ensino a distância, ter EAD antes do período da pandemia e redução do rendimento escolar. Em relação a depressão, nota-se associação com: aumentar ou não alterar o uso de medicamentos, diminuir momentos de lazer, faculdade não ter se preparado para o EAD, redução do rendimento escolar e raça parda.
SACRAMENTO, Bartira Oliveira et al2021Estimar a prevalência e os fatores associados a sintomas de ansiedade e depressão em estudantes de Medicina de uma capital do Nordeste brasileiro.Estudo de prevalência com 1.339 alunos dos 12 semestres do curso de Medicina. Foi realizado um questionário socioeconômico, comportamental e demográfico. O teste de qui-quadrado foi aplicado para verificar as diferenças entre sintomas de ansiedade e depressão e as variáveis socioeconômicas e comportamentais.Observou-se uma prevalência de 30,8% para ansiedade e 36,0% para depressão. A razão de prevalência bruta e ajustada para sintomas de ansiedade teve associação significativa com sexo, idade e orientação sexual. A razão de prevalência para sintomas de depressão teve associação significativa com sexo, cor da pele e orientação sexual.
KUBRUSLY, Marcos et al.2021Conhecer o efeito da nomofobia nos estudantes de Medicina de uma faculdade privada e sua associação com depressão, ansiedade, estresse e rendimento acadêmico.Foi realizado um estudo observacional de corte transversal A amostra foi composta por estudantes do curso de Medicina do Centro Universitário Christus. O distúrbio foi mensurado por meio do Questionário acerca da Nomofobia (NMP-Q). A depressão, a ansiedade e o estresse foram avaliados pelo instrumento DASS-21. Já o rendimento acadêmico foi mensurado por meio do IRA.
A nomofobia pode aumentar a ansiedade, o estresse e a depressão, levando a redução do rendimento acadêmico. 99,7% apresentaram algum grau de nomofobia, e 64,5% possuíam nível moderado ou grave de nomofobia. Mais da metade dos estudantes apresentaram graus superiores ao estresse de nível leve, e 19,5% e 11,2% dos acadêmicos apresentaram, respectivamente, ansiedade e depressão graves.


Foi realizada uma análise comparativa entre 13 artigos que alcançaram os objetivos propostos pelo presente estudo, demonstrando uma elevada prevalência de ansiedade, depressão, síndrome de burnout e suicídio entre os acadêmicos de medicina. Como aponta Dos Santos et. al. (2017, n. 4), os processos pelos quais o indivíduo passa durante a formação médica geram importantes e graves estressores que acabam por desencadear uma série de transtornos mentais, dentre eles, os transtornos mentais comuns (TMC). Para Dalgalarrondo (2018), tem-se duas categorias principais dentro dos TMC que são: os transtornos de ansiedade e os transtornos depressivos; tal estudo ainda ressalta que há uma prevalência maior destes transtornos no sexo feminino, mais especificamente entre os 15 a 24 anos, faixa etária que, coincidentemente ou não, corresponde com o período em que estes jovens estão ingressando no ensino superior.

É importante ressaltar que, os TMC estão inseridos na classificação de menos graves, porém, os mais prevalentes transtornos mentais. Geralmente, esses transtornos desencadeiam no indivíduo uma série sintomas que englobam desde queixas sintomáticas, como o exemplo de cefaleia, tremores, taquicardia, a dificuldades de concentração, irritabilidade e insônia. Outro ponto importante a ser analisado é que, devido a esses transtornos a qualidade de vida do estudante acaba sendo afetada, e não apenas no âmbito acadêmico, mas sim em todo o aspecto biopsicossocial (DOS SANTOS et. al., 2017).

A exposição a fatores estressantes na formação médica, são importantes fatores de risco para a ocorrência de problemas, como ansiedade, depressão, Síndrome de Burnout e ideação suicida (OLIVEIRA e ARAUJO et. al., 2019). Os transtornos mentais menores são prevalentes entre os estudantes de medicina e podem ocasionar depressão, ansiedade, sintomas psicossomáticos, irritabilidade, cansaço, redução da concentração e esquecimento (GRETHER et al., 2020).

Embora exista uma significativa incidência de transtornos mentais e sofrimento psicológico entre esses estudantes, muitos não procuram uma assistência psicológica, devido a fatores, como: ausência de tempo, preconceito quanto à doença mental, dificuldades de acesso a um apoio profissional e ao custo elevado do tratamento (COSTA et. al., 2020).

Estudos indicam que a síndrome de Burnout é duas a três vezes mais prevalente nos profissionais médicos do que em qualquer outra profissão. Essa associação se dá pela realidade vivenciada por quem exerce a medicina, mas vale ressaltar que em muitos casos os fatores causadores já estão presentes durante a graduação, afetando também estudantes de medicina (CARRO, 2021). Em um estudo em 62 escolas médicas norte-americanas e três canadenses constata o suicídio como segunda causa de morte entre os estudantes de medicina ficando atrás apenas de acidentes. Alunos com melhor desempenho encontram-se em um grupo de alto risco para apresentar a síndrome de Burnout e de suicídio. Desse modo, a faculdade de medicina pode ser considerada um ambiente de toxicidade psicológica, sendo de extrema importância a promoção de atendimento psicopedagógico por parte das instituições e o estímulo a debates acerca dos fatores de risco para a saúde mental e as limitações da profissão médica (CORREIA, 2019).

Destaca-se que vários cursos do ensino superior apresentam estudantes que desenvolveram algum tipo de transtorno mental comum, mas os do curso de medicina são os mais acometidos por esses transtornos. Foi possível notar que isso ocorre devido ao grande número de dificuldades que esses estudantes tiveram que enfrentar desde a decisão de cursar medicina. Com base nisso, vale ressaltar que, a complexidade se inicia no tempo em que muitas vezes o jovem passa para conseguir a aprovação no curso; após isso mudam-se as demandas e todo o universo em que o jovem se insere (ROCHA et. al., 2020).

A esse respeito, Rocha et. al. (2020) relata que:

(…) os fatores de estresse, competitividade de seleção no processo de ingresso, sobrecarga de estudo, quantidade de responsabilidade e dificuldades de realização a uma vida social adequada, se configura em grande fator de risco ao desenvolvimento de TMC. Além dos fatores citados, há fatores associados relacionados a pouca atividade física e lazer, consumo insuficiente de frutas e de hortaliças, alto consumo de bebidas alcóolicas e habito de fumar entre os estudantes brasileiros, que podem contribuir para o desenvolvimento de TMC (ROCHA et. al., 2020, p. 102989-103000).

Os estudantes de medicina são mais acometidos pela ansiedade quando comparados com o restante da população. Existem diversos fatores que podem justificar esse fato. Nota-se que as escolas médicas pré selecionam pessoas que têm tendência a serem mais neuróticas e perfeccionistas, e esses traços de personalidade acabam por predispor o indivíduo a ansiedade. Esse problema pode ser precipitado quando não é possível cumprir as grandes metas auto estabelecidas pelo acadêmico com sentimento de ambição (QUEK, 2019).

Os transtornos mentais mais prevalentes em estudantes de medicina são: depressão, ansiedade e estresse. Somando-se a estes, a ideação suicida associada a depressão é motivo de grande preocupação. Quanto a ansiedade, podemos citar como fatores associados: ser jovem, sexo feminino, solteiro, estar no quinto ano de curso, tempo reduzido de sono, estar nos períodos iniciais ou nos primeiros ciclos do curso, sentimento de cobrança pelos pais, uso de drogas psicoativas e outros. Em relação a depressão, os principais fatores associados são: sexo feminino, ser jovem (18 a 25 anos), solteiro, sentimento de cobrança quanto ao curso, pouco tempo de sono, estar no segundo ano de curso, ausência de apoio emocional, afastamento do âmbito familiar, estar no ciclo clínico e falta de atividades de lazer. No que se refere ao estresse, os fatores associados são: sexo feminino, ser jovem, estar nos períodos iniciais do curso, competitividade acadêmica, alterações no estilo de vida, dificuldade de adaptação com a metodologia de ensino da faculdade e aspectos financeiros (MENDES, 2021).

Os transtornos mentais prejudicam diretamente a qualidade de vida do estudante de medicina, o estresse constante durante a graduação pode ser um dos principais fatores que desencadeiam problemas psicológicos, afetando os diversos aspectos da vida do indivíduo. O estresse trata-se de uma resposta do organismo perante determinada pressão sobre o sistema orgânico, sendo assim, uma forma de adaptação às demandas do meio, podendo ocasionar prejuízos psíquicos, emocionais e físicos. As consequências desse estresse constante acabam por gerar problemas como insatisfação pessoal e fragilidade no organismo, reduzindo até mesmo a resistência às doenças. O estado de tensão ocasiona reações fisiológicas conhecidas como “Síndrome da adaptação geral”. Essa síndrome pode ser dividida em três fases: de alerta, resistência e exaustão. Na fase de alerta a liberação de adrenalina promove motivação e energia para o indivíduo, o que leva a um sentimento constante de plenitude. Na fase de resistência o indivíduo tenta lidar com os fatores causadores de estresse na tentativa de manter a homeostase interna. Caso os fatores estressores persistam, acontece uma ruptura na resistência, passando para fase de exaustão, nessa fase podem surgir doenças graves como depressão e infarto ( DA COSTA ANACLETO ESTRELA, 2018).

Dessa maneira, levando em consideração a existência de fatores estressores na vida dos acadêmicos, estudos mostram que os estudantes do curso de medicina são os mais suscetíveis a responder ao estresse de forma não adaptativa. É notório que a profissão médica é considerada uma oportunidade de satisfação pessoal e de possibilidades quanto aos desejos materiais, intelectuais e emocionais. Todavia, existem diversos momentos extremamente estressantes para o acadêmico de medicina. Observa-se que na fase de resistência o indivíduo apresenta principalmente redução da memória, dificultando a aprendizagem de conteúdos necessários para a realização de inúmeras tarefas, gerando prejuízos também para vida acadêmica (DA COSTA ANACLETO ESTRELA, 2018).

Em situações de estresse o estudante de medicina pode manifestar sentimentos de medo, raiva e culpa, incompetência, que de alguma forma pode relacionar-se com o adoecimento, como apresentar sintomas depressivos, retraimento de suas emoções, diminuição do desempenho acadêmico, abuso de substâncias e suicídio. Com a ocorrência da pandemia da covid-19, esses problemas foram intensificados. É de extrema importância serviços de apoio psicopedagógico aos estudantes de medicina, tendo como objetivo aliviar o seu sofrimento psíquico. Nesse sentido, reuniões de turma mostram-se essenciais à criação de redes de apoio entre estudantes e professores o que proporciona uma melhora da comunicação, um fluxo coeso de informações, a redução de sintomas de estresse e de ansiedade. Tornam-se necessárias ofertas para escuta qualificada e apoio psicológico, dando ao estudante um suporte para instalação de estratégias adaptativas saudáveis. (MACEDO, 2020).

Um estudo desenvolvido no decorrer da pandemia da Covid-19 demonstrou uma elevada prevalência de sintomas ansiosos (46,1%) e depressivos (35,4%) em acadêmicos de medicina. Tal prevalência tem associação com fatores estressores presentes na formação médica, como: alta carga horária, quantidade elevada de disciplinas, cobrança por parte da sociedade e do próprio estudante e as situações de sofrimento e morte. Os fatores mencionados fomentam a vulnerabilidade do acadêmico nos aspectos psicossociais, todavia, a pandemia da Covid-19 acabou por intensificar os graus de estresse e ansiedade em indivíduos hígidos, e elevou os sintomas em pessoas com transtornos já preexistentes (SOUZA, 2022).Outro estudo realizado com 458 estudantes de medicina mostrou uma prevalência de sintomas ansiosos de 30,8%, sendo:19,9% grau leve, 8,5% grau moderado e 2,4% grave. A prevalência de depressão foi de 36%, sendo: 28,8% grau leve, 5,9% moderada e 1,3% grave. (SACRAMENTO, 2021).

Ademais, uma pesquisa desenvolvida com estudantes de medicina evidenciou uma grande correlação da nomofobia com a ocorrência de ansiedade, depressão e estresse, ocasionando redução do rendimento acadêmico. Dos 292 participantes, quase a totalidade (99,7%) apresentou nomofobia, sendo que mais da metade dos acadêmicos apresentou grau moderado a grave de estresse, 19,5% demonstrou ansiedade grave e 11,2% depressão grave. Demonstrando, assim, a necessidade da realização de medicas de tectologias educacionais por parte das instituições, no intuito de orientar os estudantes quanto ao uso excessivo do celular e os prejuízos decorrentes desse problema para a saúde mental (KUBRUSLY, 2021).

CONCLUSÃO

Nessa revisão foi possível notar uma alta prevalência de estresse, ansiedade, depressão, síndrome de burnout e suicídio em acadêmicos de medicina. Os fatores relacionados à qualidade de vida estão associados com o desenvolvimento dos problemas psíquicos, uma vez que existem fatores de risco inerentes à formação médica, como: rotina estressante, competitividade acadêmica, longa jornada de estudos, exposição a episódios de dor e sofrimento, falta de tempo de lazer, sobrecarga de disciplinas, cobrança quanto ao desempenho acadêmico, expectativas da sociedade e autocobrança. Tais questões acabam por potencializar os riscos de ocorrência de tais transtornos. Observou-se a importância da criação de uma rede de apoio psicopedagógico de qualidade, que forneça o suporte necessário para auxiliar o estudante quanto aos aspectos de sua saúde mental, buscando, assim, evitar o desenvolvimento de transtornos mentais e suicídio.

O presente estudo concluiu também que os transtornos mentais comuns, apesar de classificados como menos graves, são os mais prevalentes. Entretanto, ocasionam grandes prejuízos para a saúde mental do estudante de medicina, não só no contexto acadêmico, mas em todo o âmbito biopsicossocial do indivíduo, sendo capazes de gerar, além de redução do rendimento acadêmico, sintomas psicossomáticos. Vale ressaltar que parcela significativa dos estudantes não procura por ajuda profissional, devido a problemas, como: ausência de apoio emocional e familiar, falta de acesso e alto custo do tratamento.

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Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito das exigências para obtenção do título de Bacharel em Medicina do Instituto de Educação Superior do Vale do Parnaíba (IESVAP).

Orientador: José Lopes Pereira Júnior