PRESENÇA DE CORPO ESTRANHO INTRAOCULAR EM FELIS CATUS – RELATO DE CASO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10074980


Aieska Rosa Schodder
Caio Diego Prates
Henrique Marçal Da Silva
Rafaela Feitosa Silveira
Samira Lessa Abdala
Laise Yamashiro


OBJETIVO

Neste trabalho, relata-se um caso clínico que evidencia a presença de um corpo estranho intraocular na câmara anterior do globo ocular esquerdo de um paciente felino sem raça definida (SRD). O diagnóstico e tratamento foram conduzidos por uma médica veterinária oftalmologista, empregando técnicas específicas para a oftalmologia veterinária. O acompanhamento do caso incluiu a descrição dos exames realizados, a execução do tratamento cirúrgico para remoção do corpo estranho e a fase pós-operatória.

ESTUDO DE CASO

Foi atendido na clínica veterinária fundação Alexandra Schlumberger em Sorocaba – SP, um paciente Felis catus, macho, rajado, SRD, com 3 anos e 10 meses, pesando 5,5 kg. Com histórico de presença de corpo estranho ocular há 7 dias (dia zero 07/12/2022). A responsável referiu que o animal tem hábito de ficar no jardim, escalar árvores e que no dia zero voltou do quintal com o olho esquerdo fechado e com lacrimejamento. No mesmo dia foi realizado a remoção de espinho de jardim Picão-preto (Bidens pilosa) do olho esquerdo do animal. Após a remoção da estrutura notou lesão com aspecto de arranhadura no olho. No pronto atendimento o paciente apresentou teste positivo de fluoresceína. Foi medicado com tramal e maxicam. Foi prescrito: tobramicina colírio, uma gota no olho esquerdo a cada 6 horas, durante 10 dias, Cetrolac colírio, uma gota no olho esquerdo a cada 8 horas, durante 10 dias até o próximo retorno.  Orientou-se realizar limpeza com soro fisiológico gelado e gaze, sempre que preciso; Intervalo de 10 minutos entre os colírios que coincidirem horário, em caso de prurido na face, é obrigatório o uso de colar elizabetano.  A responsável foi orientada se caso o animal não melhorasse seria encaminhado para oftalmologista.

No dia 12 (19/12/2022): Primeiro retorno com o clínico geral. Ao teste de fluoresceína apresentou-se negativo, com grande quantidade de fibrina em câmara anterior, foi orientado manter o tratamento prescrito anteriormente e retorno após 5 dias para uma nova avaliação.

No dia 17 (24/12/2022): Segundo retorno, após nova avaliação, o animal foi encaminhado para o médico (a) veterinário (a) oftalmologista.

No dia 17 (24/12/2022), durante a realização da consulta oftalmológica, a responsável referiu conforto ocular, porém negou melhora do aspecto da lesão e acredita que tenha espinhos dentro do olho esquerdo do animal. O paciente não apresentou déficit visual, acúmulo de secreção, hiperemia, prurido, blefarospasmo, fotofobia ou dor. O tratamento medicamentoso prescrito pelo clínico foi realizado corretamente, o uso do colar elizabetano não foi realizado. 

Tabela 3 – Quadro 1 Avaliação de exame físico do olho direito.

Exame físico olho direito:
Reflexo pupilar direto: (+ ) Sim ( ) Não
Reflexo pupilar consensual: (+ ) Sim ( ) Não
Deambulação: ( + ) Sim ( ) Não
Ameaça: ( + ) Sim ( ) Não
Schimer: 25 mm/min
PIO: 16 mmHg
Bulbo ocular: Sem alterações
Pálpebra: Sem alterações
Secreção: Sem alterações
Córnea: Sem alterações
Teste de Fluoresceína: Negativo
Teste de Jones: Positivo
Câmara anterior, íris e pupila: Sem alterações Lente: Sem alterações
Fundo e vítreo: Sem alterações

Tabela 4 – Quadro 2 Avaliação de exame físico do olho esquerdo.

Exame físico olho esquerdo:
Reflexo pupilar direto: ( + ) Sim ( ) Não
Reflexo pupilar consensual: ( + ) Sim ( ) Não
Deambulação: ( + ) Sim ( ) Não
Ameaça: ( + ) Sim ( ) Não
Schimer: 27 mm/min
PIO: 14 mmHg
Bulbo ocular: Sem alterações
Pálpebra: Sem alterações
Secreção: Sem alterações
Córnea: estrutura (corpo estranho) intra estromal –
inicia em estroma anterior até intracameral às 2h + úlcera de córnea às 2h.
Fluorescência: +
Teste de Jones: +
Câmara anterior, íris e pupila: presença de fibrina (reação ao corpo estranho)
na câmera anterior Lente: Sem alterações
Fundo e vítreo: Sem alterações

Fonte: Yamashiro, 2022..

Ao término da avaliação oftalmológica, concluiu-se que o animal apresentava corpo estranho intraestromal e em câmara anterior do olho esquerdo, além de presença de úlcera de córnea em olho esquerdo (imagens 1 e 2).

Tratamento em olho esquerdo: Tobramicina, uma gota, a cada 6 horas, até novas recomendações, Cetrolac, uma gota, a cada 12 horas durante 5 dias, até novas recomendações retorno em 7 dias.

Figura 11 – Imagens 1 e 2. Imagens fotográficas de olho esquerdo, paciente felino, realizadas no décimo sétimo dia após o trauma, na primeira consulta com oftalmologista, imagem 1 – frontal: Seta vermelha presença de[U1][U2][U3]  fibrina em faixa em câmara anterior com acometimento desde as 2h até as 8h passando pelo eixo visual e presença de edema de córnea central. Imagem 2 – lateral: Seta amarela – presença de fibrina em faixa em câmara anterior com acometimento desde as 2h até as 8h passando pelo eixo visual e presença de edema de córnea central.

Fonte: Yamashiro, 2022.

No dia 36 (12/01/2023). Durante o período de acompanhamento, a tutora relatou que o olho do animal continuou apresentando um aumento na hiperemia ocular. Além disso, constatou-se uma maior quantidade de fibrina ao redor da estrutura, corpo estranho. Durante o exame de ultrassom ocular, foi possível observar a presença da estrutura na córnea e na câmera anterior, sem comprometimento de outras estruturas anatômicas.

Tabela 5 – Exame oftálmico do dia 36.

OLHO DIREITO:OLHO ESQUERDO:
Ameaça: positivoAmeaça: positivo
RPL direto positivo, consensual positivoRPL direto positivo, consensual positivo
Dazzle: PositivoDazzle: positivo
Ausência de hiperemia conjuntivalAusência de hiperemia conjuntival
PIO: 18 mmHgPIO: 14 mmHg
Fluoresceína: NegativoFluoresceína: Negativo

Flare: Negativo

Fonte: Yamashiro, 2022.

Tratamento em olho esquerdo: Ster colírio (acetato de prednisolona ), uma gota, a cada 8 horas, até novas recomendações.

Figura 12 – Imagens 3 e 4: Imagens fotográficas de olho esquerdo, paciente felino, realizadas no trigésimo sexto dia após o trauma, no retorno com oftalmologista, imagem 3 – frontal: Seta vermelha presença de fibrina mais organizada e em maior quantidade quando comparada à foto anterior em faixa em câmara anterior com acometimento desde as 2h até as 8h passando pelo eixo visual, ausência de edema de córnea. Imagem 4 – dorsal: Seta amarela – presença de fibrina mais organizada quando comparada à foto anterior em faixa em câmara anterior com acometimento desde as 2h até as 8h passando pelo eixo visual, ausência de edema de córnea

Fonte: Yamashiro, L. 2022

No dia 43 (19/01/2023) Durante a avaliação clínica do animal, foi observado que o mesmo se encontrava em bom estado geral, não apresentando alterações significantes no bulbo ocular. Além disso, no decorrer do exame oftalmológico, não foram caracterizadas quaisquer alterações dignas de nota.

Figura 13- Imagens 5 e 6: Imagens fotográficas de olho esquerdo, paciente felino, realizadas no quadragésimo terceiro dia após o trauma, no retorno com oftalmologista, imagem 5 – frontal: Seta vermelha presença de fibrina em maior quantidade quando comparada à foto anterior em faixa em câmara anterior com acometimento desde as 2h até as 8h passando pelo eixo visual, ausência de edema de córnea. Imagem 6 – frontal: Seta amarela – presença de fibrina em maior quando comparada à foto anterior em faixa em câmara anterior com acometimento desde as 2h até as 8h passando pelo eixo visual, ausência de edema de córnea.

Fonte: Yamashiro, 2022

IMAGENS ULTRASSONOGRÁFICAS REALIZADAS NO TRIGÉSIMO QUARTO APÓS TRAUMA

O exame de ultrassonografia foi executado após instilação de 1 gota de colírio anestésico de cloridrato de proximetacaína a 0,5% no bulbo ocular esquerdo e esperado o tempo de ação de 10 minutos,  para iniciar o exame. 

Foi realizado a ultrassonografia ocular com auxílio do transdutor linear do ultrassom my lab gamma sl1543 e gel estéril a base de água, não irritante e de fácil remoção.

Diretamente sobre a córnea do paciente. A finalidade do Ultrassom ocular no seguinte caso, teve intuito de observar a presença de corpo estranho e sua localização, para planejamento cirúrgico e diagnóstico diferencial. 

Figura 14 – Imagem ultrassonográfica de olho esquerdo do paciente felino em corte axial horizontal demonstrando presença de corpo estranho em estroma corneano e câmara anterior. Profundidade de 22mm e no Ganho de 73%.

Fonte: Araújo. N. 2023.

Figura 15 – Imagem ultrassonográfica de olho esquerdo do paciente felino demonstrando presença de corpo estranho em estroma corneano e câmara anterior com medida de comprimento:4,2mm e fibrina em cama anterior aderida ao endotélio corneano.

Fonte: Araújo. N. 2023.

Figura 16 – Imagem ultrassonográfica de olho esquerdo do paciente felino demonstrando presença de corpo estranho em estroma corneano e câmara anterior com medida de espessura:0,9mm e fibrina em cama anterior aderida ao endotélio corneano.
Profundidade de 30 mm e no Ganho de 73%

Fonte: Araújo. N.2023.

EXAMES PRÉ-OPERATÓRIOS:

Hemograma, função renal e albumina dentro dos padrões de normalidade para a espécie e idade. Paciente apto para o procedimento cirúrgico.

Figura 17 – Imagem de exame eletrocardiograma, sequência 16A, 16B e 16C.

Figura 17 A – Eletrocardiograma de superfície pré-cirúrgico, em D2 ganho 2N, velocidade 50 ms. Ritmo SINUSAL

Figura 17 B – Eletrocardiograma de superfície, em D2 ganho 2N, velocidade 50 ms, após aplicação de medicação pré-anestésica. Bloqueio de Ramo Direito Incompleto.

Figura 17 C – Eletrocardiograma de superfície em D2 ganho 2N, velocidade 50 ms, pós-operatório imediato. Ritmo Sinusal.

2.9. ANESTESIA:

Tabela 6 – Fármacos utilizados no procedimento anestésico no felino.

Procedimento Anestésico
EtapaMedicaçãoDoseVia
Pré-AnestésicoDexmedetomidina2,5 mcgIM
Tramadol1 mg/kgIM
InduçãoCerâmica0,3 mg/kgIV
Propofol1,5 mg/kgIV
ManutençãoRemifentanil8 mcg/kg/hIV
Propofol10 mcg/kg/minIV
Rocuronio0,02 mg/kgIV

Fonte: Yamashiro, 2022

A cirurgia para remoção do corpo estranho intraocular ocorreu no dia 02 de fevereiro de 2023, após o resultado dos exames, foi realizado o acesso venoso para procedimento anestésico, conforme descrito no quadro 03.

3. REMOÇÃO CORPO ESTRANHO:

A intervenção cirúrgica para remoção do corpo estranho em estroma corneano e câmara anterior foi realizada com auxílio de magnificação por microscópio cirúrgico, uso de um bisturi de tamanho 2.7 mm para acessar a câmara anterior do bulbo ocular e pinça de ponto para remoção dos fragmentos. A câmara anterior foi preenchida com um agente viscoelástico para facilitar a manipulação durante o procedimento. Os fragmentos indesejados foram removidos utilizando-se uma pinça de pontos. Em seguida, a câmara anterior foi lavada com solução salina balanceada (BSS) para remover quaisquer resíduos ou debris e o viscoelástico. Por fim, o procedimento foi concluído com o fechamento da incisão utilizando-se fio monofilamentar não absorvível, nylon Shalon de calibre 10-0.

Figura 18 – Imagens em sequência, remoção de corpo estranho do olho de um felino, A-apresenta aparente uma ponta do corpo estranho, B-com a pinça preparada para remoção do corpo estranho, C- fixação da pinça no corpo estranho, D- ínicio da remoção do corpo estranho, E- remoção do corpo estranho, F- fase final da remoção do corpo estranho.

A B C

Fonte: Yamashiro, 2022

No contexto desta pesquisa, dois corpos estranhos, medindo 4 mm e 7 mm, foram retirados do bulbo ocular esquerdo do animal em análise. É importante ressaltar que o material removido era de origem vegetal. No entanto, é relevante mencionar que esse material não foi submetido a uma análise diagnóstica detalhada até o momento, deixando margem para investigações futuras neste campo de estudo

Figura 19 – Corpo estranho de origem vegetal

Fonte: Yamashiro, 2022

No contexto desta pesquisa, dois corpos estranhos, medindo 4 mm e 7 mm, foram retirados do bulbo ocular esquerdo do animal em análise. É importante ressaltar que o material removido era de origem vegetal. No entanto, é relevante mencionar que esse material não foi submetido a uma análise diagnóstica detalhada até o momento, deixando margem para investigações futuras neste campo de estudo.

Figura 20 – Imagem do especímetro utilizado para medir o tamanho do corpo estranho que foi removido do olho do felino.

Fonte: Yamashiro, 2022

Pós-cirurgia: 07/02/23

Cinco dias pós-operatório, paciente apresenta: hifema em região de câmera anterior as 2 horas e blefarospasmo. Ao exame fisco não foi caracterizado alterações dignas de notas.

Figura 21 – Sequência de imagens: A, B e C, registradas 5 dias após a cirurgia.

Fonte: Yamashiro, 2022

Pós-cirurgia: 23/02/2023

Dezesseis dias pós-operatório, paciente apresenta melhora em hifema, comparado a consulta anterior, blefarospasmo e fotofobia não caraterizados. Ao exame físico nada digno de nota.

Imagem 22 – Sequência de imagens: A, B e C, registradas 16 dias após a cirurgia.

Fonte: Yamashiro, 2022

Pós-cirurgia: 3 meses após a cirurgia

3 messes pós-operatório, paciente se encontra em bom estado geral, sem perda da função ocular.

Figura 23 – Sequência de imagens: A, B, C e D, registradas 3 meses após a cirurgia

Fonte: Yamashiro, 2022

4. DISCUSSÃO

O bulbo ocular felino é um órgão de grande complexidade que apresenta várias camadas e câmaras que podem ser afetadas pela presença de um possível corpo estranho, com capacidade de causar uma variedade de problemas que vão desde uma inflamação leve até a perda da visão ou dores severas, ressaltando que a abordagem apropriada depende da localização do objeto estranho e da gravidade do dano ocular que este pode causar. 

Brooks (2015) destacou a importância de procurar o atendimento médico veterinário imediato quando se trata de uma suspeita de corpo estranho em bulbo ocular felino. Os autores afirmam que atrasos no início do tratamento podem acarretar complicações graves como úlceras da córnea, e até mesmo, a perda de visão, como de acordo com a literatura a responsável pelo paciente do presente relato buscou por atendimento veterinário.  

O caso em questão foi conduzido por um clínico geral até o momento da intervenção de um oftalmologista, no entanto, contrariando a literatura, mesmo após 7 dias da perfuração ocular, ainda foi possível realizar a intervenção cirúrgica por meio da remoção do corpo estranho, sem causar maiores danos ao bulbo ocular, e desde então, 8 meses após o trauma, o paciente, sem alterações oculares, segue em acompanhamento até o presente momento. 

De acordo com Williams (2008) é de extrema necessidade a realização de um exame físico completo pelo médico veterinário para que haja a possibilidade de determinar a extensão do problema. Esta avaliação minuciosa pode ser feita através de técnicas de diagnóstico por imagem, por meio da ultrassonografia ocular, por exemplo, um exame extremamente útil para avaliar a profundidade da lesão e identificar qualquer objeto estranho retido no bulbo, e no presente caso, foi possível ir de acordo com a literatura ao realizar o exame oftálmico e o ultrassom ocular, que revelou um corpo estranho apresentando 4,2mm de comprimento e 0,9mm de espessura, alojado na câmara anterior do olho esquerdo com aproximadamente 80% de profundidade. 

A realização do ultrassom ocular foi importante para avaliar a localização do corpo estranho e para identificar exatamente quais estruturas intraoculares estavam sendo afetadas por este, e assim como descreve Williams (2008) em seu trabalho, este exame possuiu a importante função de fornecer maiores informações para o planejamento do procedimento cirúrgico com maior segurança, fato este reiterado por Ferreira et al., (2013) que ao dizer que a precisão oferecida por estes meios de diagnóstico tecnológicos possibilitam uma abordagem mais eficaz, além de contribuírem positivamente para melhoras significativas em tratamentos oftalmológicos, como foi o caso do presente relato, onde foi possível analisar e instituir um tratamento adequado para o referido caso clínico.   

Vale ressaltar que o ultrassom ocular oferece extrema segurança tanto para o paciente quanto para os profissionais envolvidos, já que não ocorrem efeitos biológicos adversos, além disso, sua natureza não invasiva e a boa taxa de aceitação por parte dos pacientes conferem maior credibilidade, pelos mesmos motivos de alta segurança, pode ser realizado em qualquer ambiente sem necessidade de medidas de proteção especiais. Sendo assim, o ultrassom ocular emerge como uma importante e valiosa ferramenta de diagnóstico e monitoramento de patologias oftálmicas, conforme argumentado por Nyland; Matton (2002).  

Como destacado por Hijar (2008), são diversas as aplicações clínicas para o exame de ultrassom ocular, como por exemplo para verificar variações no tamanho do bulbo e para situações em que é necessário avaliar estruturas não oculares, como por exemplo, um possível corpo estranho, assim como consta no presente trabalho, mas também, em casos em que se suspeita de neoplasias, traumas ou cataratas, onde seja necessária uma avaliação mais minuciosa da retina. 

Da mesma forma, além da importância do exame de imagem, os autores Sitkes; Kimmitt (2016) ressaltam a utilidade e importância da realização dos testes de reflexo pupilar e de ameaça, ambos fundamentais para a compreensão do estado da visão e da saúde ocular, auxiliando no diagnóstico de possíveis patologias oculares.

Segundo Goul; McLellan (2016) o exame referido como “reflexo de ameaça” envolve a movimentação da mão em direção aos olhos do animal para observar sua reação, e como dito anteriormente, trata-se de um importante parâmetro para a avaliação do sistema visual e nervoso do paciente. O esperado é que haja uma resposta rápida para que seja possível concluir que a visão e as sensações estão apropriadas e normais. 

No caso do referido paciente, os parâmetros de reflexo pupilar e de ameaça estavam dentro dos padrões normais, sem apresentar quaisquer anormalidades, ao contrário do que é mostrado em alguns relatos como o de Lew et al., (2015), onde um pastor alemão com um espinho no olho esquerdo não apresentava resposta para os exames citados. 

Outra técnica que desempenha um papel fundamental no diagnóstico, trata-se da “técnica da lâmpada de fenda”, presente no estudo de Slatter (2007), é uma abordagem extremamente importante que permite a identificação precisa de detalhes microscópicos e sutis de estruturas oculares.  

Corroborando para ressaltar a importância e a eficácia desta técnica, o paciente abordado no presente relato foi submetido ao procedimento, onde por meio deste, foi possível identificar a presença do então corpo estranho alojado na câmara anterior e no estroma. A visualização ampliada e iluminada proporcionada pela lâmpada de fenda possibilita uma análise mais minimalista em relação a morfologia, posição e características do corpo estranho.  

E além de auxiliar na precisão do diagnóstico vale ressaltar a importância da técnica para a tomada de decisões clínicas, como a escolha do tratamento adequado e a determinação da abordagem cirúrgica necessária, bem como auxiliando também no monitoramento do pós-tratamento. Entretanto, é importante lembrar que a interpretação dos resultados da referida técnica deve levar em consideração todo o contexto clínico, as condições ambientais e a experiência do profissional para que haja garantia de uma avaliação completa e confiável.  

 Nesse sentido, a técnica da lâmpada de fenda, conforme apontado por Slatter (2007), permanece como ferramenta indispensável no diagnóstico oftalmológico, fornecendo percepções valiosas para a compreensão e tratamento de várias condições oculares, como ocorrido no presente relato, onde foi possível observar a presença do corpo estranho intraocular. 

Ademais, outro importante exame a ser citado trata-se da tonometria de rebote (KONTIOLA, 1997), um método utilizado para a finalidade de aferir a pressão bulbo intraocular (PIO), medindo o tom ou a firmeza de sua superfície, podendo trazer importantes informações como a presença ou não de um glaucoma ou outra patologia que possa levar o paciente a uma cegueira. A técnica consiste em um aparelho que quando acionado se encosta no olho e empurra a córnea, que responde com uma força contrária a ele, sendo utilizado como parâmetro de medição esta força, lembrando que não há a necessidade do uso de anestésicos para a realização deste exame.  

O parâmetro aceitável para a PIO aferida ocorre quando a sonda é posicionada entre três e cinco milímetros do centro corneano, com um ângulo de impacto menor do que 25 (KONTIOLA et al., 2001). O referido exame foi utilizado no paciente felino do caso em questão, demonstrando resultados satisfatórios já que a pressão do bulbo ocular esquerdo se apresentava dentro dos padrões com 14 mmHg, ao contrário do que se observa em outros relatos como o de Lew et al., (2015), onde o olho lesionado do pastor alemão citado anteriormente apresentava uma PIO diminuída. 

No que se diz respeito ao tratamento, Ofri (2018) descreve a eficácia do uso de terapias tópicas no acompanhamento de complicações decorrentes de corpos estranhos em bulbo ocular, o autor destaca o uso de pomadas antibióticas e anti-inflamatórias juntamente do uso do colar elizabetano, extremamente importante para prevenir possíveis autolesões e auxiliar no processo de cicatrização.  

De acordo com a indicação da literatura, as orientações passadas para o responsável pelo felino foram as mesmas citadas por Ofri (2018), no entanto, parte importante da indicação não foi seguida, já que o tutor não atendeu a exigência do uso obrigatório do colar elizabetano, apesar do uso correto das medicações antibióticas e anti-inflamatórias prescritas.  

Apesar de o tratamento ser considerado a primeira linha de defesa, segundo Slatter (2001), a intervenção cirúrgica pode ser necessária em casos mais graves, assim como o presente quadro relatado foi conduzido ao realizar-se o procedimento cirúrgico da remoção do corpo estranho intraocular, objetivando a remoção dos fômites e células inflamatórias, as quais poderiam causar obstrução do ângulo irido corneano e consequentemente gerar um glaucoma secundário a obstrução e a uveíte. A técnica utilizada no procedimento foi uma variação da técnica de François (1995). 

Vale ressaltar que existem casos em que o objeto estranho penetrante causa danos significativos ao bulbo, e nestas situações a realização de uma enucleação pode ser necessária a fim de evitar maiores dores e desconfortos ao animal acometido Slatter (2001), no entanto, esta situação não se aplica ao felino deste caso, já que a cirurgia foi bem planejada graças aos exames e executada a tempo de não gerar lesões mais severas que pudessem fazer presente a necessidade de uma possível enucleação, e mesmo até o presente momento, o procedimento não foi necessário.  

É de grande valia lembrar que o seguimento do pós-tratamento é muito importante, segundo Brooks et al., (2015), que afirma que mesmo após a remoção do corpo estranho e o tratamento bem-sucedido das lesões resultantes, é de extrema importância o acompanhamento regular com o médico veterinário para que haja o monitoramento da recuperação e a profilaxia de possíveis complicações adicionais, e desta forma, seguindo o que se relata na literatura, o paciente vem sendo acompanhada a cada 3 meses por profissionais da área de oftalmologia da clínica em que foi atendido, e até este momento, não existem alterações ou complicações relatadas, corroborando para constatar o sucesso do procedimento.  

A percepção e a preocupação do clínico geral para a possibilidade de possíveis complicações mais severas foi essencial, já que a indicação levou o felino até as mãos de um médico veterinário especializado e qualificado na área de oftalmologia enquanto ainda havia tempo, garantindo o bem-estar e a preservação do bulbo ocular e da visão da paciente.

Ademais, por meio do relato deste caso foi possível observar a importância da colaboração entre profissionais da área de clínica geral e da oftalmologia, destacando a importância da comunicação entre as diferentes áreas da medicina veterinária. A troca de conhecimentos entre especialidades viabiliza uma abordagem personalizada ao cuidado do paciente. 

Vale destacar que se observou que a identificação precoce de patologias oftalmológicas não apenas evita complicações, mas também possibilita tratamentos menos invasivos e mais eficazes, contribuindo para a qualidade de vida do paciente e reduzindo custos de saúde a longo prazo. 

Nesse contexto, a capacitação dos veterinários clínicos para identificar os primeiros sinais de problemas oftalmológicos em animais torna-se relevante. Programas de educação veterinária contínua desempenham um papel crucial, mantendo os profissionais atualizados sobre os avanços na área de oftalmologia veterinária. 

Portanto, a perspicácia do veterinário clínico, seguida pela colaboração com o oftalmologista veterinário, reflete não apenas a prática veterinária responsável, mas também a busca pela melhor saúde e qualidade de vida dos animais. 

A metodologia empregada para essa análise, baseada em uma revisão da literatura disponível, provou ser bastante eficaz na realização dos objetivos propostos e na resposta à problematização inicial. Ao mergulhar na rica fonte de literatura existente, foi possível esclarecer a importância do diagnóstico correto e rápido, bem como o tratamento adequado, e as possíveis consequências em caso da não continuidade das condutas adequadas. Ademais, foi possível esclarecer uma série de sinais clínicos comumente associados à presença de corpos estranhos nos olhos dos felinos, que vão desde a vermelhidão e o lacrimejamento excessivo até a reclusão e o comportamento agressivo. 

Em suma, esta revisão de literatura proporcionou uma compreensão substancial da presença de corpos estranhos nos olhos dos gatos, juntamente com a descrição e discussão de um relado de caso com esta problemática, elucidando ainda melhor sobre as possíveis complicações e tratamentos para casos de corpo estranho intraocular em Felis Catus. O corpus de literatura existente se mostrou bastante informativo, contribuindo para um conhecimento mais aprofundado deste relevante aspecto da oftalmologia felina. 

5. CONCLUSÃO 

Com base na revisão de literatura disponível, é possível concluir que o tema “corpos estranhos intraoculares em gatos” é relevante para a oftalmologia veterinária, levando em consideração que acidentes perfurantes em bulbo ocular podem levar a complicações de comum ocorrência como ulcerações corneanas, uveíte e até cegueira, caso o tratamento não ocorra de forma rápida e eficaz.  

Presume-se por meio deste trabalho que continua sendo de extrema importância a investigação mais aprofundada da epidemiologia destes acidentes envolvendo corpos estranhos intraoculares em felinos, para que se possa compreender de forma mais clara os fatores que expõem os animais a este risco.  

Com base na revisão de literatura disponível, é possível concluir que o tema “corpos estranhos intraoculares em gatos” é relevante para a oftalmologia veterinária, levando em consideração que acidentes perfurantes em bulbo ocular podem levar a complicações de comum ocorrência como ulcerações corneanas, uveíte e até cegueira, caso o tratamento não ocorra de forma rápida e eficaz.  

Presume-se por meio deste trabalho que continua sendo de extrema importância a investigação mais aprofundada da epidemiologia destes acidentes envolvendo corpos estranhos intraoculares em felinos, para que se possa compreender de forma mais clara os fatores que expõem os animais a este risco.  

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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