SITUAÇÃO EPIDEMIOLÓGICA DAS INTERNAÇÕES POR TRANSTORNOS MENTAIS DEVIDO AO ABUSO DE ÁLCOOL NO ESTADO DO PIAUÍ DE 2013 A 2022.

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10070749


Maria Luíza Moura Souza Silva¹
Maria Eduarda Sá Urtiga Nogueira Absolon¹
Lucas Moura Gomes Oliveira¹
Antonio Gabriel Coimbra Rocha¹
Leonardo Barros Monteiro Paulo Vieira¹
Paulo Eduardo Moura Wehmuth Sampaio¹
Maria Clara Lages Santos¹
Márcia Fernanda Correia Jardim Paz¹
Luan Arnon de Melo Cunha²


RESUMO

O consumo excessivo de álcool pode provocar transtornos mentais e comportamentais, e podem levar a internações hospitalares, que representam um custo significativo para o sistema de saúde. O objetivo foi compreender a situação atual das internações por transtornos mentais devido ao uso de álcool no Piauí, durante o período de 2013 a 2022, utilizando dados presentes no Sistema de Informações Hospitalares da plataforma DATASUS. Foram aprovadas 3.406 internações por transtornos mentais devido ao uso de álcool, sendo 3.039 (89,22%) em homens e 367 em mulheres (10,7%), uma proporção de 8,3:1. Ocorreram 22 mortes, sendo 20 (0,68%) em homens e 2 em mulheres. A maioria das internações foi de pessoas pardas, com 2.887 aprovações (84,77%). O maior número de AIH foi de 40-49 anos, com 1.025 internações (28,4%). Em relação aos óbitos, a maioria ocorreu nas faixas etárias de 20-29 anos e de 50-59 anos. 100% dos pacientes foram atendidos em caráter de urgência. Com base nos dados apresentados, pode-se notar que o uso de álcool e os consequentes transtornos mentais são um problema significativo no estado do Piauí, afetando principalmente os homens, de cor parda, localizados na região de saúde Entre Rios, na faixa etária de 40 a 49 anos, o que demonstra que essa é uma questão impactante para a população em idade produtiva.

ABSTRACT

Excessive alcohol consumption can lead to mental and behavioral disorders, and can result in hospitalizations, which represent a significant cost to the health system. The objective was to understand the current situation of hospitalizations for mental disorders due to alcohol use in Piauí, during the period from 2013 to 2022, using data from the Hospital Information System of the DATASUS platform. A total of 3,406 hospitalizations for mental disorders due to alcohol use were approved, with 3,039 (89.22%) in men and 367 in women (10.7%), a ratio of 8.3:1. There were 22 deaths, with 20 (0.68%) in men and 2 in women. The majority of hospitalizations were of mixed-race people, with 2,887 approvals (84.77%). The highest number of AIH was from 40-49 years old, with 1,025 hospitalizations (28.4%). Regarding deaths, the majority occurred in the age groups of 20-29 years and 50-59 years. 100% of patients were treated on an emergency basis. Based on the data presented, it can be noted that alcohol use and the consequent mental disorders are a significant problem in the state of Piauí, mainly affecting men, of mixed race, located in the Entre Rios health region, in the age group of 40 to 49 years old, which shows that this is an impactful issue for the population in productive age.

INTRODUÇÃO:

O consumo de álcool é um problema de saúde pública global, com implicações significativas para a morbidade e mortalidade. No Brasil, o consumo de álcool per capita diminuiu de 8,8 litros em 2010 para 7,8 litros em 2016. No entanto, o uso nocivo de álcool continua sendo um grande desafio para a saúde pública e está intimamente relacionado a uma alta carga de morbidade (Brasil, 2016).

Os transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool são uma consequência preocupante do consumo excessivo de álcool. Estes transtornos podem levar a internações hospitalares, que representam um custo significativo para o sistema de saúde. No período de 2010 a 2020, ocorreram 423.290 internações por transtornos mentais e comportamentais decorrentes do uso do álcool no Brasil (Oliveira, 2023).

Este artigo propõe analisar a situação epidemiológica das internações por transtornos mentais devido ao uso de álcool no estado do Piauí de 2013 a 2022. A escolha deste período e localização geográfica permite uma análise mais focada e detalhada das tendências e padrões específicos relacionados a essas internações.

A análise da tendência das taxas de internações por transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool pode fornecer insights valiosos sobre a eficácia das políticas públicas e intervenções voltadas para a redução do consumo nocivo de álcool. Além disso, pode ajudar a identificar lacunas nos serviços de saúde mental e dependência química, bem como áreas que necessitam de maior atenção e recursos.

Espera-se que os resultados deste estudo contribuam para o entendimento da situação atual das internações por transtornos mentais devido ao uso de álcool no Piauí, fornecendo dados úteis para informar políticas públicas e práticas clínicas voltadas para a prevenção e tratamento desses transtornos.

METODOLOGIA:

Trata-se de um estudo epidemiológico, transversal e documental, que utiliza dados do Sistema de Informações Hospitalares (SIH) do DATASUS, que é um sistema de informação em saúde do Ministério da Saúde do Brasil que fornece dados sobre várias condições de saúde, incluindo internações hospitalares por transtornos mentais devido ao uso de álcool.

A amostra deste estudo incluiu pacientes que foram internados devido a transtornos mentais causados pelo uso abusivo de álcool em hospitais públicos e privados do estado do Piauí, no período de janeiro de 2013 a dezembro de 2022. Os dados foram coletados diretamente do DATASUS e incluem informações sobre o número de internações, a duração da internação, custo médio por internação, óbitos decorrentes, cor, sexo, caráter de atendimento, região de saúde, estabelecimento de atendimento, regime de atendimento público ou privado.

Os dados foram analisados usando técnicas estatísticas descritivas para fornecer uma visão geral das tendências e padrões nas internações por transtornos mentais devido ao uso de álcool. Os resultados deste estudo serão apresentados em forma de tabelas e gráficos para facilitar a interpretação dos dados, utilizando o programa Google Planilhas.

Este estudo foi conduzido em conformidade com a resolução nº 510, de 7 de abril de 2016 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), segundo a qual a pesquisas que utilizarem informações de acesso público não serão registrada nem avaliadas pelo sistema CEP/CONEP (Comitê de Ética em Pesquisa/Comissão Nacional de Ética em Pesquisa), nos termos da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011 (Brasil, 2016). Devido ao SIH já fornecer dados em conformidade com a resolução, não foi necessário submeter a pesquisa ao CEP.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Durante o período de 2013 a 2022, no estado do Piauí, foram aprovadas 3.406 internações por transtornos mentais devido ao uso de álcool, sendo 3.039 (89,22%) em homens e 367 em mulheres (10,7%), uma proporção de 8,3:1. O valor médio da Autorização de Internação Hospitalar (AIH) foi de R$608,21, com um valor ligeiramente maior para as mulheres (R$623,68) em comparação aos homens (R$606,34). A média de permanência foi de 10,7 dias, com as mulheres permanecendo mais tempo (11,4 dias) do que os homens (10,6 dias). No que diz respeito aos óbitos, ocorreram 22 mortes durante o período estudado, sendo 20 (0,68%) em homens e 2 em mulheres. A taxa de mortalidade por internação foi de 0,68%, sendo ligeiramente maior nos homens (0,69%) em comparação às mulheres (0,58%).

Quanto à cor/raça, foram aprovadas 61 internações de pessoas brancas (1,79%), com um valor médio de R$306,16 e uma média de permanência de 11,4 dias. Para pessoas de cor preta, foram aprovadas 56 internações (1,64%), com um valor médio de R$390,55 e uma média de permanência de 9,1 dias. A maioria das internações foi de pessoas pardas, com 2.887 aprovações (84,77%), um valor médio de R$632,87 e uma média de permanência de 11 dias, na qual foram registrados 14 óbitos (0,51%). Foram aprovadas 68 internações para pessoas amarelas (2%), com um valor médio de R$112,95 e uma média de permanência de 7,6 dias. Além disso, foram aprovadas 334 internações sem informação racial (9,8%), com um valor médio de AIH de R$587,56 e uma média de permanência de 8,8 dias, seguida de 8 óbitos, resultando em uma taxa de mortalidade relativamente alta de 2,5%.

Em relação à faixa etária, o maior número de AIH foi de 40-49 anos, com 1.025 internações (28,4%), seguida pela faixa de 30-39 anos, com 905 internações (25,1%). A faixa etária de 50-59 anos teve 709 internações (19,6%), enquanto a faixa de 20-29 anos teve 333 internações (9,2%). As demais faixas etárias tiveram menos de 300 internações cada uma, representando menos de 10% do total.

Em relação ao valor médio da AIH, as faixas etárias de 50-59 anos e de 70-79 anos apresentaram os valores mais altos, R$699,17 e R$700,41 respectivamente. A faixa etária de 5-9 anos teve o menor valor médio de AIH, R$160,95. As faixas etárias de 40-49 anos e de 50-59 anos tiveram as maiores médias de permanência, ambas com 10,9 dias. Em relação aos óbitos, a maioria ocorreu nas faixas etárias de 20-29 anos e de 50-59 anos, ambas com 5 óbitos. No entanto, a taxa de mortalidade mais alta foi observada na faixa etária de 70-79 anos (3,13%), pela faixa etária de 20-29 anos (1,61%). As demais faixas etárias tiveram taxas de mortalidade abaixo de 1%.

Quanto ao caráter de atendimento, 100% dos pacientes foram atendidos em caráter de urgência.

O ano com o maior número de AIH aprovadas foi 2019, com 449 internações (12,4%), seguido por 2022 (n=379; 10,5%) e 2018 (n=375;10,4%). Em relação ao valor médio de AIH, o ano de 2018 atingiu o valor mais alto, R$800,59. O ano de 2014 teve o menor valor médio da AIH, R$441,72. Quanto à média de permanência, os anos de 2015 e 2020 tiveram as maiores médias, ambos com 12,1 dias. O ano de 2021 teve a menor média de permanência, 8,7 dias. Em relação aos óbitos, o maior número ocorreu em 2022, com 04 óbitos. No entanto, a taxa de mortalidade mais alta foi observada em 2022 (1,13%), seguida por 2013 (0,87%) e 2018 (0,86%).

De acordo com a Região de Saúde (CIR), o maior número de AIH aprovadas foi no Entre Rios, com 2.199 internações (60,8%). As outras mais proeminentes foram Planície Litorânea teve 569 internações (15,7%), enquanto a Serra da Capivara teve 341 internações (9,4%). Em relação ao valor médio da AIH, a região Entre Rios apresentou o valor mais alto, R$793,27. A região Vale do Sambito teve o menor valor médio da AIH, R$106,04. Quanto à média de permanência, a região Vale do Rio Guaribas teve a maior média, 20,4 dias. A região Vale do Sambito teve a menor média de permanência, 1,3 dias. Em relação aos óbitos, a maioria ocorreu na região Entre Rios e na Planície Litorânea, ambas com 06 óbitos. No entanto, a taxa de mortalidade mais alta foi observada na região Cocais (9,52%), seguida pela região Vale do Rio Guaribas (3,6%) e pela região Vale dos Rios Piauí e Itaueiras (3,7%). As demais regiões tiveram taxas de mortalidade abaixo de 1% ou não registraram óbitos.

Segundo o regime de atendimento, a maioria das AIH aprovadas foi no regime desconhecido, com 2.585 internações (71,6%). O regime público teve 676 internações (18,7%), enquanto o regime privado teve 145 internações (4% do total). Em relação ao valor médio da AIH, o regime desconhecido apresentou o valor mais alto, R$642,47. O regime Privado teve o menor valor médio da AIH, R$380,72. Quanto à média de permanência, o regime público teve a maior média, 11,4 dias. O regime privado teve a menor média de permanência, 7,3 dias. Em relação aos óbitos, a maioria ocorreu em regime desconhecido, com 15 óbitos. No entanto, a taxa de mortalidade mais alta foi observada no regime privado (1,38%), seguida pelo regime público (0,77%) e pelo regime desconhecido (0,61%).

Os dados apresentados variam significativamente entre os diferentes estabelecimentos de saúde. Por exemplo, a Unidade Integrada do Mocambinho teve o maior número de AIHs aprovadas com 1.433 (37,5%), enquanto vários outros estabelecimentos tiveram apenas 1 AIH aprovada. Em termos de valor médio de AIH, o Hospital Estadual Dirceu Arcoverde lidera com R$ 3.167,68, em contraste com a Unidade de Saúde Matadouro, que teve o valor mais baixo, de R$ 60,22. A média de permanência varia de 25,2 dias na Clínica de Repouso de Parnaíba para apenas 1,0 dia em vários estabelecimentos. A taxa de mortalidade também variou, com a Unidade de Pronto Atendimento 24 Horas UPA Promorar e o Hospital Estadual Julio Hartman tendo a taxa mais alta de 50%, enquanto muitos estabelecimentos não registraram óbitos.

CONCLUSÃO

Com base nos dados apresentados, pode-se notar que o uso de álcool e os consequentes transtornos mentais são um problema significativo no estado do Piauí, afetando principalmente os homens, de cor parda, localizados na região de saúde Entre Rios, na faixa etária de 40 a 49 anos, o que demonstra que essa é uma questão impactante para a população em idade produtiva.

Apesar de as internações predominarem em pardos, a mortalidade foi maior no grupo sem informação racial, o que exige a necessidade um melhor registro de informações, a fim de compreender melhor a morbimortalidade da população estudada.

Houve uma proporção enorme nas internações entre o sexo masculino e o feminino, 8 homens a cada uma mulher, e a mortalidade foi levemente maior em homens.

Ocorreu predomínio das internações entre a trigésima e a quadragésima década de vida, com maiores custos por internação entre a quinta e a sétima década. Quanto à mortalidade, houve dois picos na segunda e na quinta década de vida, porém a mortalidade mais alta foi acima dos setenta anos.

As internações hospitalares têm aumentado de maneira lenta ao longo do tempo, e a mortalidade tem variado, com pico no último ano.

A região de saúde Entre Rios se destacou na quantidade de hospitalizações, com mais da metade dos casos, seguida de Planície Litorânea e Serra da Capivara, e também nos custos médio de internação e quantidade absoluta de óbitos. Porém a taxa de mortalidade foi maior na região de Cocais.

A maioria dos casos tanto de hospitalizados quanto de óbitos não teve seu regime de internação especificado, vindo em seguida o regime público e por fim o privado, o qual apresentou a maior mortalidade e menor tempo de internação.

O estabelecimento de saúde com maior quantidade de internações foi a Unidade Integrada do Mocambinho, na capital Teresina-PI. E o maior custo por internação foi encontrado no Hospital Estadual Dirceu Arcoverde, também na capital. Unidade de Pronto Atendimento 24 Horas UPA Promorar e o Hospital Estadual Julio Hartman apresentaram a pior mortalidade, e ressalte-se que o seu número de internados foi diminuto.

É importante notar que todas as internações foram feitas em caráter de urgência, o que evidencia a gravidade dos casos atendidos. Esses achados destacam a necessidade de intervenções direcionadas para prevenir e tratar transtornos mentais relacionados ao uso de álcool no Piauí, com foco particular nos grupos mais afetados.

Essas observações destacam a complexidade dos fatores que influenciam as internações por transtornos mentais relacionados ao álcool e a importância de considerar uma diversas variáveis ao avaliar e planejar serviços de saúde mental.

REFERÊNCIAS

  1. BRASIL. Banco de dados do Sistema Único de Saúde – DATASUS. Ministério da Saúde. Disponível em:<http://www.datasus.gov.br>. Acesso em: 25 de set, 2023.
  2. BRASIL; MINISTÉRIO DA SAÚDE; CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE. Resolução nº 510, de 7 de abril de 2016. Diário Oficial da União, n. 98, p. 44-46, 2016.
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  4. FERNANDES, Márcia Santana et al. A responsabilidade civil do pesquisador “responsável” nas pesquisas científicas envolvendo seres humanos e a Resolução CNS 466/2012. Revista de Direito Civil Contemporâneo-RDCC, v. 5, p. 97-118, 2015.
  5. OLIVEIRA, Renata Savian Colvero de et al . Hospitalizations for mental and behavioral disorders due to alcohol use in Brazil and regions: a temporal trend analysis, 2010-2020. Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília , v. 32, n. 1, e20211266, 2023.

1 Graduando(a) de Medicina do Centro Universitário UNINOVAFAPI, Teresina-PI;
Maria Luíza Moura Souza Silva; https://orcid.org/0009-0009-3414-6837
Maria Eduarda Sá Urtiga Nogueira Absolon; https://orcid.org/0009-0002-9610-1430
Lucas Moura Gomes Oliveira; https://orcid.org/0009-0009-8506-2633
Antonio Gabriel Coimbra Rocha; https://orcid.org/0000-0001-7905-8093
Leonardo Barros Monteiro Paulo Vieira; https://orcid.org/0009-0006-1519-1294
Paulo Eduardo Moura Wehmuth Sampaio; https://orcid.org/0000-0002-1030-1574
Maria Clara Lages Santos; https://orcid.org/0009-0000-4722-0033
Márcia Fernanda Correia Jardim Paz; https://orcid.org/0000-0002-6086-6469

2 Médico Psiquiatra formado pelo Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto-SP; Preceptor da Disciplina de Clínica Integrada I, no Centro Universitário UNINOVAFAPI, Teresina-PI;