O PERFIL DE INTERNAÇÕES POR INTOXICAÇÕES POR MEDICAMENTOS EM IDOSOS NA REGIÃO NORDESTE ENTRE 2012 E 2022: UM ESTUDO DESCRITIVO

THE PROFILE OF HOSPITALIZATIONS DUE TO DRUG POISONING IN THE ELDERLY IN THE NORTHEAST REGION BETWEEN 2012 AND 2022: A DESCRIPTIVE STUDY

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10059559


Aminadá Vieira da Silva Neto1
Lígia Mimosa Oliveira de Sousa2
Maurilio Batista Lima3


RESUMO

A intoxicação trata-se de um processo patológico produzido por substâncias de origem endógena e exógena que ocasionam um desequilíbrio na homeostase do organismo, mediada por reações bioquímicas. O estudo tem como objetivo analisar o perfil das intoxicações por medicamentos em idosos no Brasil, no período compreendido entre os anos de 2012 a 2022 na região nordeste. Trata-se de um estudo transversal de abordagem descritiva, analisando dados secundários, obtidos do registro de intoxicações do SINAN/DATASUS. Entre os anos de 2012- 2022 foram notificados números expressivos de casos de intoxicação medicamentosa por idosos, especialmente no gênero feminino, na faixa etária entre 60-64 anos, idosos autodeclarados pardas. Ao se referir às circunstâncias que podem levar à intoxicação medicamentosa, constatou-se a tentativa de suicídio sendo assim associada a grande exposição aguda-única com maior prevalência no estudo, e diante da confirmação clínica o maior percentual foi atribuída à intoxicação confirmada. O presente estudo visa contribuir para o aprimoramento das políticas públicas de saúde com foco na prevenção, orientação e adoção de medidas que minimizem este quadro, com atenção especial os idosos na região nordeste e, dessa forma, poderem ajudar a reduzir as ocorrências de intoxicações medicamentosas nosistema de saúde.

Palavras-chave: Introxicações; Epidemiologia; Medicamentos; Idoso.

ABSTRACT

Intoxication is a pathological process produced by substances of endogenous and exogenous origin that cause an imbalance in the body’s homeostasis, mediated by biochemical reactions. The study aims to analyze the profile of drug poisoning in the elderly in Brazil, in the period between 2012 and 2022 in the northeast region. This is a cross-sectional study with a descriptive approach, analyzing secondary data obtained from the SINAN/DATASUS poisoning registry. Between the years 2012-2022, significant numbers of cases of drug poisoning were reported by the elderly, especially in females, in the age group between 60-64 years, self-declared brown elderly. When referring to the circumstances that can lead to drug intoxication, it was found that the suicide attempt was thus associated with a large single-acute exposure with a higher prevalence in the study, and in view of the clinical confirmation, the highest percentage was attributed to the drug intoxication. When referring to the circumstances that can lead to drug intoxication, it was found that the suicide attempt was thus associated with a large single-acute exposure with a higher prevalence in the study, and in view of the clinical confirmation, the highest percentage was attributed to confirmed intoxication. The present study aims to contribute to the improvement of public health policies with a focus on prevention, guidance and adoption of measures that minimize this situation, with special attention to the elderly in the Northeast region and, thus, can help reduce the occurrence of drug poisoning in the health system.

Key-words: Introxications; Epidemiology; Medicines; Old.

1. INTRODUÇÃO

Envelhecer é um processo dinâmico e progressivo que envolve alterações morfológicas, funcionais e bioquímicas e, com frequência, os idosos apresentam disfunções simultâneas em diferentes órgãos ou sistemas (Souza et al., 2021). Devido a essas alterações, o processo de envelhecimento pode ser traduzido numa maior carga de doenças na população, havendo predomínio das Doenças Crônico-Degenerativas, ou Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNTs), como diabetes, acidente vascular cerebral e neoplasias, além das doenças por causas externas, como as intoxicações, que fazem dos idosos grandes consumidores de serviços de saúde e possivelmente o grupo mais medicalizado da sociedade (Cortez, 2019). Dados fornecidos através da Organização Mundial de Saúde – OMS relatam a alta prevalência de consumo de medicamentos, ao indicar que a porcentagem da população intoxicada por ano é de 1,5 a 3%. Ao se colocar esse valor em número de casos, tem-se uma média de 4.800.000 novos casos por ano. Quando se fala em relação aos óbitos, tem-se que é de 0,1 a 0,4%. Portanto, os gastos gerados com complicações causadas pelo uso incorreto de medicamentos comprometem de 10 a 40% do orçamento dos hospitais. Entre os países mais consumidores de medicamentos, o Brasil ocupa a quinta posição, sendo o primeiro da América Latina. Além disso, de acordo com o Sinitox (2018) o Brasil registrou, dos anos de 2015 a 2021 cerca de 62.919 casos de intoxicação medicamentosa, resultando em um total de 131 óbitos (Duarte et al., 2021).

No Brasil, as informações disponíveis sobre exposições e intoxicações medicamentosas são registradas por diversas bases de dados, destacando-se o Sistema Nacional de Agravos de Notificação – SINAN, disponibilizado pelo Departamento de informática do Sistema Único de Saúde – DATASUS, que tem por objetivo organizar a coleta, compilação, análise e divulgação dos casos de intoxicação e envenenamento notificados. Todos os casos de intoxicação ocorridos devem ser notificados e registrados através do SINAN. A obrigatoriedade da notificação é estabelecida para toda rede de saúde, tanto pública quanto privada (Portaria nº 114/2011 do Ministério da Saúde) e deve ser aplicada a todas as doenças e eventos constantes na Lista de Notificação Compulsória-LNC. As informações são divulgadas anualmente, representando uma fonte de informações consistente para a caracterização deste problema (Silva Neto; Ricardino; Marques, 2021)

As informações extraídas do SINAN/DATASUS mostram as intoxicações por medicamentos em idosos. Portanto, vários produtos podem causar intoxicação caso sejam ingeridos em grande quantidade ou até mesmo em pequenas quantidades, dependendo do tipo de substância. E existem mecanismos complexos pelo qual é explicada a intoxicação medicamentosa, mas existem variações, essas que podem ser de indivíduo para indivíduo, dependente das características da substância ou dos processos farmacodinâmicos e farmacocinéticos dos mesmos (Lima Filho et al., 2022).

A intoxicação trata-se de um processo patológico produzido por substâncias de origem endógena e exógena que ocasionam um desequilíbrio na homeostase do organismo, mediada por reações bioquímicas. As consequências da substância tóxica no organismo aparecem rapidamente ou no decorrer de alguns dias, no máximo duas semanas. Caracteriza-se por um grave problema de saúde pública, cujo processo tóxico se revela por meio de sinais e sintomas, ou mediante as alterações nos exames laboratoriais (Moraes et al., 2021).

A morte por intoxicação é considerada evitável, na qual a atenção à saúde deve estar voltada para as medidas de prevenção e redução de novos casos. O conhecimento do perfil epidemiológico das intoxicações medicamentosas nos municípios e demais unidades federativas é um importante guia para a gestão de recursos destinados ao planejamento e à implementação de ações que previnam a ocorrência desse agravo (Fernandes et al., 2020).

Considerando os problemas gerados com as intoxicações medicamentosas e a incidência do uso de medicamentos na população idosa no Brasil o presente estudo tem como objetivo debater esse assunto de extrema importância e trazer conhecimento sobre o tema caracterizando as ocorrências de intoxicações medicamentosas em idosos no Brasil, durante o período compreendido entre os anos de 2012e 2022, tendo como base consultas às notificações registradas no SINAN.

Assim, o objetivo geral do trabalho foi descrever o perfil das intoxicações por medicamentos em idosos no Brasil, no período compreendido entre os anos de 2012 a 2022 na região nordeste.

2. METODOLOGIA

Esse estudo se configura como transversal de abordagem descritiva, analisando dados secundários, obtidos do registro de intoxicações do SINAN/DATASUS, que tem como principal atribuição coordenar a coleta, a compilação, a análise e a divulgação dos casos de intoxicação e envenenamento notificados no país. Esses casos são publicados na forma de quadros separados por ano. Nesse sentido, foram analisados os dados dos anos de 2012 a 2022, visto que estes consistem em algumas das últimas informações publicadas, aptas a construir um perfil atual do tema e de suas variações na comparação com os outros anos.

Este trabalho também é de cunho quantitativo, que de acordo com Rosenthal (2019), às análises dos resultados quantitativos consistem em chamar atenção para as tendências e o desenvolvimento de acontecimentos repetidos, e desta forma permitem analisar os fenômenos e estabelecer correlações de casos concretos

Os dados disponíveis nos resultados sobre intoxicação por medicamentos são categorizados em: sexo, faixa etária, raça/etnia, circuntância, exposição no trabalho, tipo de exposição, classificação final, critério de confirmação, evolução.

O estudo foi realizado a partir de pesquisa junto à base de dados SINAN/DATASUS, durante o segundo semestre de 2023, sobre os casos de intoxicação e a partir de pesquisa em bases de dados para dar embasamento à discussão. As fontes utilizadas para o desenvolvimento do trabalho possuem origem científica.

Os estudos incluídos na discussão foram de origem nacional ou internacional, podendo ser encontrados em português ou inglês, a nível de intoxicação medicamentosa, no qual abordassem dados, fatores e perfil de intoxicações de modo geral e no Brasil nos últimos 10 anos.

Foram excluídos os casos com variáveis ignoradas para melhor apresentação dos dados. E publicações que não se enquadraram com os critérios de inclusão, não apresentando vínculo quanto ao tema, que abordavam o assunto, mas, não se encontravam dentro do período de tempo pré-estabelecido e que não pudessem ser encontrados disponíveis na íntegra para a leitura.

Os instrumentos utilizados para a busca foram bases de dados: SciELO, Google Acadêmico, PubMed, Redalyc e a busca nestas foi realizada utilizando-se palavras chave elencadas para a busca: envelhecimento humano; intoxicação medicamentosa / drug intoxication; polifarmácia / polypharmacy; automedicação / self-medication.

As informações foram organizadas por meio de tabelas eletrônicas do Microsoft Word® 2019 e em gráficos elaborados através do programa Excel, e nelas foram expressos os resultados. Todas as informações relevantes foram analisadas e posteriormente discutidas.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Entre o período de 2012 a 2022, nos registros nacionais compilados pelo SINAN, os medicamentos ocupam o primeiro lugar entre os demais grupos de agentes tóxicos, seguidos pelas drogas de abuso. Quanto à distribuição espacial, Pernambuco foi o estado com maior número de notificações de casos de intoxicação por medicamentos em idoso, seguido do estado da Bahia, com cerca de 36,2% e 14,16%, respectivamente das notificações no período estudado.

Gráfico 1– Porcentagem de notificações de casos de intoxicação por medicamentos em idoso na região Nordeste do Brasil, por estado, de 2012 a 2022.

Fonte: Ministério da Saúde/SVS – Sistema de Informação de Agravos de Notificação

As notificações dos estados do Ceará, Paraíba, Alagoas, Rio Grande do Norte, Piauí, Sergipe e Maranhão correspondem a cerca de 49,73% de todas as notificações registradas no período estudado.

Na Tabela 1, foram listadas as variáveis referentes ao sexo, faixa etária, raça/etnia, circuntância, exposição no trabalho, tipo de exposição, classificação final, critério de confirmação, evolução de 2012 a 2022. Ao analisar os resultados relacionados ao sexo, nota-se que em todos os anos houve prevalência de intoxicação medicamentosa no gênero feminino, tendo o estado de Pernambuco com maior número de casos 65,30% (n=1.732) referente ao gênero feminino.

Tabela 1– Caracterização de notificações de casos de intoxicação por medicamentos em idosos na Região Nordeste e por Estado da região Nordeste, de 2012 a 2022.

Maranhão (104)Piauí (348)Ceará (538)RioGrande do Norte (358)Paraíba (478)Pernambuco (1732)Alagoas (455)Sergipe (103)Bahia (679)Nordeste (4795)

n%n%n%n%n%n%n%n%n%n%
Sexo



















Feminino7269,2323667,8235265,4322362,2929361,301.13165,3030166,156765,0542762,893.10264,69
Masculino3230,7711232,1818634,5713537,7118538,7060134,7015433,853634,9525237,111.69335,31
Faixa etária



















60 – 64 anos2725,9611232,1818334,0111131,0116835,1556232,4515634,292625,2422733,431.57232,78
65-692423,088223,5613525,097922,0710421,7639622,869120,002928,1614921,941.08922,71
70-793129,819226,4414526,9511431,8413327,8250329,0414130,993231,0718727,541.37828,74
80 e +2221,156217,827513,945415,087315,2727115,656714,731615,5311617,0875615,77
Raça/etnia



















Branca1211,54205,756211,525415,087215,061679,646313,8576,80618,9851810,80
Preta65,77144,02101,86102,7991,88341,9671,5410,97416,041322,75
Amarela10,9640,7410,2881,67100,5820,4420,29280,58
Parda8278,8521260,9238371,1917548,8828760,041.15966,9228061,545654,3730945,512.94361,38
Indígena10,2110,0610,2230,06
Ign/Branco32,8810229,317914,6811832,9610121,1336120,8410222,423937,8626639,181.17124,42
Circunstância



















Uso habitual1918,273710,63448,18287,82347,111538,83306,591211,658312,224409,18
Acidental1110,58349,77407,43195,314810,041216,996814,9598,74618,984118,57
Ambiental21,9230,6330,1710,2290,19
Uso terapêutico1211,549025,867714,3112635,2011423,8541924,198919,561817,489413,841.03921,67
Prescrição médica51,4461,1241,1251,0590,5220,4410,9750,74370,77
Erro de administração
3

2,88

24

6,90

29

5,39

9

2,51

13

2,72

78

4,50

14

3,08

7

6,80

35

5,15

212

4,42
Automedicação2625,00277,76539,85236,427716,1119211,095512,091312,62639,2852911,03
Abuso21,9241,1561,1241,1271,46231,3340,8810,97152,21661,38
Ingestão de alimento


3

0,86

3

0,56

1

0,28

2

0,42

13

0,75

1

0,22



6

0,88

29

0,60
Tentativa de suicídio2725,9610028,7422141,087621,2311323,6447027,1415734,513231,0718627,391.38228,82
Tentativa de aborto10,19020,1230,06
Violência/homicídio61,7240,7420,42211,2140,59370,77
Outra10,2961,1261,68112,30160,9230,6610,97172,50611,27
Ign/Branco21,92174,89488,926217,324910,2521212,24316,8198,7411016,2054011,26
Exposiçãono trabalho



















Sim92,5961,1210,2881,67100,5840,88131,91511,06
Não9995,1929785,3447688,4829381,8439282,011.47485,1043595,608986,4153879,234.09385,36
Ign/Branco54,814212,075610,416417,887816,3224814,32163,521413,5912818,8565113,58
Tipo de exposição



















Aguda-única7875,0019455,7536567,8418651,9631566,321.14766,2230065,937471,8438857,143.04763,55
Aguda-repetida76,73329,206211,523910,89316,531156,64132,861110,686810,013787,88
Crônica21,9230,8630,5641,1240,84130,75121,77410,86
Aguda sob crônica10,9620,3720,56824,73102,2040,591042,17
Ign/Branco1615,3811934,2010619,7012735,4712526,3237521,6513229,011817,4820730,491.22525,55
Classificação final



















Intoxicação confirmada
69

66,35

192

55,17

342

63,57

172

48,04

247

51,67

974

56,24

376

82,64

57

55,34

338

49,78

2.767

57,71
Só exposição1110,584212,078315,43287,828116,9523013,28327,031312,6212117,8264113,37
Reação adversa1211,548925,577113,209626,826313,1829116,80255,492221,36669,7273515,33
Outro diagnóstico21,9210,2950,9371,9620,42704,04153,30121,771142,38
Síndrome de abstinência




1

0,19



3

0,63

3

0,17







7

0,15
Ign/Branco109,62246,90366,695515,368217,151649,4771,541110,6814220,9153111,07
Critério de confirmação



















Clínico-laboratorial32,8861,72397,254111,45275,65935,37112,4221,94213,092435,07
Reação adversa1211,548925,577113,209626,826313,1829116,80255,492221,36669,7273515,33
Outro diagnóstico21,9210,2950,9371,9620,42704,04153,30121,771142,38
Síndrome de abstinência




1

0,19



3

0,63

3

0,17







7

0,15
Ign/Branco109,62246,90366,695515,368217,151649,4771,541110,6814220,9153111,07
Critério de confirmação



















Clínico-laboratorial32,8861,72397,254111,45275,65935,37112,4221,94213,092435,07
Clínico- epidemiológico4139,4211031,6117031,605615,6419240,1731117,967516,482524,2716824,741.14823,94
Clínico4341,3521461,4929053,9023064,2519941,631.24471,8235678,246664,0839958,763.04163,42
Ign/Branco1716,35185,17397,25318,666012,55844,85132,86109,719113,403637,57
Evolução



















Cura sem sequela7067,3126676,4440575,2820256,4236375,941.30175,1239085,718178,6442963,183.50773,14
Cura com sequela43,8530,86142,6061,6830,63160,9251,1021,9481,18611,27
Óbito por intoxicação exógena
1

0,96

7

2,01

16

2,97

3

0,84

4

0,84

23

1,33

12

2,64

2

1,94

19

2,80

87

1,81
Óbito por outra causa43,8510,29112,04174,75261,5020,44121,77731,52
Perda de segmento30,8661,1261,6820,42573,29122,6410,97131,911002,09
Ign/Branco2524,046819,548615,9912434,6410622,1830917,84347,471716,5019829,1696720,17

Fonte: Ministério da Saúde/SVS – Sistema de Informação de Agravos de Notificação

No que se refere às características demográficas foi verificada a prevalência do sexo feminino com 64,69% (n=3.102). O fato de as mulheres aparecerem de forma predominante em pesquisas relacionadas aos medicamentos é verificado em diversos estudos sobre diferentes aspectos, em relação a eventos toxicológicos, encontra-se achados semelhantes ao estudo de Santana et al., (2019) que relatam que essa prevalência pode estar relacionada com o maior cuidado e necessidades fisiológicas que as mulheres possuem em relação à saúde, quando comparado com o homem, e assim utilizam mais medicamentos, aumentando a exposição aos riscos de intoxicação.

O Ministério da Saúde aponta que o uso de medicamentos por mulheres se mantém em alta tanto para mulheres que sofrem violência doméstica na tentativa de suportar tais violências, quanto por mulheres em situação de rua, para se manterem acordadas no período noturno na intenção da proteção contra a violência urbana, podendo torná-las mais expostas à possível toxicidade (Silva; Alvim, 2020).

O registro de intoxicação nos idosos, ao analisar os dados da faixa etária, mostra que há uma diminuição dos casos proporcional ao avanço da idade nos anos de 2012 a 2022, tendo os menores números de casos entre a faixa de 80 e +, totalizando 15,77% (n=756) nos 10 anos, enquanto a a faixa etária entre 60-64 anos foi apontada como a mais afetadas pela intoxicações por medicamentos, tendo 32,78% (n=1.572) de frequência dos casos.

O elevado número de casos de intoxicação em idosos com 60-64 pode ser explicada conforme estudo de Santana; Sousa; Araújo (2023) pela maior autonomia destes, o que possivelmente pode aumentar o uso indiscriminado dos medicamentos. Além disso, a terceira idade é a faixa etária com maior destaque no uso de medicamentos analgésicos, entre outros medicamentos que podem ser comercializados sem a necessidade de apresentação da prescrição médica, podendo resultar inclusive no abuso da utilização dessas substâncias.

Normalmente, a autonomia e independência dos idosos tornam-se comprometidas ao passar dos anos devido às dificuldades e doenças crônicas que o envelhecimento pode ocasionar. Sendo assim, o idoso cada vez mais precisa de cuidados especiais, de fazer uso de medicamentos e necessitam buscar mais os serviços de saúde, o que causa a indispensabilidade de cuidados contínuos e específicos, justificando assim a diminuição dos casos ao aumentar a faixa etária (Sousa, et al., 2020).

Em relação ao número de intoxicações por raça, houve prevalência de casos nos idosos autodeclarados pardos em todos os anos na região Nordeste com 61,38% (n= 2.943) sendo notória a menor prevalência encontrada nos idosos de raça indígena apenas nos estados da Paraíba (n=0,21%), Pernambuco (n= 0,6%) e Alagoas (n= 0,22%) (Tabela 1), o que pode ser esclarecido pela população indígena não fazer uso de medicamentos, já que de acordo com o estudo de Ramos et al., (2023) a cultura indígena é mais voltada para utilização de produtos naturais ou fitoterápicos para o tratamento de doenças e agravos, diminuindo assim os riscos de intoxicação medicamentosa, como evidenciado pelo baixo número de casos.

Conforme apontado pelo Ministério de Saúde, esses números podem estar ligados à dificuldade da população negra ao acesso à saúde, como consultas médicas gratuitas e medicamentos, além da relação sobre os maiores índices da automedicação estar diretamente ligada a visão discriminatória da sociedade. Negros e pardos prevaleceram quando a raça/cor foi relacionada às intoxicações provocadas por violência e homicídio (Silva; Alvim, 2020).

Ao se referir às circunstâncias que podem levar à intoxicação medicamentosa, encontra- se o uso habitual, acidental, ambiental, uso terapêutico, prescrição médica, erro de administração, automedicação, abuso, ingestão de alimentos, tentativa de suicídio, tentativa de aborto, violência/homicídio e outros, a tentativa de suicídio foi a mais frequente em todos os anos analisados com 28,32% (n=1.382) na região Nordeste (Tabela 1), configurando-se como foi demonstrado por Mathias; Guidoni; Girotto (2019) como a principal causa de intoxicação exógena, sendo também a mais grave, uma vez que o indivíduo tem intencionalidade em ingerir uma grande quantidade do medicamento, requerendo um manejo mais cuidadoso dos casos.

Acredita-se que as tentativas de suicídio superem o número de suicídios em, pelo menos dez vezes, porém os registros oficiais sobre tentativas de suicídio são mais escassos e menos confiáveis do que os de suicídio. Estudos mostram que o gênero feminino representa a maior parte dos casos de tentativa de suicídio medicamentosa. Entre as causas que explicam a tendência de mulheres a um ato suicida são: maior exposição ao abuso sexual na infância, violência doméstica, vulnerabilidade frente a estressores psicossociais, patologias mentais e aspectos culturais relacionados à igualdade de gênero (Pereira; Ribeiro; Britto, 2020). Esse predomínio pode ainda estar associado ao método de suicídio, tendo em vista que a literatura aponta entre as mulheres uma maior escolha por métodos de suicídio de menor gravidade, tal como são considerados os medicamentos, enquanto homens escolhem métodos mais agressivos.

Observa-se que as intoxicações medicamentosas por idosos na região Nordeste não apresentam relação com a exposição de trabalho (Tabela 1), tendo em vista que 85,36% (n=4.093) de notificações de ocorrências desta natureza. Dentro do período total estudado, apenas 1,06% (n=51) ocorrências estão relacionadas à exposição de trabalho. Esse dado pode estar relacionado à faixa etária analisada neste estudo, que, em geral, já se retirou do mercado de trabalho.

Normalmente, de acordo com Fernandes et al., (2021) um longo contato com determinada substância tóxica pode causar intoxicação e no caso das intoxicações medicamentosas é devido a uma ingestão de dosagem elevada desses fármacos, podendo ser através de uma exposição de trabalho, acidental ou devido a outras circunstâncias.

Conforme os dados observados na Tabela 1, a população em estudo obteve uma grande exposição de aguda-única com 63,55% (n=3.047), sendo no estado da Bahia com mais notificações 57,14% (n=388). De acordo com Santana et al., (2019), muitos fármacos não ocasionam lesões patológicas características, sendo os sintomas de intoxicação muitas vezes inespecíficos, dessa forma, não havendo um diagnóstico confirmado, os pacientes comumente recebem apenas tratamento sintomático. De modo geral, as exposições agudas ocorrem por tentativa de suicídio, acidentes e uso habitual, já os casos de exposição aguda repetida ocorrem em maior frequência deforma acidental, seguida de tentativa de suicídio.

Quando se trata da classificação final, o presente estudo mostrou um maior percentual de intoxicação confirmada com 57,71% (n=2.767) dos casos na região Nordeste, embora os resultados apresentem 63,42% (n=3.041) do critério de confirmação foi cínico 63,42% (n=3.041). No entanto, na pesquisa de Silva et al., (2021), o prognóstico dos casos de intoxicação medicamentosa depende da composição do medicamento, do conhecimento e a difusão de informações sobre os sintomas de efeitos colaterais e de interações medicamentosas, do conhecimento sobre os sinais de uma intoxicação e como agir diante dela, do atendimento hospitalar, sendo esses fatores decisivos para uma boa evolução dos casos.

Ao analisar a evolução dos casos foi verificado que 73,14% (n=3.507) teve cura sem sequela e 1,81 (n=87) notificações evoluíram para o óbito. Dessa forma, a maioria dos casos de intoxicação resultou em cura sem sequelas, dado que sugere eficácia no atendimento dos serviços e reafirma a segurança dos medicamentos, que apresentam letalidade mais baixa quando comparadas a outras substâncias que podem causar intoxicações exógenas. Contudo diante dos casos que evoluiram para o óbito ainda há um agravante sobre o descontrole do uso racional dos medicamentos: o fornecimento ilegal de medicamentos dispensados mediantes retenção de receituário, os psicotrópicos, que atuam no Sistema Nervoso Central (SNC), causando alterações de humor, percepção, sensações e comportamentos, favorecendo a utilização inadequada e a dependência por medicamentos mesmo sem necessidade, esse agravante demonstra a ineficácia da fiscalização e a falta de vigilância do consumo, apesar da legislação vigente, que se propõe a controlar a utilização de listas de substâncias em todo o território nacional (Silva; Nogueira, 2021).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho, com o objetivo de conhecer o perfil de internações por intoxicações por medicamentos em idosos na região nordeste entre 2012 e 2022, analisou dados notificados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN/DATASUS). Considerando que os Centros de Assistência Toxicológicas existentes no Brasil são os responsáveis pelo registro desses episódios, é imprescindível que os profissionais sejam orientados a notificar as ocorrências e compreendam a importância de realizá-las, para que se tenha conhecimento do número real de casos ocorridos no país.

Os medicamentos representam um dos principais agentes de intoxicações humanas registradas no Brasil e, embora sejam um meio de promover qualidade de vida, podem causar riscos, se não forem utilizados de maneira adequada. Ao longo dos anos avaliados foram notificados números expressivos de casos de intoxicação medicamentosa por idosos, especialmente no gênero feminino, na faixa etária entre 60-64 anos, idosos autodeclarados pardas. Ao se referir às circunstâncias que podem levar à intoxicação medicamentosa, constatou-se a tentativa de suicídio sendo assim associada a grande exposição aguda-única com maior prevalência no estudo, e diante da confirmação clínica o maior percentual foi atribuída à intoxicação confirmada.

Os dados demonstraram um padrão de ocorrência que corrobora com resultados evidenciados na literatura conforme exporto no decorrer do estudo. Assim, infere-se que essas informações reforçam a necessidade da implementação de medidas preventivas, considerando os perfis de ocorrência das notificações, para que haja planejamento adequado acerca das intervenções necessárias, uma vez que as ações preventivas de educação em saúde devem ser direcionadas a grupos específicos para atingirem efetividade e, dessa forma, poderem ajudar a reduzir as ocorrências de intoxicações medicamentosas nosistema de saúde.

Além disso, deve-se levar à população informações sobre as atribuições relacionadas aos medicamentos, como seu uso, armazenamento, transporte e descarte, a fim de reduzir o índice de intoxicações evitáveis, e prover maior preparo das equipes de saúde para receber esses casos, visando uma incidência ainda maior de prognósticos favoráveis.Ademais, é importante observar a importância de ações de prevenção ao suicídio, atentando para os índices desse tipo de exposição, que chama atenção para uma necessidade de maior controle quanto ao consumo de fármacos. Ressalta-se ainda a importância da participação ativa do farmacêutico na equipe de saúde, visto que este é profissional mais apropriado para compartilhar informações sobre medicamentos, bem como expandir essas informações especialmente às populações mais vulneráveis aos efeitos nocivos dos mesmos.

Portanto, é indicado que se desenvolva um levantamento do perfil das intoxicações medicamentosas que confronte os dados presentes neste estudo.

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1 Graduando em Medicina pelo Centro Universitário UNINOVAFAPI. E-mail: aminadamed@gmail.com

2 Graduanda em Medicina pelo Centro Universitário UNINOVAFAPI. E-mail: ligia_mimosa@hotmail.com

3 Orientador. Médico pela Universidade Estadual do Piauí (2017) Psiquiatria pela Universidade Federal do Piauí (2021) Professor do curso de Medicina do Centro Universitário Uninovafapi Professor do curso de Medicina da Faculdade CET E-mail: Maurilio.lima@uninovafapi.edu.br