REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202511150801
Desirée Deborah H. Coelho Pereira¹
Fabíola Campidel De Oliveira¹
Lívia Márcia Gomes Malta¹
Orientadora: Profa. Lorena Silva Matos Andrade
RESUMO
O uso de fitoterápicos no manejo da ansiedade tem crescido devido à busca por alternativas terapêuticas com menor risco de dependência e efeitos adversos. Este estudo teve como objetivo analisar as evidências científicas sobre a eficácia e a segurança dos principais fitoterápicos utilizados no tratamento da ansiedade, além de discutir os riscos associados ao uso inadequado. Trata-se de uma revisão integrativa realizada nas bases PubMed, SciELO e BVS, com artigos publicados entre 2020 e 2025. Os resultados apontam que espécies como Passiflora incarnata, Valeriana officinalis, Melissa officinalis, Matricaria chamomilla e Lavandula angustifolia apresentam ação ansiolítica clinicamente relevante, sobretudo por sua atuação sobre o sistema GABAérgico, com boa tolerabilidade e menor risco de dependência. Entretanto, a automedicação, as interações medicamentosas e o uso simultâneo com ansiolíticos sintéticos representam riscos importantes, especialmente na ausência de acompanhamento profissional. Conclui-se que os fitoterápicos podem ser utilizados de forma segura e eficaz no manejo da ansiedade, desde que empregados racionalmente, com orientação farmacêutica e respaldo científico, reforçando a necessidade de educação em saúde e de estudos clínicos mais padronizados.
Palavras-chave: Fitoterapia; Ansiedade; Uso racional; Plantas medicinais; Segurança.
ABSTRACT
The use of herbal medicines in anxiety management has increased due to the search for therapeutic alternatives with lower risks of dependence and adverse effects. This study aimed to analyze the scientific evidence regarding the efficacy and safety of the main herbal medicines used in the treatment of anxiety, as well as to discuss the risks associated with inappropriate use. This is an integrative review conducted in the PubMed, SciELO and BVS databases, including articles published between 2020 and 2025. The results indicate that species such as Passiflora incarnata, Valeriana officinalis, Melissa officinalis, Matricaria chamomilla and Lavandula angustifolia show clinically relevant anxiolytic effects, mainly through modulation of the GABAergic system, with good tolerability and lower risk of dependence. However, self-medication, drug interactions and concurrent use with synthetic anxiolytics present significant risks, especially without professional supervision. It is concluded that herbal medicines can be used safely and effectively in anxiety management, provided they are employed rationally, with pharmaceutical guidance and scientific support, reinforcing the need for health education and more standardized clinical studies.
Keywords: Phytotherapy; Anxiety; Rational use; Medicinal plants; Safety.
1 INTRODUÇÃO
Na sociedade contemporânea, a ansiedade é um dos transtornos mentais mais prevalentes, afetando significativamente a saúde mental e a qualidade de vida dos indivíduos. Seus sintomas incluem agitação, angústia, sensação de sufocamento e aperto no peito, que, quando intensos e frequentes, caracterizam a ansiedade patológica (FONSECA, 2023; BRASIL, 2023). Esse quadro pode se manifestar de diferentes formas clínicas, dentre as quais se destaca o Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), caracterizado pela preocupação excessiva e persistente em relação a múltiplas situações do cotidiano.
O tratamento convencional da ansiedade geralmente envolve o uso de medicamentos controlados, como benzodiazepínicos e antidepressivos, que, embora eficazes, podem ocasionar efeitos adversos relevantes e risco de dependência (EBSERH, 2022). Diante desses aspectos, cresce o interesse pelo uso de fitoterápicos como alternativa ou complemento terapêutico, devido ao seu perfil de segurança mais favorável e à busca por práticas integrativas em saúde.
Fitoterápicos são medicamentos obtidos a partir de plantas medicinais, cujas partes como folhas, raízes, flores ou cascas, contêm substâncias bioativas capazes de exercer efeitos terapêuticos no organismo humano (BRASIL, 2024). Podem ser encontrados em diferentes formas farmacêuticas, como cápsulas, comprimidos, xaropes, chás e extratos, sendo amplamente utilizados na prevenção e no tratamento de sintomas físicos e psíquicos. Entretanto, o uso indiscriminado e sem orientação profissional pode trazer sérios riscos à saúde, incluindo interações medicamentosas, dosagens inadequadas e atraso no início de terapias farmacológicas convencionais (ALENCAR; MEDEIROS; BRITTO, 2020).
Dessa forma, torna-se evidente a importância de promover o uso racional dos fitoterápicos, fundamentado em evidências científicas e acompanhado por profissionais de saúde. Isso assegura eficácia e segurança, minimizando os riscos da automedicação e a falsa percepção de que produtos naturais são necessariamente inofensivos. Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivo analisar o papel dos fitoterápicos no manejo da ansiedade, destacando os benefícios potenciais, as limitações e os riscos decorrentes do uso inadequado.
2 METODOLOGIA
2.1 TIPO DE ESTUDO
O presente trabalho é uma revisão integrativa da literatura, método de pesquisa que possibilita reunir, avaliar e sintetizar resultados de estudos científicos publicados. Essa abordagem é amplamente utilizada na área da saúde, pois permite a incorporação de evidências à prática clínica e acadêmica, promovendo uma análise crítica e abrangente do conhecimento existente sobre determinada temática.
2.2 CRITÉRIOS DE ELEGIBILIDADE
Foram considerados elegíveis para esta revisão os artigos publicados no período de 2020 a 2025, disponíveis em texto completo, redigidos em português ou inglês. Dentre os artigos, priorizaram- se aqueles que abordassem o uso de fitoterápicos no tratamento da ansiedade, contemplando aspectos como eficácia terapêutica, segurança, uso racional e riscos associados à utilização inadequada.
Além disso, foram excluídos da análise monografias, dissertações, teses, livros, capítulos de livros, editoriais, resumos simples de eventos científicos, bem como publicações duplicadas ou que não apresentassem relação direta com a temática proposta.
2.3 FONTES DE PESQUISAS
A busca bibliográfica foi conduzida nas bases de dados PubMed, SciELO e Biblioteca Virtual em Saúde (BVS). A escolha dessas plataformas justifica-se por sua ampla abrangência de publicações científicas na área da saúde e pela confiabilidade das informações disponibilizadas, assegurando a obtenção de artigos atualizados e pertinentes ao tema.
2.4 ESTRATÉGIA DE PESQUISA
A estratégia de busca foi construída a partir da combinação de descritores controlados dos vocabulários DeCS (Descritores em Ciências da Saúde) e MeSH (Medical Subject Headings), de modo a garantir maior precisão e abrangência dos estudos. As combinações foram realizadas com o auxílio dos operadores booleanos AND e OR conforme o Quadro 1.
Quadro 1. Estratégia de busca estratificada segundo bases de dado
| Base de dados | Estratégia de Pesquisa |
| BVS | (“medicamentos fitoterápicos”) AND (“uso racional”) AND (“ansiedade”) |
| SciELO | (“fitoterápicos”) AND (“eficácia” OR “segurança”) AND (“uso racional”) |
| PUBMED | (“Acceptability”) AND (“Anxiety”) AND (“Efficacy”) AND (“Medicinal herb”) |
Fonte: Elaborado pelos autores.
2.5 COLETA E EXTRAÇÃO DE DADO
A seleção dos artigos iniciou-se pela leitura de títulos e resumos, a fim de verificar a relação direta com o tema proposto. Aqueles que se mostraram pertinentes foram lidos integralmente para confirmar sua adequação aos critérios da pesquisa.
Os dados extraídos foram organizados em uma planilha no Google Sheets, contendo informações como autor, ano de publicação, idioma, tipo de estudo, principais resultados e conclusões acerca do uso de fitoterápicos no tratamento da ansiedade.
Essa sistematização possibilitou uniformizar a coleta e facilitar a comparação entre os estudos selecionados, assegurando maior clareza e confiabilidade à análise.
2.6 ANÁLISE E APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS
Após a seleção, os estudos incluídos foram organizados em um quadro resumo, contendo informações essenciais, como autor, ano de publicação, tipo de estudo, principais resultados e conclusões relacionadas ao uso de fitoterápicos na ansiedade.
A análise foi conduzida de forma descritiva e comparativa, buscando evidenciar os aspectos mais relevantes de cada artigo, identificar semelhanças e diferenças nos achados e apontar possíveis lacunas na literatura. Essa sistematização permitiu reunir as evidências disponíveis de maneira clara e objetiva, favorecendo a compreensão crítica do tema.
3 RESULTADOS
A busca realizada nas bases de dados resultou na seleção de estudos que atenderam aos critérios de inclusão definidos para esta revisão integrativa. Os artigos encontrados abordam o uso de diferentes espécies de fitoterápicos no manejo da ansiedade, destacando suas evidências de eficácia, possíveis mecanismos de ação e aspectos relacionados à segurança do uso.
Os estudos incluídos apresentam variedade metodológica e temporal, abrangendo o período de 2020 a 2025, e englobam desde revisões de literatura até ensaios clínicos e estudos experimentais, o que contribui para uma compreensão mais ampla sobre o papel dos fitoterápicos na terapêutica da ansiedade.
A seguir, a Tabela 1 apresenta uma síntese das principais características e resultados dos artigos analisados, evidenciando os avanços científicos e as lacunas ainda existentes sobre o tema
Tabela 1 – Resumo das publicações incluídas
| Autores / Ano | Título do estudo | Espécies vegetais investigadas | Principais achados / Resultados | Conclusões relevantes |
| Dorlivete, D. S.; Silva, A. R.; Costa, L. A.; et al. (2022) | Uso concomitante de ansiolíticos e plantas medicinais: Será que há riscos? | Passiflora incarnata, Hypericum Perforatum Valeriana officinalis, Melissa officinalis, Matricaria recutita, Ginkgo biloba, Rhodiola rosea e Piper methysticum | O estudo identificou o uso frequente e simultâneo de medicamentos ansiolíticos com plantas medicinais de efeito calmante. Destaca o potencial risco de interações farmacológicas, somação de efeitos depressores do SNC e sedação excessiva. | Conclui-se que, por falta de informação a população adquire o uso irracional desses medicamentos, o uso concomitante com psicotrópicos requer acompanhamento farmacêutico para evitar reações adversas e intoxicações. |
| Dourado, A. L. G. et al. (2025) | Avaliação da efetividade e segurança de fitoterápicos utilizados no tratamento da ansiedade | Passiflora incarnata, Valeriana officinalis, Melissa officinalis | Evidenciou eficácia clínica dessas espécies na modulação do sistema GABAérgico | O uso racional e supervisionado desses fitoterápicos pode representar alternativa segura e eficaz aos ansiolíticos sintéticos. Porém, é importante a padronização das dosagens e posologias |
| Silva, A. C. da et al. (2022) | Plantas com ação no sistema nervoso central que constam na RENISUS | Matricaria chamomilla, Erythrina mulungu, Passiflora incarnata, Melissa officinalis, Valeriana officinalis, Piper methysticum | Destacou espécies com ação antidepressiva a e ansiolítica comprovadas , presentes na RENISUS. | Recomenda ampliação da lista de plantas com potencial ansiolítico no SUS e uso racional dessas terapias. |
| Pedroso, R. S.; Andrade, G.; Pires, R. H. (2021) | Plantas medicinais: uma abordagem sobre o uso seguro e racional | Plantas medicinais: uma abordagem sobre o uso seguro e racional | Evidenciou se aumento no uso de plantas medicinais, porém com riscos de toxicidade, interações medicamentosas e uso inadequado por falta de orientação profissional. O estudo destaca a necessidade de políticas públicas e educação em saúde para promover o uso seguro e racional | O uso racional requer conhecimento técnico e acompanhamento profissional. Profissionais de saúde devem atuar na educação e promoção do uso responsável de fitoterápicos, especialmente no SUS. |
| Silva, T. S. de Brito; Oliveira, F. F.; Santos, R. M. (2022) | Plantas medicinais e fitoterápicos no cuidado da saúde mental em tempos de pandemia: uma revisão da literatura | Cymbopogon citratus, Lavandula officinalis, Melissa officinalis, Passiflora incarnata, Valeriana officinalis e Piper methysticum | Observou-se que várias espécies apresentaram efeitos ansiolíticos e calmantes associados à modulação do sistema GABAérgico e à redução de sintomas de ansiedade em estudos clínicos e pré-clínicos. Também destacou a popularização do uso doméstico dessas plantas e o risco de automedicação sem acompanhamento profissional. | Conclui que o uso de fitoterápicos pode contribuir de forma segura e complementar para o manejo da ansiedade e de outros transtornos leves de humor, desde que ocorra de maneira racional e supervisionada por profissionais de saúde. Recomenda-se ampliar pesquisas clínicas padronizadas e fortalecer ações de educação em saúde voltadas à fitoterapia. |
| Carvalho, L. G. Leite, S. C. Costa, D. A. F. (2021) | Principais fitoterápicos e demais medicamentos utilizados no tratamento de ansiedade e depressão | Passiflora incarnata L., Valeriana officinalis L., O Piper methysticum L., Hypericum perforatum L. e Crataegus oxyacanth L. | Medicamento s fitoterápicos mesmo que mais leves também possuem seus efeitos colaterais, bem como suas contraindicaç ões, não devem ser associados com outros depressores do sistema nervoso, e não deve ser associado com indivíduos hepato comprometidos, gestantes ou lactantes. | Conclui-se que o tratamento convencional do transtorno de ansiedade e depressão causa muitos efeitos colaterais, e com isso os fitoterápicos vêm sendo utilizados em casos leves. Vale ressaltar que mesmo sendo regularizados no Brasil de acordo com a ANVISA, os medicamentos fitoterápicos também possuem seus efeitos colaterais. Recomenda-se uma avaliação médica precisa do caso do paciente, relatando seu histórico com sinais e sintomas, para assim ter uma indicação terapêutica adequada. |
| K Kenda, M.; Nanz, A.; Nöthlings, U.; et al. (2022) | Medicinal Plants Used for Anxiety, Depression, or Stress: An Update | Lavandula (lavanda), Humulus (lúpulo), Passiflora, Melissa (erva- cidreira), Valeriana, entre outras | Identificou-se que lavanda, lúpulo, maracujá (Passiflora), erva-cidreira e valeriana têm evidências mais consistentes em ensaios clínicos para alívio de sintomas leves de ansiedade/ depressão | Algumas plantas medicinais mostram potencial terapêutico para quadros leves de ansiedade, mas o emprego racional exige consideração de dosagem, segurança, interações e seleção criteriosa de paciente |
| Zhang, Y.; Wang, Y.; Zhang, H.; et al. (2022) | Medicinal herbs for the treatment of anxiety: A systematic review and network meta-analysis | Lavandula angustifolia (Silexan), Piper methysticum (Kava), Crocus sativus (Açafrão), Withania somnifera (Ashwagandh a), Ginkgo biloba, Passiflora incarnata, Galphimia glauca, e formulações compostas como Manasamitra v Vataka | Em comparação entre diversas plantas: Silexan apresentou efeito significativo na redução de ansiedade (diferença média –3,84 no escore HAMA) Kava demonstrou efeito ansiolítico (MD –2,46) Ginkgo biloba e Withania somnifera também demonstraram eficácia nos escores de ansiedade Passiflora e açafrão foram apontados como merecedores de mais estudo, ainda que não se tenham destacado no somatório da rede principal Todas as plantas apresentaram perfil de tolerância razoável quando comparadas aos controles | As plantas medicinais possuem potencial promissor para o tratamento da ansiedade, especialmente como coadjuvantes terapêuticos. A escolha entre os fitoterápicos deve considerar eficácia comparativa, tolerância, segurança e perfil de risco em interações medicamentosa s. |
| Saadatmand, S.; Hamzehgard eshi, Z.; Shabani, S.; et al. (2024) | The Effect of Oral Chamomile on Anxiety: A Systematic Review | Camomila (Matricaria chamomilla) | De 10 ensaios clínicos incluídos, 9 sugerem que a administraçã o oral de camomila é eficaz para reduzir sintomas de ansiedade, uso de cápsulas ou chá, diferentes doses e durações; efeitos adversos raros relatados. | Conclui-se que a camomila oral mostrou perfil promissor como ansiolítico natural, seu uso racional no manejo da ansiedade pode compor estratégias integradas, considerando dosagem, monitoramento e possíveis interações. |
4 DISCUSSÃO
Os resultados obtidos nesta revisão integrativa demonstram que o uso de fitoterápicos tem se consolidado como uma alternativa terapêutica eficaz e segura no manejo da ansiedade, sobretudo em casos leves e moderados. As evidências reunidas, tanto em estudos nacionais quanto internacionais, reforçam que essas plantas medicinais atuam de forma relevante na regulação do sistema nervoso central, apresentando efeitos ansiolíticos, sedativos e antidepressivos, além de boa tolerabilidade e baixo risco de dependência (DOURADO et al., 2025; SILVA et al., 2022; ZHANG et al., 2022).
O estudo de Zhang et al. (2022), uma meta-análise em rede que avaliou 29 ensaios clínicos randomizados, identificou que, entre doze plantas medicinais analisadas, Silexan® (extrato padronizado de Lavandula angustifolia) e Kava kava (Piper methysticum) apresentaram os efeitos ansiolíticos mais consistentes, com redução significativa nos escores da Escala de Ansiedade de Hamilton (HAMA). Além disso, o Silexan demonstrou ainda benefícios sobre sintomas de insônia e depressão leve, mantendo boa tolerabilidade. Já a kava apresentou eficácia moderada, mas requer cautela devido ao risco potencial de hepatotoxicidade, reforçando a necessidade de monitoramento clínico e uso racional (ZHANG et al., 2022).
De forma semelhante, Saadatmand et al. (2024) realizaram uma revisão sistemática de dez ensaios clínicos sobre o uso oral de camomila (Matricaria chamomilla L.) e observaram que nove estudos relataram redução significativa dos sintomas ansiosos, tanto em pacientes com transtorno de ansiedade generalizada (TAG) quanto em grupos específicos, como mulheres na menopausa, pacientes oncológicos e indivíduos com insônia. O principal constituinte ativo, a apigenina, atua modulando os receptores GABA e o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, o que explica seu efeito ansiolítico e leve sedativo. A maioria dos estudos relatou boa tolerabilidade e ausência de eventos adversos graves, embora haja registros de reações alérgicas em indivíduos sensíveis à família Asteraceae e potenciais interações medicamentosas com anticoagulantes e depressores do sistema nervoso central (SAADATMAND et al., 2024).
Entre as espécies mais investigadas em revisões brasileiras e internacionais, destacam-se também Passiflora incarnata, Valeriana officinalis e Melissa officinalis, que apresentaram resultados clínicos consistentes quanto à eficácia e segurança (DOURADO et al., 2025; SILVA et al., 2022; ZHANG et al., 2022). Ensaios clínicos relatam que a Passiflora incarnata reduz significativamente os níveis de ansiedade em situações de estresse e em períodos pré-operatórios, com efeitos comparáveis aos benzodiazepínicos, porém sem causar dependência química. A Valeriana officinalis demonstrou melhora na qualidade do sono e na redução da tensão, enquanto a Melissa officinalis apresentou efeitos ansiolíticos e antidepressivos leves, atuando sobre o sistema GABAérgico e promovendo equilíbrio emocional (DOURADO et al., 2025).
O estudo de Costa, Carvalho e Leite (2021) também ressalta o potencial terapêutico de espécies como Erythrina mulungu, Ginkgo biloba e Lavandula officinalis, que apresentam efeito calmante e ansiolítico comprovado. O Ginkgo biloba, embora eficaz em alguns casos, foi associado a reações adversas leves, como cefaleia e desconforto gastrintestinal. Já o Mulungu possui ampla utilização tradicional no Brasil, mas ainda carece de ensaios clínicos padronizados que confirmem sua segurança e eficácia em longo prazo (COSTA; CARVALHO; LEITE, 2021).
Esses efeitos farmacológicos estão associados à presença de metabólitos secundários como os flavonoides, terpenos, alcaloides e saponinas, capazes de modular neurotransmissores como GABA, serotonina e noradrenalina, reduzindo a excitabilidade neuronal e promovendo relaxamento e bem-estar (SILVA et al., 2022; SAADATMAND et al., 2024). Entretanto, a diversidade de formulações, métodos de extração e dosagens entre os estudos representa um obstáculo à padronização terapêutica, comprometendo comparações diretas e o estabelecimento de protocolos clínicos uniformes (ZHANG et al., 2022; DOURADO et al., 2025).
Outro ponto relevante identificado na literatura é a percepção equivocada de que produtos naturais são isentos de riscos. Dorlivete et al. (2022) observaram que a automedicação e o uso concomitante de fitoterápicos e ansiolíticos sintéticos são práticas comuns, o que pode levar à potencialização dos efeitos depressores do sistema nervoso central e à sedação excessiva. Essas práticas reforçam a importância da educação em saúde e da orientação profissional, especialmente do farmacêutico, para prevenir riscos e garantir o uso racional.
De acordo com Pedroso, Andrade e Pires (2021), o farmacêutico desempenha papel essencial na promoção do uso racional de fitoterápicos, orientando quanto às doses adequadas, possíveis interações e contraindicações, além de atuar na farmacovigilância e no acompanhamento do paciente. Essa atuação é indispensável para a integração segura da fitoterapia às práticas de saúde pública, fortalecendo o cuidado farmacêutico humanizado (COSTA; CARVALHO; LEITE, 2021; PEDROSO; ANDRADE; PIRES, 2021).
Além disso, segundo Silva et al. (2022), espécies como Matricaria chamomilla, Erythrina mulungu e Passiflora incarnata estão incluídas na Relação Nacional de Plantas Medicinais de Interesse ao SUS (RENISUS), reforçando o reconhecimento oficial da fitoterapia como prática complementar segura e baseada em evidências.
Em síntese, o conjunto das evidências analisadas confirma que os fitoterápicos representam uma alternativa terapêutica promissora e segura no manejo da ansiedade, com eficácia comparável a fármacos sintéticos em muitos casos. No entanto, sua efetividade clínica depende da padronização dos extratos, da condução de estudos robustos e da orientação profissional qualificada. O fortalecimento das pesquisas clínicas, a capacitação dos profissionais de saúde e a conscientização da população são estratégias indispensáveis para consolidar o uso racional e científico das plantas medicinais no cuidado à saúde mental (DOURADO et al., 2025; SAADATMAND et al., 2024; ZHANG et al., 2022).
5 CONCLUSÃO
O presente estudo permitiu reunir e analisar evidências científicas acerca do uso racional de fitoterápicos no manejo da ansiedade, destacando tanto seu potencial terapêutico quanto os riscos associados ao uso inadequado. Os resultados obtidos demonstram que espécies como Passiflora incarnata, Valeriana officinalis, Melissa officinalis, Matricaria chamomilla e Lavandula angustifolia apresentam eficácia significativa na redução dos sintomas ansiosos, sobretudo em casos leves e moderados, atuando principalmente por mecanismos relacionados à modulação do sistema GABAérgico e à regulação do sistema nervoso central.
Constatou-se que, em comparação aos ansiolíticos sintéticos, os fitoterápicos apresentam perfil de segurança mais favorável e menor risco de dependência, sendo opções terapêuticas promissoras quando utilizadas sob orientação profissional. Entretanto, verificou-se também que o uso indiscriminado dessas substâncias, sem acompanhamento técnico adequado, pode ocasionar interações medicamentosas, efeitos adversos e prejuízos à eficácia do tratamento, reforçando a necessidade do uso racional e supervisionado.
A revisão evidenciou ainda a importância do farmacêutico na promoção do uso seguro de fitoterápicos, atuando na orientação ao paciente, na identificação de possíveis interações e na educação em saúde. Esse profissional desempenha papel essencial na integração da fitoterapia às práticas de atenção primária e nas políticas públicas de saúde, especialmente no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), que reconhece diversas espécies medicinais na RENISUS.
Apesar dos avanços nas pesquisas, ainda existem limitações relacionadas à falta de padronização de extratos, variação nas dosagens e escassez de estudos clínicos de longa duração. Assim, recomenda-se o incentivo a pesquisas mais robustas e controladas, capazes de estabelecer protocolos terapêuticos padronizados e fortalecer a base científica da fitoterapia no tratamento da ansiedade.
Conclui-se, portanto, que os fitoterápicos constituem uma alternativa eficaz, segura e acessível para o manejo da ansiedade, desde que utilizados de forma racional, embasados em evidências científicas e com acompanhamento profissional adequado. A consolidação dessas práticas representa um avanço importante para a promoção da saúde mental, a ampliação das terapias integrativas e o fortalecimento do cuidado farmacêutico no contexto brasileiro.
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¹Centro Universitário de Belo Horizonte (UniBH) – Curso de Farmácia, Belo Horizonte – MG, Brasil.
