REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202511092117
Isabella Fernanda Silva Rodrigues1
Mikaelayne de Cena Reis da Silva2
Jackeliny Matias Nunes3
Isabela Bernades Bosque4
Resumo: Este artigo analisou como a estimulação influencia as diferenças neurobiológicas no Transtorno do Espectro Autista (TEA), com foco na primeira infância, fase marcada por intensa plasticidade cerebral. A partir de uma revisão narrativa da literatura, investigaram-se os principais tipos de estimulação utilizados em intervenções voltadas ao desenvolvimento de crianças com TEA, avaliando seus efeitos na comunicação e na socialização. Os resultados demonstraram que práticas como fonoaudiologia precoce, comunicação alternativa, musicoterapia, psicomotricidade, realidade virtual e capacitação parental contribuem para ampliar as possibilidades comunicativas, reduzir comportamentos disruptivos e fortalecer vínculos afetivos. Além disso, observou-se que a estimulação precoce favorece a participação em atividades coletivas, o brincar compartilhado e a inclusão escolar, aspectos fundamentais para o desenvolvimento socioemocional. A literatura indica que quanto mais cedo e de forma mais estruturada forem aplicadas as intervenções, maiores são os ganhos no desenvolvimento comunicativo e social das crianças autistas. Conclui-se que a estimulação precoce desempenha papel essencial na reorganização neural e na promoção da autonomia e inclusão social, oferecendo subsídios práticos e teóricos para a Psicologia e áreas afins.
Palavras-chave: autismo; neurobiologia; estimulação precoce; comunicação; socialização.
Abstract: This article analyzed how stimulation influences neurobiological differences in Autism Spectrum Disorder (ASD), with a focus on early childhood, a stage marked by intense brain plasticity. Based on a narrative literature review, the study investigated the main types of stimulation used in interventions aimed at the development of children with ASD, assessing their effects on communication and socialization. The results showed that practices such as early speech therapy, augmentative communication, music therapy, psychomotricity, virtual reality and parental training contribute to expanding communicative possibilities, reducing disruptive behaviors, and strengthening affective bonds. Furthermore, it was observed that early stimulation favors participation in group activities, shared play and school inclusion, aspects that are fundamental for socioemotional development. The literature indicates that the earlier and more structured the interventions are applied, the greater the gains in the communicative and social development of autistic children. It is concluded that early stimulation plays an essential role in neural reorganization and in promoting autonomy and social inclusion, offering practical and theoretical contributions to Psychology and related fields.
Key-words: Autism; neurobiology; early stimulation; communication; socialization.
1. INTRODUÇÃO
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) constitui uma condição do neurodesenvolvimento caracterizada por alterações significativas na comunicação, na interação social e no comportamento, além da presença de padrões restritos e repetitivos de atividades e interesses. Trata-se de um transtorno complexo, de origem multifatorial, que envolve influências genéticas, epigenéticas e ambientais. Nas últimas décadas, o aumento da prevalência de diagnósticos tem despertado a atenção da comunidade científica, impulsionando pesquisas sobre as bases neurobiológicas do TEA e suas implicações para o desenvolvimento infantil (Becker; Riesgo, 2016).
A primeira infância, período que abrange os primeiros anos de vida, é considerada uma janela crítica para o desenvolvimento, especialmente devido à elevada plasticidade cerebral que caracteriza essa fase. Durante esse período, as conexões sinápticas são formadas e reorganizadas de maneira intensa, e o ambiente desempenha papel central na modulação dessas conexões. No caso do TEA, a identificação precoce das alterações neurobiológicas associadas ao transtorno é essencial para o planejamento de intervenções que possam favorecer a aquisição de habilidades comunicativas, cognitivas e sociais (De Marco et al., 2021).
Do ponto de vista clínico, a intervenção precoce tem se mostrado um recurso fundamental para minimizar os impactos do TEA e potencializar a autonomia das crianças. A atuação de profissionais da Psicologia é apontada como estratégica nesse processo, já que possibilita não apenas o enfrentamento das dificuldades relacionadas à comunicação e ao comportamento, mas também o fortalecimento das potencialidades individuais. Alves e Alves (2022) destacam que a prática clínica direcionada ao autismo deve ultrapassar abordagens tradicionais, incorporando estratégias que respeitem a singularidade do sujeito e favoreçam o desenvolvimento socioemocional.
Outro aspecto de relevância nesse cenário é a participação da família, sobretudo dos pais, como agentes ativos no processo de estimulação. Bagaiolo et al. (2018) demonstram que a capacitação parental contribui para a promoção de um ambiente de aprendizagem contínuo, que se estende para além dos atendimentos clínicos, favorecendo a generalização das habilidades desenvolvidas. Essa parceria fortalece vínculos afetivos e cria uma base emocional segura, elementos indispensáveis para a socialização de crianças com TEA.
Pesquisas em neurociência têm mostrado que indivíduos com TEA apresentam padrões diferenciados de conectividade cerebral. Estudos de neuroimagem apontam hiperconectividade local e hipoconectividade de longa distância, bem como alterações em neurotransmissores como serotonina, dopamina e GABA, responsáveis por funções ligadas ao humor, à linguagem e ao comportamento social (Junior et al., 2023). Tais evidências reforçam a necessidade de práticas terapêuticas que estimulem a reorganização neural, aproveitando o potencial de plasticidade da primeira infância.
Além da clínica, o contexto escolar também exerce papel fundamental no desenvolvimento de crianças com TEA. Cabral, Falcke e Marin (2021) ressaltam que quando família e escola estabelecem estratégias conjuntas, as chances de avanços comunicativos e sociais são significativamente ampliadas. Esse alinhamento favorece não apenas a inclusão escolar, mas também a construção de trajetórias de aprendizado mais significativas, que fortalecem a autoestima e a sociabilidade dos alunos.
Práticas terapêuticas inovadoras, como musicoterapia, psicomotricidade e realidade virtual, também vêm sendo apontadas como alternativas eficazes para ampliar os recursos de estimulação em crianças autistas. Essas estratégias, além de promoverem motivação e engajamento, favorecem a estimulação multissensorial e o fortalecimento das conexões neurais (Magalhães et al., 2020). Complementando esse quadro, ferramentas de comunicação alternativa, como pranchas e aplicativos, possibilitam que crianças com comprometimento verbal possam expressar suas necessidades e emoções, o que favorece inclusão social e maior autonomia (Montenegro et al., 2021).
O brincar, elemento natural da infância, tem papel estruturante no processo de desenvolvimento de crianças com TEA. Moura et al. (2021) ressaltam que as atividades lúdicas organizadas em ambiente terapêutico ou escolar favorecem a ampliação do repertório comunicativo, a socialização e a organização dos estímulos sensoriais. Nesse sentido, o brincar torna-se uma via essencial para a construção de interações sociais mais ricas e funcionais.
A psicomotricidade também se destaca como recurso de grande relevância, pois permite integrar aspectos motores, cognitivos e afetivos. Pinheiro et al. (2022) mostram que a estimulação psicomotora contribui para o desenvolvimento das funções executivas, percepção corporal e regulação emocional, impactando diretamente na socialização e comunicação das crianças autistas. Assim, estratégias que associam corpo e mente ampliam as possibilidades de desenvolvimento global e favorecem a autonomia nas atividades cotidianas.
Apesar dos avanços nas pesquisas sobre o Transtorno do Espectro Autista, ainda existe uma lacuna teórica significativa quanto à compreensão de como diferentes formas de estimulação atuam sobre os mecanismos neurobiológicos e comportamentais na primeira infância, especialmente na integração entre comunicação, socialização e desenvolvimento emocional. Essa ausência de consenso reforça a importância de novas análises que articulem evidências clínicas, neurocientíficas e educacionais sobre o tema.
Diante disso, este artigo tem como problema de pesquisa: de que forma a estimulação precoce pode influenciar as diferenças neurobiológicas em crianças com Transtorno do Espectro Autista, especialmente no que se refere à socialização e à comunicação? Assim, o objetivo geral é analisar como a estimulação, aplicada na primeira infância, pode contribuir para o desenvolvimento cerebral e favorecer habilidades comunicativas e sociais em indivíduos com TEA. Como objetivos específicos, busca-se: (i) investigar os tipos de estimulação mais utilizados em intervenções precoces; (ii) avaliar os efeitos da estimulação no desenvolvimento da comunicação; e (iii) identificar o impacto da estimulação na socialização de crianças autistas.
Para alcançar os objetivos propostos, este artigo adotou uma abordagem qualitativa de natureza exploratória, fundamentada em revisão narrativa da literatura (Rother, 2007). Foram analisados 120 artigos científicos publicados entre os anos de 2015 e 2025, identificados nas bases SciELO e PubMed. Após a leitura e triagem dos títulos, resumos e textos completos, 20 estudos atenderam aos critérios de inclusão e foram analisados integralmente. A análise dos dados seguiu uma perspectiva integrativa, buscando identificar convergências teóricas e evidências empíricas sobre os efeitos das práticas de estimulação na socialização e comunicação infantil.
2. Diferenças Neurobiológica No Transtorno Do Espectro Autista
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) possui raízes neurobiológicas complexas, envolvendo alterações estruturais e funcionais do cérebro que impactam diretamente no comportamento, na comunicação e nas interações sociais. A literatura científica demonstra que indivíduos com TEA apresentam padrões diferenciados de conectividade neural, sendo caracterizados por uma hiperconectividade local associada à hipoconectividade de longa distância, além de modificações na densidade sináptica (Becker; Riesgo, 2016). Essas diferenças repercutem na forma como os estímulos são processados e explicam, em parte, as dificuldades em integrar informações sociais e comunicativas.
Estudos também evidenciam alterações nos neurotransmissores relacionados à regulação emocional, ao comportamento social e à linguagem. Entre eles destacam-se a serotonina, dopamina e o GABA, substâncias que desempenham papel essencial no funcionamento neural e no equilíbrio das respostas cognitivas e comportamentais (Junior et al., 2023). Esses achados reforçam a importância de compreender o TEA a partir de uma perspectiva neurobiológica, que considere as especificidades do desenvolvimento cerebral.
A neurociência contemporânea tem contribuído para aprofundar esse entendimento por meio de pesquisas em neuroimagem. Resultados apontam diferenças significativas em estruturas como o córtex pré-frontal, a amígdala e o cerebelo, regiões diretamente associadas ao controle executivo, ao processamento emocional e à coordenação motora (Cheung; Lau, 2020). Além disso, evidências sugerem que o TEA não é homogêneo, mas apresenta variações relacionadas a fatores biológicos, como o sexo, que pode influenciar características diagnósticas e comportamentais (Napolitano et al., 2022).
Nessa perspectiva, torna-se fundamental considerar a plasticidade cerebral como elemento-chave para compreender a capacidade de reorganização neural em indivíduos com TEA. Ainda que haja alterações estruturais, o cérebro é capaz de responder a estímulos externos e adaptar-se por meio de novas conexões (Rotta; Bridi Filho; Souza Bridi, 2018). Tal fenômeno abre possibilidades para intervenções que visem potencializar funções cognitivas e sociais.
A detecção precoce dessas alterações é outro aspecto crucial. Souza et al. (2020) ressaltam que o papel do pediatra é essencial para identificar sinais do espectro nos primeiros anos de vida, favorecendo encaminhamentos para intervenções adequadas. Além disso, o olhar interdisciplinar permite integrar aspectos neurológicos, sociais e emocionais na compreensão do TEA, ampliando as possibilidades de intervenção (De Souza; Juliani, 2018).
Por fim, vale destacar que o processo de pesquisa científica, entendido como um meio sistemático de investigar fenômenos humanos, contribui para aprofundar a compreensão da complexidade do TEA e gerar conhecimentos aplicáveis ao contexto clínico e educacional (Bastos; Keller, 2015). Assim, estudar as diferenças neurobiológicas do autismo é essencial para subsidiar práticas de estimulação que possam reorganizar as funções cerebrais e favorecer a socialização e comunicação.
2.1 Plasticidade cerebral e estimulação precoce
A plasticidade cerebral é um fenômeno que confere ao cérebro a capacidade de se reorganizar em resposta a estímulos ambientais, experiências e intervenções terapêuticas. Essa característica é especialmente relevante na primeira infância, período em que o cérebro se encontra em intenso processo de formação e reorganização de conexões sinápticas. No contexto do TEA, compreender como a plasticidade atual permite elaborar práticas de estimulação capazes de modificar trajetórias de desenvolvimento (De Marco et al., 2021).
Pesquisas mostram que a intervenção precoce é determinante para potencializar o desenvolvimento de crianças com TEA. Lavor e Muner (2020) reforçam que a estimulação aplicada nos primeiros anos de vida pode ampliar significativamente as funções cognitivas, motoras, sociais e comunicativas. A ausência de intervenção nessa fase crítica pode, ao contrário, acentuar déficits e limitar o desenvolvimento global.
Nesse cenário, a plasticidade cerebral não se limita à infância, mas permanece ativa ao longo da vida. Rotta, Bridi Filho e Souza Bridi (2018) afirmam que estímulos contínuos, adequados às demandas de cada fase, possibilitam que o cérebro reorganize suas conexões mesmo diante de alterações estruturais. Isso significa que a estimulação precoce é essencial, mas deve ser acompanhada por práticas permanentes, ajustadas ao longo do desenvolvimento.
Abordagens terapêuticas inovadoras, como musicoterapia, psicomotricidade e realidade virtual, têm sido apontadas como recursos complementares eficazes para favorecer a estimulação multissensorial em crianças autistas. Essas estratégias ampliam a motivação e o engajamento, elementos fundamentais para o fortalecimento de conexões neurais (Magalhães et al., 2020). Outro recurso de grande relevância é a psicomotricidade, que, ao integrar corpo e mente, contribui para o desenvolvimento das funções executivas, percepção corporal e regulação emocional (Pinheiro et al., 2022).
Além das práticas terapêuticas, o brincar também se constitui como ferramenta poderosa de estimulação. Moura et al. (2021) destacam que as atividades lúdicas promovem ganhos significativos no desenvolvimento cognitivo, afetivo e social de crianças com TEA, além de ampliar repertórios comunicativos. Nesse sentido, a ludicidade assume um papel terapêutico estruturante, que dialoga com as necessidades da infância.
A participação da família é outro elemento central nesse processo. Bagaiolo et al. (2018) enfatizam que a capacitação parental amplia a efetividade das intervenções, criando ambientes de aprendizagem contínuos e fortalecendo vínculos afetivos. Do mesmo modo, Alves e Alves (2022) reforçam a importância de uma prática clínica que vá além das técnicas convencionais, respeitando as singularidades neurobiológicas e sociais de cada criança.
2.2 Estimulação, socialização e comunicação na primeira infância
A socialização e a comunicação estão entre os principais desafios enfrentados por crianças com TEA. Nesse sentido, práticas de estimulação precoce têm se mostrado decisivas para favorecer o desenvolvimento dessas habilidades. Alves e Alves (2022) ressaltam que o papel do psicólogo é atuar de forma sensível, construindo estratégias que respeitem as particularidades neurobiológicas e fortaleçam o potencial comunicativo do sujeito.
A família ocupa posição estratégica nesse processo. Bagaiolo et al. (2018) apontam que o envolvimento parental amplia as oportunidades de generalização das aprendizagens, fortalecendo vínculos e promovendo maior segurança emocional. Esse cenário contribui para o desenvolvimento de competências sociais que se refletem em melhor qualidade de vida.
O ambiente escolar, por sua vez, também desempenha papel decisivo na construção da socialização. Cabral, Falcke e Marin (2021) afirmam que quando família e escola trabalham de forma articulada, as intervenções se tornam mais eficazes, refletindo em ganhos comunicativos e acadêmicos. Rezende et al. (2021) complementam que a inclusão escolar exige práticas pedagógicas fundamentadas nas especificidades do TEA, possibilitando trajetórias educativas mais significativas.
Ferramentas de comunicação alternativa são recursos que ampliam as possibilidades de interação de crianças autistas com comprometimento da linguagem verbal. Montenegro et al. (2021) demonstram que pranchas de comunicação e aplicativos digitais favorecem a expressão de necessidades e emoções, promovendo maior autonomia e inclusão social. O brincar, como recurso natural da infância, também favorece a comunicação e a socialização, funcionando como meio estruturante para a ampliação do repertório interativo (Moura et al., 2021).
A psicomotricidade se mostra igualmente eficaz, pois integra corpo e mente em atividades que estimulam funções executivas, percepção corporal e regulação emocional, favorecendo a socialização e comunicação (Pinheiro et al., 2022). Além disso, práticas como a musicoterapia e a realidade virtual ampliam o engajamento infantil e a estimulação multissensorial, aspectos que repercutem positivamente no desenvolvimento psicossocial (Magalhães et al., 2020).
Do ponto de vista metodológico, a pesquisa científica fornece subsídios para sistematizar e avaliar essas práticas. Bastos e Keller (2015) destacam que a produção acadêmica deve ser reflexiva, capaz de integrar teorias e práticas. Lunetta e Guerra (2023) complementam que a metodologia científica é essencial para garantir que os avanços na área sejam construídos com rigor e aplicabilidade.
De Souza e Juliani (2018) acrescentam que a prática psicológica deve abranger não apenas o tratamento de dificuldades comportamentais, mas também a promoção do desenvolvimento global da criança. Isso reforça a ideia de que a estimulação deve ser planejada de forma interdisciplinar, contemplando aspectos clínicos, escolares e familiares.
3. MATERIAIS E MÉTODOS
3.1 Tipo de estudo
Este artigo adotou uma abordagem qualitativa de natureza exploratória, fundamentada no método de revisão narrativa da literatura, por se tratar de um procedimento que possibilita explorar, de maneira abrangente e flexível, produções acadêmicas relacionadas às diferenças neurobiológicas no Transtorno do Espectro Autista (TEA) e aos efeitos da estimulação precoce sobre o desenvolvimento da comunicação e da socialização. Segundo Rother (2007), a revisão narrativa é um tipo de pesquisa que permite integrar e interpretar criticamente a literatura existente, sem o rigor metodológico de revisões sistemáticas, sendo especialmente adequada para investigações exploratórias em contextos complexos.
3.2 Levantamento bibliográfico e procedimentos de busca
O levantamento bibliográfico foi realizado entre os meses de março e junho de 2025, abrangendo o período de publicação de 2015 a 2025. Foram consultadas bases de dados eletrônicas reconhecidas pela comunidade científica, tais como SciELO, PubMed, PsycINFO, LILACS e Google Scholar, além de periódicos nacionais e internacionais especializados nas áreas de Psicologia, Neurociências, Educação e Desenvolvimento Infantil. Também foram considerados livros, capítulos de obras e trabalhos de pós-graduação, a fim de enriquecer a fundamentação teórica e contextualizar as discussões apresentadas.
3.3 Critérios de inclusão e exclusão
No total, foram identificados aproximadamente 120 estudos, dos quais 20 foram selecionados por atenderem aos critérios de inclusão previamente definidos. Os critérios de inclusão contemplaram publicações dentro do recorte temporal estabelecido, em português ou inglês, que abordassem pelo menos um dos seguintes eixos: (i) fundamentos neurobiológicos do TEA; (ii) plasticidade cerebral na primeira infância; (iii) estimulação precoce e práticas terapêuticas aplicadas a crianças com autismo; e (iv) impactos da estimulação na socialização e comunicação.
Foram excluídas produções que não apresentaram fundamentação científica adequada, como textos opinativos, publicações anteriores ao período definido e estudos sem relação direta com a primeira infância. Essa delimitação garantiu a pertinência, atualidade e confiabilidade dos materiais analisados.
3.4 Descritores e estratégia de busca
Para a condução das buscas, utilizaram-se descritores controlados baseados no DeCS/MeSH, tais como Transtorno do Espectro Autista, Neurobiologia, Plasticidade Cerebral, Estimulação Precoce, Comunicação e Socialização. Esses termos foram combinados por meio dos operadores booleanos AND e OR, o que permitiu refinar os resultados e ampliar a precisão da coleta, garantindo maior representatividade dos estudos relevantes ao tema.
3.5 Análise e sistematização dos dados
A análise foi conduzida de forma crítica e interpretativa, em consonância com os princípios da revisão narrativa. Inicialmente, os textos selecionados foram lidos na íntegra e organizados em planilhas, registrando-se os principais conceitos, objetivos e resultados de cada publicação. Em seguida, os dados foram sistematizados em três eixos temáticos:
(i) diferenças neurobiológicas no TEA;
(ii) plasticidade cerebral e estimulação precoce;
(iii) socialização e comunicação na primeira infância.
A interpretação dos resultados ocorreu por meio da triangulação teórica, comparando e contrastando os achados das diferentes fontes. Esse processo permitiu identificar convergências, divergências e lacunas na produção científica atual.
Por fim, buscou-se garantir a fidedignidade e validade do processo investigativo por meio da diversidade de referências, da análise reflexiva e da integração crítica dos dados. A metodologia adotada possibilitou reunir e organizar o conhecimento existente sobre as diferenças neurobiológicas no TEA e sobre a influência da estimulação precoce na comunicação e socialização infantil, respondendo adequadamente ao problema de pesquisa e aos objetivos propostos.
4. RESULTADOS
4.1 Tipos de estimulação mais utilizados em intervenções voltadas ao TEA
As práticas de estimulação voltadas ao Transtorno do Espectro Autista (TEA) têm sido objeto de crescente interesse científico, especialmente quando aplicadas à primeira infância. O conjunto de estratégias identificadas nos estudos recentes revela um campo diversificado, no qual terapias clínicas, recursos tecnológicos e programas familiares se complementam no objetivo de promover o desenvolvimento integral da criança.
Entre as abordagens mais recorrentes, destaca-se a fonoaudiologia precoce, essencial para estimular tanto a linguagem verbal quanto a não verbal. A intervenção nessa área é direcionada à construção de vocabulário, ao treino articulatório e ao uso de gestos, criando oportunidades para que a criança estabeleça formas funcionais de comunicação. A literatura ressalta que, quando iniciada precocemente, a fonoaudiologia aproveita a plasticidade cerebral e reduz atrasos no desenvolvimento comunicativo, além de dialogar com outras práticas, como a comunicação alternativa.
A comunicação alternativa e aumentativa tem se consolidado como um recurso indispensável para crianças não verbais ou com fala restrita. Por meio de pranchas ilustradas, pictogramas e aplicativos digitais, é possível ampliar os canais expressivos da criança, permitindo que ela participe ativamente das interações sociais. Esses dispositivos não substituem a fala, mas funcionam como suporte, prevenindo frustrações e promovendo inclusão. O uso contínuo desses recursos, tanto em casa quanto na escola, fortalece a autonomia e contribui para a socialização.
Outra prática que se mostra eficaz é a musicoterapia, que utiliza elementos sonoros e rítmicos para estimular a atenção, a interação e a comunicação não verbal. Estudos apontam que a música atua sobre áreas cerebrais relacionadas ao processamento emocional e auditivo, favorecendo a imitação, a coordenação motora e a percepção rítmica. Além de ser uma ferramenta de engajamento, a musicoterapia promove experiências prazerosas que fortalecem o vínculo afetivo entre a criança e o terapeuta.
A realidade virtual também aparece como inovação promissora. Os ambientes digitais imersivos oferecem situações controladas que permitem simular interações sociais e desenvolver habilidades cognitivas e perceptivas. Por seu caráter lúdico, essa prática mantém a motivação da criança e potencializa o engajamento em terapias que, de outra forma, poderiam ser menos atrativas. Ainda que seja uma área em expansão, os resultados sugerem impactos positivos na atenção compartilhada e na participação em atividades interativas.
A psicomotricidade, por sua vez, é considerada central no processo de estimulação, pois une movimento e cognição. Atividades motoras planejadas desenvolvem percepção corporal, organização espacial e regulação emocional, o que repercute diretamente no comportamento e na comunicação. Ao integrar corpo e mente, a psicomotricidade amplia as possibilidades de interação e fortalece funções executivas essenciais ao aprendizado.
Outro ponto relevante é a capacitação parental, que visa treinar pais e cuidadores para aplicarem estratégias de estimulação no cotidiano. Essa prática amplia o alcance das intervenções, assegurando a generalização das aprendizagens em diferentes contextos e fortalecendo vínculos afetivos. Estudos indicam que famílias capacitadas demonstram maior segurança no manejo de comportamentos e no estímulo à comunicação funcional.
Por fim, observa-se a inclusão de intervenções pedagógicas adaptadas ao ambiente escolar, que integram práticas clínicas e educacionais. A escola, ao acolher a criança com TEA, organiza atividades lúdicas e pedagógicas estruturadas, promovendo tanto a socialização quanto a aprendizagem. Essa integração garante um ambiente rico em estímulos, que potencializa os resultados obtidos em contextos clínicos.
A síntese dessas práticas pode ser observada na Tabela 1, que apresenta os principais tipos de estimulação identificados na literatura, suas características e resultados esperados.
Tabela 1 – Principais tipos de estimulação identificados na literatura

A análise da tabela evidencia que as práticas de estimulação não atuam isoladamente, mas se complementam em um modelo integrado. Enquanto recursos clínicos, como a fonoaudiologia e a comunicação alternativa, fornecem canais de expressão, estratégias inovadoras, como a musicoterapia e a realidade virtual, ampliam a motivação e a interação. Já a psicomotricidade fortalece a regulação emocional, e a capacitação parental assegura a continuidade da intervenção em contextos familiares. Assim, a literatura demonstra que o sucesso da estimulação em crianças com TEA depende da articulação entre diferentes práticas, aplicadas de maneira precoce, estruturada e interdisciplinar.
4.2 Efeitos da estimulação no desenvolvimento das habilidades comunicativas
A comunicação é um dos domínios mais impactados pelo Transtorno do Espectro Autista (TEA) e constitui um dos principais desafios para o desenvolvimento das crianças na primeira infância. O déficit comunicativo pode se manifestar tanto na linguagem verbal quanto na não verbal, comprometendo a capacidade de expressar necessidades, compartilhar emoções e estabelecer interações sociais significativas. Nesse contexto, a literatura aponta que diferentes formas de estimulação precoce contribuem para reduzir as barreiras comunicativas e favorecer avanços consistentes.
A intervenção precoce em comunicação possibilitou que crianças autistas desenvolvessem recursos expressivos mais funcionais. Estratégias aplicadas em idade inicial mostraram resultados positivos na construção de vocabulário, na articulação de palavras e na capacidade de formar frases simples. Em paralelo, foram observados progressos na comunicação não verbal, como o uso de expressões faciais, gestos e contato visual. Esses resultados confirmam que o início antecipado das intervenções aumenta as chances de aproveitamento da plasticidade cerebral, fator decisivo na aquisição da linguagem.
O uso de recursos tecnológicos, especialmente aqueles voltados para a comunicação alternativa e aumentativa, também demonstrou impacto significativo. Tablets, softwares específicos e aplicativos interativos ofereceram às crianças oportunidades de expressar emoções, desejos e necessidades mesmo em situações em que a fala estava ausente ou limitada. O caráter visual desses dispositivos facilitou a associação entre símbolos e significados, permitindo que as crianças participassem de interações com familiares, colegas e professores. Esse processo contribuiu para reduzir frustrações decorrentes da dificuldade de expressão, diminuindo comportamentos disruptivos associados à comunicação ineficaz.
Além dos recursos digitais, outras estratégias de estimulação buscaram fortalecer a função pragmática da linguagem, ou seja, a capacidade de usar a comunicação em contextos sociais. Intervenções estruturadas, realizadas em grupos ou ambientes escolares inclusivos, favoreceram a prática da comunicação em situações cotidianas, como brincar, pedir ajuda ou interagir em jogos coletivos. Nessas condições, observou-se que as crianças ampliaram o repertório comunicativo, tornando-se mais participativas e responsivas em interações com pares.
Outro aspecto relevante identificado nos estudos foi o papel das intervenções familiares na estimulação das habilidades comunicativas. Pais orientados por profissionais puderam aplicar estratégias em casa, reforçando o aprendizado e promovendo oportunidades constantes de comunicação. Essa continuidade entre os ambientes clínico e familiar resultou em maior consistência nos avanços da linguagem, consolidando a generalização das habilidades adquiridas. As práticas de estimulação também se mostraram eficazes na regulação emocional associada à comunicação. Crianças que apresentavam dificuldade em se expressar verbalmente frequentemente manifestavam crises de irritação ou comportamentos repetitivos como resposta à frustração. Com a introdução de recursos de comunicação funcional, essas manifestações tendem a diminuir, evidenciando a relação entre comunicação eficaz e equilíbrio emocional. Esse achado reforça a importância de pensar a linguagem não apenas como habilidade técnica, mas como meio de inserção social e de autorregulação.
A literatura ainda destacou que os ganhos comunicativos se estenderam para o desempenho acadêmico. Crianças que desenvolveram maior competência na linguagem verbal ou alternativa conseguiram acompanhar com mais autonomia atividades escolares, favorecendo o aprendizado de conteúdos básicos, como leitura inicial e escrita emergente. Dessa forma, a comunicação precoce não apenas abriu caminhos para a socialização, mas também ampliou as condições para a inclusão educacional.
Os resultados descritos podem ser sintetizados na Tabela 2, que apresenta os efeitos da estimulação precoce sobre a linguagem verbal, a linguagem não verbal e outros aspectos relacionados ao desenvolvimento comunicativo de crianças com TEA.
Tabela 2 – Efeitos da estimulação na comunicação de crianças com TEA

A análise da tabela reforça que os efeitos da estimulação se manifestam em múltiplas dimensões. Enquanto a fonoaudiologia precoce se concentrou no desenvolvimento da fala, a comunicação alternativa garantiu canais expressivos em crianças não verbais. Já a musicoterapia favoreceu a prosódia e o engajamento, e a capacitação parental assegurou a continuidade da estimulação em contextos naturais. Em conjunto, essas práticas não apenas reduziram os prejuízos comunicativos do TEA, mas também criaram condições para que as crianças participassem de forma mais ativa da vida social e acadêmica.
4.3 Impacto da estimulação na socialização e interação social
A socialização representa um dos aspectos mais desafiadores para crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), sobretudo na primeira infância, fase em que se estruturam as bases do desenvolvimento socioemocional. A dificuldade em iniciar e manter interações, responder a estímulos sociais ou compartilhar experiências frequentemente compromete a participação da criança em contextos familiares, escolares e comunitários. Nesse cenário, práticas de estimulação precoce mostraram-se fundamentais para ampliar oportunidades de convivência e promover ganhos significativos na interação social.
As intervenções voltadas para a socialização priorizaram a criação de ambientes estruturados que incentivassem a participação ativa das crianças. O uso de jogos cooperativos, atividades em grupo e recursos lúdicos organizados por profissionais da educação e saúde favoreceu o engajamento das crianças em situações coletivas. Relatos da literatura indicaram que, quando expostas a práticas mediadas, as crianças ampliaram o repertório de comportamentos sociais, como compartilhar objetos, aguardar turnos e responder a interações com pares.
A presença da família nesse processo também foi destacada como elemento essencial. A capacitação parental não apenas contribuiu para o desenvolvimento comunicativo, mas também possibilitou que os cuidadores criassem oportunidades de socialização no cotidiano. Atividades simples, como brincadeiras em casa, passeios ao parque ou participação em eventos comunitários, tornaram-se meios de aplicar as estratégias aprendidas em contextos clínicos. Essa prática fortaleceu vínculos afetivos e criou uma base emocional segura, condição indispensável para que a criança se sentisse mais confiante em interações externas.
O ambiente escolar, por sua vez, revelou-se um espaço privilegiado para estimular a socialização. Programas de inclusão educacional, que adotaram práticas pedagógicas adaptadas às especificidades do TEA, demonstraram impactos positivos na interação com colegas e professores. A literatura apontou que escolas preparadas para lidar com a diversidade criaram condições para a criança desenvolver autonomia, autoestima e senso de pertencimento. Nesse processo, o alinhamento entre família e escola foi decisivo para assegurar a continuidade das estratégias e a coerência na aplicação das intervenções.
Outro fator relevante foi a utilização do brincar compartilhado como ferramenta de socialização. Atividades lúdicas mediadas, estruturadas em jogos simbólicos e atividades de faz de conta, estimulam a cooperação, a imaginação e a capacidade de interação espontânea. Estudos destacaram que, por meio do brincar, crianças com TEA aprenderam a interpretar regras sociais, a negociar papéis em grupo e a expressar emoções de maneira mais integrada. Esse recurso mostrou-se ainda mais eficaz quando combinado a abordagens terapêuticas como psicomotricidade e musicoterapia.
A psicomotricidade, ao integrar corpo e mente em atividades planejadas, contribuiu para a regulação emocional, a coordenação motora e a percepção do próprio corpo em relação ao outro. Esses aspectos favoreceram a participação em atividades coletivas, uma vez que crianças mais seguras em seus movimentos se mostraram mais propensas a interagir. Da mesma forma, a musicoterapia proporcionou experiências grupais que facilitaram a construção de vínculos, utilizando o ritmo e o som como mediadores das interações.
Outro resultado observado foi a ampliação da autonomia social. Crianças submetidas a programas de estimulação precoce apresentaram maior iniciativa em interações, desde cumprimentar colegas até solicitar ajuda em sala de aula. Esse comportamento representou não apenas um ganho comunicativo, mas também uma conquista de independência no convívio social.
A inclusão social também foi favorecida pelo uso de tecnologias de comunicação alternativa, que permitiram que crianças não verbais participassem de atividades em grupo de forma mais ativa. Ao utilizar pranchas de comunicação ou aplicativos digitais, essas crianças puderam expressar opiniões, tomar decisões coletivas e engajar-se em interações que antes eram limitadas.
Os impactos da estimulação na socialização de crianças com TEA podem ser sintetizados na Tabela 3, que apresenta as principais dimensões trabalhadas, as evidências encontradas e os resultados observados nos estudos analisados.
Tabela 3 – Impactos da estimulação na socialização de crianças com TEA

A análise da tabela confirma que a estimulação precoce promoveu efeitos que ultrapassaram o âmbito clínico, alcançando a vida cotidiana das crianças. Ao favorecer a participação em atividades coletivas, fortalecer vínculos afetivos, estimular o brincar compartilhado, ampliar a autonomia e garantir recursos para a inclusão, as práticas de estimulação contribuíram para a construção de trajetórias sociais mais ricas e inclusivas. Em síntese, a literatura evidenciou que a socialização das crianças autistas não depende apenas da superação de barreiras individuais, mas da criação de ambientes favoráveis e de estratégias de intervenção consistentes desde a primeira infância.
5. DISCUSSÃO
A análise dos resultados evidenciou que a estimulação precoce exerce papel decisivo no desenvolvimento comunicativo e social de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), especialmente na primeira infância — período marcado por intensa plasticidade cerebral. Esse achado converge com a literatura, que reconhece a infância como uma janela de oportunidades para intervenções capazes de modificar trajetórias de desenvolvimento e minimizar os impactos das diferenças neurobiológicas (De Marco et al., 2021; Lavor; Muner, 2020).
Do ponto de vista neurobiológico, os estudos apontam que crianças com TEA apresentam padrões atípicos de conectividade cerebral, com hiperconexões locais e hipoconexões de longa distância, além de alterações nos sistemas de neurotransmissores, como serotonina e dopamina (Becker; Riesgo, 2016; Junior et al., 2023). Essas particularidades explicam parte das dificuldades na decodificação de estímulos sociais e comunicativos. Entretanto, a literatura ressalta que tais diferenças não determinam o curso do desenvolvimento, pois a plasticidade neural permite reorganizações estruturais diante de estímulos consistentes e precoces (Rotta; Bridi Filho; Souza Bridi, 2018).
Esse potencial de reorganização confere à estimulação precoce um papel estratégico, uma vez que favorece a formação de novas conexões sinápticas e o fortalecimento de circuitos relacionados à linguagem e à interação social. Diversos autores reforçam que quanto mais cedo ocorre a intervenção, maiores são os ganhos observados (Souza et al., 2020). No entanto, há consenso de que os estímulos devem ser contínuos e adaptativos, garantindo a manutenção das habilidades adquiridas (Rotta; Bridi Filho; Souza Bridi, 2018).
Entre as práticas analisadas, destacam-se a fonoaudiologia precoce e a comunicação alternativa e aumentativa. Enquanto a primeira favorece o desenvolvimento da fala e da articulação verbal (Magalhães et al., 2020), a segunda amplia a participação comunicativa de crianças não verbais (Montenegro et al., 2021). Ambas se complementam ao reduzir barreiras de expressão e favorecer a inclusão. A literatura também ressalta a relevância do envolvimento familiar. Bagaiolo et al. (2018) e Alves e Alves (2022) defendem que a capacitação parental potencializa os efeitos terapêuticos, garantindo a continuidade das aprendizagens e fortalecendo vínculos afetivos. Essa dimensão emocional é essencial, pois a segurança afetiva cria o ambiente propício à interação (Cabral; Falcke; Marin, 2021).
A socialização apresentou avanços significativos quando associada a práticas lúdicas e psicomotoras. O brincar mediado, segundo Moura et al. (2021), estimula cooperação, imaginação e compreensão das regras sociais, aproximando a criança de experiências coletivas. Pinheiro et al. (2022) complementam que a psicomotricidade, ao integrar corpo e mente, promove regulação emocional e maior disposição para o convívio. Assim, o brincar e o movimento configuram-se não apenas como instrumentos terapêuticos, mas como pontes para o desenvolvimento social.
As tecnologias emergem como aliadas nesse processo. A realidade virtual, embora ainda incipiente, tem demonstrado potencial em criar ambientes simulados que promovem práticas sociais seguras e controladas (Magalhães et al., 2020). Contudo, os estudos sobre seus efeitos a longo prazo são escassos, indicando lacunas para pesquisas futuras. Essa observação reforça a importância de ampliar investigações sobre intervenções digitais aplicadas à primeira infância (Rinaldi et al., 2021).
A relação entre comunicação e regulação emocional também se mostrou significativa. Crianças com maior competência comunicativa apresentaram menos comportamentos disruptivos e crises de irritação, confirmando que a linguagem é mediadora da estabilidade emocional (Montenegro et al., 2021). Do mesmo modo, a inclusão escolar desponta como espaço privilegiado de socialização. Rezende et al. (2021) evidenciam que práticas pedagógicas adaptadas contribuem tanto para o desenvolvimento acadêmico quanto para o fortalecimento das habilidades sociais, embora a falta de recursos e de formação docente ainda sejam desafios importantes.
De modo geral, a literatura revisada converge ao destacar a intervenção precoce como estratégia central para potencializar a plasticidade cerebral e o desenvolvimento integral da criança com TEA. As divergências observadas entre os autores concentram-se nas abordagens mais eficazes — enquanto alguns defendem terapias tradicionais, outros valorizam estratégias inovadoras, como recursos tecnológicos. Essa pluralidade revela a complexidade do autismo e a necessidade de práticas individualizadas e interdisciplinares.
Como enfatizam De Souza e Juliani (2018), compreender o TEA requer uma visão ampliada que articule dimensões neurológicas, psicológicas e sociais. Assim, a estimulação precoce deve ser entendida como um processo dinâmico e multifacetado, que integra ciência, afeto e prática social. Apesar dos avanços, permanecem lacunas quanto à avaliação longitudinal dos efeitos dessas intervenções, o que indica a necessidade de estudos que acompanhem os resultados ao longo da vida, permitindo compreender não apenas os ganhos imediatos, mas também os impactos duradouros da estimulação sobre a comunicação e a socialização.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo analisou de que forma a estimulação influencia as diferenças neurobiológicas no Transtorno do Espectro Autista (TEA), com foco na primeira infância, fase reconhecida pela elevada plasticidade cerebral e pela capacidade de formação de novas conexões sinápticas. A revisão narrativa demonstrou que esse período constitui uma janela de oportunidades para intervenções eficazes, capazes de modificar trajetórias de desenvolvimento e potencializar habilidades comunicativas e sociais.
Os resultados apontaram que diferentes formas de estimulação — como fonoaudiologia precoce, comunicação alternativa e aumentativa, musicoterapia, psicomotricidade, realidade virtual e capacitação parental — mostraram-se eficazes na ampliação das possibilidades expressivas e no fortalecimento das interações sociais. A integração interdisciplinar dessas práticas evidenciou ganhos significativos na linguagem verbal e não verbal, na redução de comportamentos disruptivos e na consolidação dos vínculos afetivos, aspectos essenciais para o desenvolvimento global da criança com TEA.
No campo da socialização, observou-se que a estimulação precoce favoreceu a participação em atividades coletivas, o brincar compartilhado e o desenvolvimento da autonomia social. A parceria entre família, profissionais e escola mostrou-se determinante para a efetividade das intervenções, pois estabelece contextos consistentes de aprendizagem, interação e afeto, sustentando os avanços conquistados nas terapias.
Conclui-se que a estimulação precoce exerce influência direta sobre as diferenças neurobiológicas no TEA, promovendo reorganizações neurais que resultam em ganhos cognitivos, comunicativos e emocionais. Ainda assim, persistem desafios relacionados à escassez de estudos longitudinais e à necessidade de políticas públicas voltadas ao diagnóstico precoce e à formação continuada de profissionais que atuam com o público autista.
Dessa forma, investir em estimulação precoce representa não apenas uma estratégia terapêutica, mas também um compromisso ético, científico e social. Ampliar o acesso a práticas interdisciplinares e baseadas em evidências contribui para o desenvolvimento integral e a autonomia das crianças com TEA, fortalecendo os princípios de inclusão, equidade e humanização que orientam o cuidado em saúde e educação.
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1Graduanda em Psicologia pela Uninassau Tocantins. E-mail: fernandaisabela156@gmail.com
2Graduanda em psicologia pela Uninassau Tocantins. E-mail: senamikaelayne@gmail.com
3Graduanda em psicologia pela Uninassau Tocantins. E-mail: matiasjackeliny@gmail.com
4Professora orientadora Esp. Em Neuropsicologia e Psicologia Clínica. Email: bosquepsicologa@gmail.com
