REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202506021805
Leilane de Almeida Silva
Resumo
No Brasil o período chuvoso impacta em diversos aspectos como a agricultura, a infraestrutura e a saúde pública. Com um olhar para a região Nordeste esse período está concentrado entre os meses de maio e julho nos quais a precipitação atinge valores mais elevados, exigindo das obras de contenção um desempenho eficiente de tais estruturas. Esta pesquisa teve como objetivo realizar uma comparação dos esforços em uma Obra de Contenção drenadas e não drenadas, através do Método de Rankine, destacando como a ineficiência do sistema de drenagem pode alterar o fator de segurança e levá-lo ao colapso. A área de estudo se concentrou nos estudos dos solos da região de Recife em Pernambuco. Para análise dos resultados de laboratório nas condições seca e saturada com o intuito de reproduzir essa realidade para o cálculo dos fatores de segurança do muro de arrimo. Os resultados desta pesquisa apontam que nos cálculos numéricos os empuxos ativos e inclinados na condição chuvosa sofreram um acréscimo de 87% em relação à condição seca. Isso representa um aumento dos esforços nas obras de contenção projetadas. Em consequência desse aumento, os fatores de segurança também sofreram alterações nas condições secas e na chuvosa. O desenvolvimento do artigo apontou também que os resultados obtidos demonstram que as características de resistência do solo, em especial a coesão, exercem grande influência no fator de segurança do muro de arrimo e que o dimensionamento correto da drenagem auxilia na confiabilidade do projeto. Este parâmetro interfere fortemente na resistência do solo, confirmando a importância de controle de água para a estabilidade.
Palavras-chaves: Mecânica dos solos, Muro de Arrimo, Drenagem de muros de arrimo e Rankine.
Abstract
In Brazil, the rainy season impacts various aspects such as agriculture, infrastructure, and public health. Focusing on the Northeast region, this period is concentrated between the months of May and July, during which precipitation reaches higher levels, requiring retaining structures to perform efficiently. This research aimed to compare the stresses in drained and undrained retaining structures using the Rankine Method, highlighting how an inefficient drainage system can alter the safety factor and potentially lead to structural failure. The study area focused on soil studies in the Recife region of Pernambuco. Laboratory test results under dry and saturated conditions were analyzed to simulate real conditions for calculating the safety factors of the retaining wall. The results of this study indicate that, under numerical calculations, the active and inclined earth pressures during the rainy condition increased by 87% compared to the dry condition. This represents a significant rise in stress on designed retaining structures. As a consequence of this increase, the safety factors also changed between dry and rainy conditions. The development of this paper also showed that the obtained results demonstrate that the soil’s strength characteristics, particularly cohesion, have a significant influence on the safety factor of the retaining wall. Moreover, properly designing the drainage system contributes to the reliability of the project. This parameter strongly affects soil strength, confirming the importance of water control for stability.
Keywords: Mechanics of the soils, Retaining wall, Drainage of retaining walls and Rankine.
INTRODUÇÃO
A problemática em torno dos movimentos de massa demonstra a urgência nas tomadas de soluções que visem diminuir as consequências desse evento geológico. O crescimento populacional traz atrelado a si, a necessidade de espaços urbanos organizados e seguros nos quais a população possa desenvolver atividades sociais, mas também econômicas. O presente artigo apresenta uma comparação entre o muro de arrimo drenado e não-drenado de forma a demonstrar que através da eficiência dos dispositivos de drenagem é possível maximizar a eficiência das obras de contenção projetadas. Como já pontuado, com o aumento da população, consequentemente o uso e a ocupação do solo também aumentaram, sendo assim, áreas que antes não eram utilizadas por serem íngremes, de difícil acesso e/ou sem infraestrutura necessária, passam a ser exploradas sem os devidos cuidados. Essas ocupações normalmente fazem uso de escavações e aterros na tentativa de planificar os terrenos e possibilitar sua utilização. Ao interagirem de maneira não ordenada podem ocasionar movimentos de massas, as quais, fazem parte da dinâmica natural de transformação da crosta terrestre (SESTINI, 2000). Apesar de serem eventos geológicos naturais, ao ocorrem em perímetro urbano se mostram desastrosos, pois afetam diretamente a dinâmica da cidade além de acarretar prejuízos materiais e de vidas humanas. Muito tem-se estudado os deflagradores de tais movimentos de massa conforme debatido por Bandeira (2010) a caracterização geotécnica dos solos mostra que a saturação é o principal gatilho de escorregamentos.
Ao buscar implantar Infraestrutura Urbana nessas áreas para garantir a segurança nesses cortes e aterros são previstas muitas vezes as obras que estabilizam essas massas, as chamadas obras de contenção. Essas obras, para cumprirem o desempenho esperado, precisam atender ao fator de segurança de estabilidade quanto ao tombamento, ao deslizamento e capacidade de carga, além de possuírem uma drenagem eficiente para garantir as condições ideais do maciço.
Nessa perspectiva o objetivo geral deste trabalho será verificar a estabilidade do muro de arrimo drenado e do muro não drenado e igualmente analisar a influência dos parâmetros dos solos nesta estabilidade.
Frente a este contexto a problemática que norteia este trabalho partiu-se da necessidade de debater sobre o papel das obras de engenharia frente à eventos extremos como cheias e escorregamentos, necessitando assim, desempenhar cada vez mais a máxima sua eficiência pois estas auxiliam e resguardam vidas humanas e protegem bens e serviços. Entretanto, como Bandeira (2010) descreveu que os picos de acidentes estão entre os meses de maio e julho nos quais coincidem com o inverno, porém tal previsibilidade não se transforma em norte para as tomadas de decisão já que a Região Metropolitana do Recife teve 202 mortes por deslizamentos (1984–2009).
Por isso, a metodologia deste artigo considerou a diferenciação na condição do ensaio. O ensaio de cisalhamento na condição natural corresponde a uma estação seca com umidade baixa no terreno. Já para o ensaio de cisalhamento na condição saturada corresponde a uma estação chuvosa com umidade alta no terreno, na tentativa de se analisar os fatores de segurança nas condições extremas nas obras de contenção.
Diante do exposto, o artigo está organizado da seguinte maneira: na primeira seção abordamos as justificativas para o desenvolvimento deste artigo. Na segunda seção o referencial teórico sobre muros de arrimo de pedra argamassada que é a estrutura tratada neste artigo. Na seção seguinte descrevemos a metodologia utilizada na investigação em campo e laboratório. Na seção quarta, serão discutidos os resultados obtidos. Por fim, sugerimos alguns apontamentos nas considerações finais.
JUSTIFICATIVA
Nesta seção se apresenta as justificativas para o desenvolvimento deste artigo, elencando a importância para a realização desta pesquisa, bem como as razões sociais.
Os movimentos de massa são os processos geológicos que mais causam vítimas fatais no Brasil. Segundo o ITP-SP de 1988 a 2022, 4146 pessoas foram vitimadas em 16 estados, 269 municípios e em 959 eventos. Tais dados foram coletados e organizados para serem um marco importante e necessário para o setor público eleger propostas de resolutivas frente a um problema complexo. As principais cidades que ocorreram mais mortes por deslizamentos foram Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, conforme Figura 1.
Figura 1 Gráfico de mortes por deslizamentos nos dez principais estados entre 1988 e junho de 2022.
Fonte: ITP-SP, 2022
A partir do gráfico fornecido pelo ITP-SP podemos concluir que o estado de Pernambuco está listado na 4ª posição com os estados com mais mortes do Brasil. Em relação ao Nordeste, Pernambuco assume a primeira posição, ficando à frente de estados como a Bahia, com quase o triplo de acidentes. A tese de Bandeira 2010, trouxe dados da Região Metropolitana do Recife atualizado até aquele ano, mostrando que de 1984 a 2009 houve 202 mortes por deslizamentos de encostas (Figura 2). Os números serão mais alarmantes quando forem atualizados com os escorregamentos do ano de 2022.
Figura 2 – Histórico de mortes por escorregamentos de encostas na RM-Recife
Fonte: BANDEIRA, 2003
Além das perdas de pessoas, os escorregamentos trazem um volume de prejuízos econômicos para a região do evento, tal volume que não se tem ideia da magnitude, conforme Silva,2007.
Diante do exposto, tem-se observado a necessidade de obras de contenção e infraestruturas que trazem organização ao ambiente urbano e possibilita um espaço seguro para as pessoas.
REFERENCIAL TEÓRICO
Nesta seção é apresentado o referencial teórico sobre muros de arrimo de pedra argamassada que é a estrutura tratada neste artigo, justificando de forma assertiva a melhor solução para a área em estudo e descrevendo a justificativa de tal escolhas, a estrutura teoria da análise de estabilidade do muro de arrimo, bem como dos empuxos.
1. Muros de arrimo
Muros de Arrimo são estruturas de contenção que trabalham por gravidade e se opõem aos empuxos horizontais e verticais solicitados pelo terreno arrimado. Geralmente é utilizado em áreas onde se precisa conter um talude de grande desnível e que o mesmo não consegue ter espaço para ter uma inclinação suficiente para atingir um ângulo estável. Podem ser construídos em pedra ou concretos (simples ou armado), gabiões, pneus e sacos de solo-cimento, ou ainda tipo Cribwall (GERSCOVICH, 2010). A construção de um Muro de Arrimo precisa ser viabilizada pela necessidade da obra ser a última forma de intervenção possível. Ao buscar essa solução de contenção é necessário atender a parâmetros mínimos de segurança com uma análise criteriosa dos parâmetros do solo, quer através dos ensaios, quer através de correlações empíricas.
Dentre as diversas seções transversais de muro de arrimo existentes, a Figura 3 mostra uma seção transversal genérica:
Crista – parte superior do muro de arrimo;
Corpo – muro de arrimo propriamente dito;
Face – parte visível do muro de arrimo;
Reaterro ou terrapleno – terreno arrimado;
Tardoz ou costado – superfície em contato com o terrapleno contido;
Base – funciona como fundação do muro de arrimo;
Dente – parte opcional que fornece maior estabilidade ao muro.
Figura 3 – Elementos constituintes de um muro de arrimo

2. Tipos de Muro
2.1 Muros de pedra argamassada
Os muros de pedra argamassada (Figura 4) se diferem dos Muros de Pedra propriamente ditos, por que aqueles são rejuntados com um ligante cimentício que fornece ao muro menor permeabilidade hidráulica. Os muros de Pedra Argamassada são a maioria das obras de contenção existentes na região da área de estudo. O muro é composto, além da argamassa, agregado graúdo que podem ser pedra de mão, pedra rachão ou matacão. Uma das vantagens desse tipo de obra é a facilidade construtiva, em face da baixa especialização que é requerida na construção desse tipo de obra (BARROS, 2013). Normalmente é utilizada mão de obra oriunda da própria região tendo em vista o trabalho altamente manual. A forma com as pedras é assentada determinam a resistência do muro, a argamassa provoca uma maior rigidez no muro, porém elimina a sua capacidade drenante. É necessário então implantar os dispositivos usuais de drenagem de muros impermeáveis, tais como dreno de areia ou geossintético na parte do tardoz do muro e tubos de PVC chamados de barbacãs para alívio das pressões da água na estrutura de contenção (CARVALHO, 1991). Para tornar viável sua construção é necessário que, próximo ao local da obra, exista ocorrência dos materiais construtivos como areia e pedras (GERSCIVICH, 2010).
Figura 4 – Seção do muro de pedra argamassada.
3. Justificativa da solução de estabilização adotada
Dentre as diversas soluções de estabilização disponíveis no mercado, a escolhida foi a que se julgou mais adequada à inclinação do terreno, ao custo e à agilidade da obra. Uma análise da mostrou que o greide do terreno não possui inclinações consideráveis podendo assim, ser dimensionado um muro de arrimo de pedra argamassada com 4 metros de altura, desempenhando assim sua função de arrimar a terra encostada e substituir a terra que foi removida fornecendo estabilidade à encosta. O custo da obra também foi levado em consideração tendo em vista que essas intervenções são muito numerosas e precisam atender tanto a capacidade de estabilidade e ao baixo custo.
O método construtivo adotado tem-se no primeiro momento a execução da abertura das valas através da escavação do terreno, nessa etapa é necessário observar se a retirada de solo irá afetar a estabilidade do maciço ou da estrutura de casas próximas à intervenção. O corte estará indicado na seção transversal do terreno que precisa ser respeitada para que não ocorram acidentes oriundos do movimento de terra. Posteriormente o fundo das cavas deverá ser compactado e regularizado com a aplicação de um lastro de concreto magro com normalmente 5 centímetros de espessura.
4. Empuxo de terra
4.1 Definição de Empuxo
Empuxo é uma força exercida pelo solo em determinada estrutura de contenção sua intensidade depende dos parâmetros do solo como peso específico do solo, coesão e ângulo de atrito interno do solo e o sentido e intensidade do deslocamento do muro.
O empuxo de terras pode estar presente de três formas (Figura 5):
- Empuxo no repouso – a estrutura de contenção não desloca, é um estado intermediário entre os outros dois estados.
- Empuxo passivo – quando a estrutura se move contra o maciço contido provocando uma compensação no mesmo.
- Empuxo ativo – quando a estrutura se desloca provocando uma expansão do maciço.
Figura 5 – Representação dos tipos de empuxo.
Fonte: Marchetti 2007
4.2 Método de Dimensionamento adotado
4.2.1 Método de Rankine
Segundo Marchetti 2007, quando construímos um muro de arrimo e depois vamos depositar o aterro, enquanto o aterro está sendo colocado, o muro sofre algum deslocamento sob o empuxo. Se a posição do muro é fixa, o empuxo de terras conservará um valor próximo ao empuxo de terras em repouso. Porém, logo que o muro começar a transladar a massa do solo desloca entrando em equilíbrio plástico passando do estado de repouso para o estado ativo.
Embora a face interna dos muros de arrimo seja áspera, Rankine, para a sua teoria, impõe algumas condições iniciais pressupostas como fundamentais para os primeiros passos da análise da resistência ao cisalhamento das massas de solo, onde uma delas seria o fato de que a face interna no muro fosse lisa, o que na realidade não se verifica.
Além dessas condições Rankine supôs que a cunha em contato com a estrutura esteja num estado de equilíbrio plástico, ativo ou passivo.
5. Análise de estabilidade do Muro de Arrimo
O fator de segurança mínimo para as análises de estabilidade da encosta foi escolhido conforme o preconizado na norma ABNT NBR 11682/2009 em função dos níveis de segurança contra perda de vidas humanas e contra danos materiais e ambientais o que significa alto para áreas com intensa movimentação e permanência de pessoas, como edificações públicas, residenciais ou industriais, estádios, praças e demais locais, urbanos ou não, com possibilidade de elevada concentração de pessoas. Ferrovias e rodovias de tráfego intenso e alto para danos materiais: Locais próximos a propriedades de alto valor histórico, social ou patrimonial, obras de grande porte e áreas que afetem serviços essenciais.
6. Dimensionamento do muro de arrimo
6.1 Pré-dimensionamento do muro de arrimo
Para o cálculo das dimensões do muro de arrimo foi considerado o dimensionamento contido no Marchetti 2007:
Figura 6 – Pré-dimensionamento – Muro de gravidade
Fonte: Marchetti, 2007.
7. Estabilidade do muro de arrimo
Nos cálculos será considerado o Empuxo Ativo. Assim estaremos considerando que o muro começará a transladar, a massa de solo adjacente se desloca e passa do estado de repouso para o estado ativo de equilíbrio plástico. Desse modo, se um muro de arrimo pode suportar o empuxo ativo das terras, ele não entra em colapso. (MARCHETTI, 2007). No cálculo do dimensionamento do muro de arrimo foi considerada a sobrecarga no valor de 20 kPa de acordo com NBR 11682/2006.
a) Coeficientes de Empuxo
Ativo

Passivo

b) Tensões
Tensão horizontal ativa

Tensão horizontal passiva

c) Empuxos
Ativo

Passivo

d) Momentos

e) Fator de Segurança contra o tombamento

e1) Fator de Segurança contra o deslizamento

onde:

f) Tensão admissível do solo
Pelo método de Terzaghi e Pech (1967)

onde:


Os valores de NcNqNy são tabelados e variam de acordo com o ângulo de atrito conforme apresentado na tabela abaixo.
Tabela 1 – Fatores de capacidade de carga
Fonte: Terzaghi e Peck, 1967
Para a verificação da capacidade de carga da fundação calcula-se também a tensão atuante na base do muro, assim:

Dessa forma, o Fator de Segurança da capacidade de carga é calculado da seguinte maneira:

METODOLOGIA
Esta seção descreve a metodologia utilizada na investigação em campo e laboratório, com o objetivo de fornecer parâmetros de resistência para o dimensionamento do muro de arrimo.
8. Programa de Investigação Geotécnica
O programa de investigação geotécnica foi dividido em duas fases, a primeira diz respeito às atividades que foram desenvolvidas em campo, já a segunda fase no laboratório. A Tabela 2 apresenta as investigações realizadas neste artigo, assim como, os ensaios realizados em cada fase.
Tabela 2 – Programa de investigação geotécnica em campo e laboratório
Fonte: autor, 2025.
9. Investigação geotécnica de campo
9.1 Sondagem à Percussão
A Sondagem à Percussão realizada na área de estudo foi realizada para determinar a resistência do solo à penetração do amostrador padrão (Nspt) cujo atendimento foi a NBR 6484/2020 – Solo – Sondagens de simples reconhecimentos com SPT – Método de ensaio. A Figura 7 apresenta o perfil estratigráfico correspondente ao terreno, contendo a classificação tátil visual de cada camada detectada pelo sondador, além do gráfico de resistência à penetração dos golpes iniciais e finais com as respectivas profundidades. A primeira camada varia de 0,00m a 0,85m, correspondendo a 0,85m de areia argilosa fofa, cor amarelada, a segunda camada varia de 0,85m a 6,90m, com 6,05m de espessura, cuja a classificação tátil visual foi areia argilosa, com Nspt variando entre 14 e 18 golpes, com compacidade de mediamente compacta cor amarelada. Já a terceira camada varia de 6,90m a 17,45m, correspondendo a 10,55m de espessura, cuja a classificação tátil visual areia argilosa, com Nspt variando entre 19 e 23 golpes, com compacidade de medianamente compacta a compacta e cor vermelha.
Figura 7 – Sondagem à Percussão realizada no local de estudo
9.2 Coleta das amostras indeformadas
As amostras quanto indeformadas, foram obtidas por meio da escavação de poços de inspeção, conforme ilustrado na Figura 8. A coleta ocorreu no início de fevereiro de 2025, durante o verão. A amostra indeformada, do tipo bloco, foi extraída a 1,5 metros de profundidade. Para moldá-la, utilizaram-se espátulas, removendo cuidadosamente o excesso de solo nas partes superior e lateral até se alcançar uma forma cúbica com dimensões de 0,30 m x 0,30 m x 0,30 m. A Figura 8 e Figura 9 apresentam o processo de moldagem e o bloco finalizado. Já o solo excedente removido durante o preparo da amostra indeformada foi acondicionado em sacos de 10 kg, com o auxílio de uma pá, e caracterizado como amostra deformada. Essas amostras foram devidamente lacradas para transporte. O deslocamento até o laboratório foi feito em veículos de pequeno porte, como automóveis ou caminhonetes, com cuidado para evitar impactos e vibrações que pudessem comprometer a integridade das amostras.
Figura 8 – Escavação e moldagem da amostra indeformada tipo bloco 0,30m x 0,30m x 0,30m

Figura 9 – Bloco 0,30m x 0,30m x 0,30m

9.2.1 Ensaios de Cisalhamento Direto
Os Ensaios de Cisalhamento Direto foram realizados foram realizados na Sede da Maia Melo Engenharia situada na Ilha do Leite, cujo equipamento é um MS102 – Cisalhamento Automático Pro (Figura 10) prevê a aplicação de carga em duas direções: Carga Normal (Vertical) e Carga Cisalhante (Horizontal). O conjunto para aplicação de carga sobre a caixa de cisalhamento é totalmente automatizado, onde o servomotor efetua a aplicação de uma carga vertical constante sobre a amostra durante a realização do ensaio. As medições realizadas pela célula de carga instalada no sistema permitem o ajuste do servomotor em tempo real. O conjunto de cisalhamento possui uma caixa deslizante apoiada sobre gaveta contendo guias lineares e patins de rolamentos. Há ainda o sistema de fixação da caixa de cisalhamento por porca de ajuste, permitindo o acoplamento da célula de carga ao conjunto motor. A caixa deslizante do equipamento permite a utilização de caixas de cisalhamento de até 100 mm.
Figura 10 – Equipamento de Cisalhamento Direto
Este ensaio foi realizado a partir da extração de corpos de prova de seção quadrada de 0,06m x 0,06m de base e 0,06m de altura nas quais gerou gráficos de Tensão Cisalhante e Deslocamento horizontal os quais gerou envoltórias de resistência nas quais foram possíveis obter parâmetros de resistência: intercepto coesivo e ângulo de atrito.
Foram ensaiadas séries de 3 corpos de prova nas tensões verticais de 50 kPa, 100 kPa e 200 kPa, com duas umidades iniciais – natural e saturada (de forma a reproduzir em laboratório condições de umidades altas nas quais são deflagradores da diminuição da resistência e consequentemente dos escorregamentos e caracterizando invernos rigorosos).
Após a moldagem dos corpos de prova, o ensaio iniciou-se o confinamento (força vertical) e posteriormente o cisalhamento (força horizontal) e as respectivas leituras desses deslocamentos, através do extensômetro. Por se tratar de um equipamento digital, a leitura pode ser conferida concomitante à realização do ensaio. A Figura 11 (A) e a Figura 11 (B) apresentam o corpo de prova na condição de umidade natural (CN) e inundada (CI), respectivamente, após os ensaios de cisalhamento direto.
Figura 11 – Corpo de prova após o ensaio de cisalhamento direto na condição natural e Corpo de prova após o ensaio de cisalhamento na condição inundada

Para a realização dos ensaios naturais e saturados, os corpos de prova foram submetidos ao adensamento, por 24 h e 1 h, respectivamente, antes de serem submetidos ao cisalhamento, para a estabilização dos recalques. No início e final de cada ensaio, foram coletadas amostras para determinação da umidade dos corpos de prova. Sendo adotado como critério de ruptura o valor de pico da tensão cisalhante ou o valor máximo, caso a curva tensão-deformação não apontasse um valor de pico bem definido.
Na Tabela 3 estão registradas as condições iniciais das amostras ensaiadas em condição natural (CN). Já a Tabela 4 apresenta as condições iniciais das amostras ensaiadas em condição inundada (CI).
Tabela 3 – Condições iniciais das amostras ensaiadas em condição natural (CN)

Tabela 4 – Condições iniciais das amostras ensaiadas em condição inundada (CI)

A Figura 12 e Figura 13 apresentam as deformações horizontais, em porcentagem, e tensões cisalhantes obtidas ao longo dos ensaios em condição natural (CN) e em condição inundada (CI), respectivamente.
Figura 12 – Resultado do ensaio de cisalhamento condição natural (CN)
Figura 13 – Resultado do ensaio de cisalhamento em condição inundada (CI)
A Figura 14 e Figura 15 demonstra os parâmetros de resistência ao cisalhamento de pico, coesão (c) e ângulo de atrito (ɸ), obtidos através das envoltórias.
Figura 14 – Envoltória de resistência na condição natural (CN)
Figura 15 – Envoltória de resistência na condição inundada (CI)
As amostras ensaiadas na umidade natural e inundada apresentaram tensões de cisalhamento de pico para as tensões normais aplicadas de 50, 100 e 200 kPa. O ensaio foi realizado até 10 % de deformação, como pode ser verificado nas Figura 12 e Figura 13. Com as envoltórias de resistência obtiveram-se os valores dos parâmetros de resistência apresentados na Tabela 5 e Tabela 6. Em que se observou que à medida que as amostras foram inundadas ocorreram elevadas perdas de coesão. A diminuição da coesão, está relacionada com a perda da resistência, afetando com isso a estabilidade da encosta.
Tabela 5 – Resumo dos parâmetros de resistência do solo – CN

Tabela 6 – Resumo dos parâmetros de resistência do solo – CI

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Nesta seção do artigo serão discutidos os resultados obtidos.
A utilização de software trouxe para a Engenharia celeridades nos cálculos e assertividade nos valores calculados. Baseado nessa realidade, foi utilizado o Microsoft Excel com o intuito de desenvolver uma Planilha de verificações dos Muros de Arrimo. As verificações numéricas utilizaram MARCHETTI, 2007 conforme já exposto no referencial teórico deste artigo. O objetivo foi o cálculo dos Fatores de Segurança nas condições seca e saturada.
Como propósito de calcular as verificações dos muros de arrimo serão desenvolvidos os cálculos:
- Fator de Segurança contra o deslizamento;
- Fator de Segurança contra o tombamento; e
- Capacidade de Carga.
Além disso, serão comparados os parâmetros do solo com o intuito de verificar os diferentes fatores de segurança à critério da mudança da estação seca para a saturada.
A diferença se dá pela utilização da diferente condição do ensaio. O ensaio de cisalhamento na condição natural corresponde a uma estação seca com umidade baixa no terreno. Já para o ensaio de cisalhamento na condição saturada corresponde a uma estação chuvosa com umidade alta no terreno.
Os parâmetros do solo, como coesão (c) e ângulo de atrito variam, com a umidade do solo principalmente a coesão.
A tabela 1 mostra o ângulo de atrito, coesão e o peso específico para a análise de estabilidade da encosta.
Tabela 7 – Parâmetros do solo

O colapso de um muro de arrimo normalmente está associado à falta de escoamento de água do maciço, tendo em vista que a presença da mesma vai gerar pressões hidrostáticas no muro para os quais o mesmo não foi dimensionado. O mau desempenho da drenagem pode aumentar cerca de 87% (SILVA, 2016) o empuxo total do muro, sendo assim o efeito dessa água acumulada pode diminuir substancialmente a resistência ao cisalhamento do maciço em decorrência do acréscimo da pressão neutra.
Além dessas influências, a pressão na água altera o valor do empuxo que atua sobre a estrutura. Trata-se de um muro de arrimo que suporta um maciço há uma camada também impermeável, não há drenagem da água e, assim, esta exerce pressões hidrostáticas sobre o muro. Essas pressões podem, em muitos casos, superar o próprio empuxo exercido pelo solo (BARROS, 2013, p.85).
A organização francesa Bureau Securitas publicou no número 285 de setembro de 1971 dos Annales de ITBTP (Logeis L, 1971), uma estatística de acidentes de estruturas de arrimo, examinando 300 casos de estruturas não ancoradas.
A publicação demonstra que a drenagem tem sido, desde muito tempo, a causa de diversos sinistros, pois representa uma parte sensível no dimensionamento no muro já que sua análise muitas vezes se dá de maneira qualitativa.
Figura 16 – Empuxos no muro com um terreno impermeável.
Fonte: BARROS, 2013.
Com os dimensionamentos dos Muros de arrimo drenado e não drenado, aliado ao referencial teórico, buscou-se comprovar por meios de cálculos as afirmações de Barros (2013) na qual foi dito que a presença da água altera, basicamente, os parâmetros de resistência do solo e aumenta consideravelmente os empuxos na obra de contenção (Figura 16).
Como cálculos iniciais foram estabelecidos a geometria do muro de arrimo a ser estudada. Na Tabela 8 está sendo apresentada a geometria do pré-dimensionamento.
Tabela 8 – Geometria do muro – Pré-dimensionamento

Sendo:
H – Altura da estrutura;
B – Largura da base;
b – Largura do topo;
D – Embutimento.
Os empuxos ativos e passivos resultantes na estrutura do muro foram calculadas que simulando os diferentes cenários: estação seca (solo natural) e estação chuvosa (solo saturado), alterando-se a umidade e, portanto, os esforços horizontais e inclinados. Nas Tabela 9 e Tabela 10 estão sendo apresentados os empuxos.
Tabela 9 – Cálculo dos Empuxos – Condição seca

Tabela 10 – Cálculo dos Empuxos – Condição saturada

Conforme pode ser demonstrado nos cálculos numéricos, os empuxos ativos e inclinados na condição chuvosa sofreram um acréscimo de 87% em relação à condição seca. Isso representa um aumento dos esforços nas obras de contenção projetadas.
Em consequência desse aumento, os fatores de segurança também sofreram alterações nas condições seca e chuvosa.
O Fator de Segurança (FS) contra deslizamento é uma medida utilizada em engenharia para avaliar a segurança de uma estrutura, como um muro de contenção, contra a possibilidade de deslizamento. É calculado pela razão entre as forças resistentes (atrito, pressão passiva, etc.) e as forças solicitantes (forças que tendem a causar o deslizamento). Sendo assim, o fator de segurança contra o deslizamento está sendo apresentado nas Tabela 11 o Fator de segurança contra o deslizamento na condição seca e na Tabela 12 o Fator de segurança contra o deslizamento na condição saturada.
Tabela 11 – Fator de Segurança contra o deslizamento – Condição seca

Tabela 12 – Fator de Segurança contra o deslizamento – Condição saturada

Já o Fator de Segurança (FS) contra tombamento é uma relação matemática que avalia a estabilidade de uma estrutura, como um muro ou barragem, contra o movimento de rotação (tombamento). Este valor é calculado pela razão entre os momentos resistentes e os momentos solicitantes, e, para garantir a segurança, o fator de segurança contra o tombamento na estação seca está sendo apresentado na Tabela 13 e na Tabela 14 está sendo apresentado na estação chuvosa.
Tabela 13 – Fator de Segurança contra o tombamento – Condição seca

Tabela 14 –Fator de Segurança contra o tombamento – Condição saturado

A capacidade de carga de uma fundação refere-se à tensão máxima que a fundação pode transmitir ao solo sem causar ruptura ou deformação excessiva. Essa tensão é crucial para garantir a segurança e estabilidade da estrutura, pois influencia a forma como a fundação se comporta sob as cargas transmitidas pela edificação. O fator de segurança da capacidade de carga na estação seca está sendo apresentado na Tabela 15 e na Tabela 16 está sendo apresentado na estação chuvosa.
Tabela 15 – Fator de Segurança da capacidade de carga – Condição seca

Tabela 16 – Fator de Segurança da capacidade de carga – Condição saturada

Tabela 17 – Resumo dos Fatores de Segurança – Condição seca
Tabela 18 – Resumo dos Fatores de Segurança – Condição saturada
CONSIDERAÇÕES FINAIS E AGRADECIMENTOS
Neste capítulo, destacam-se as principais conclusões desta dissertação, como também os agradecimentos dessa pesquisa
O presente trabalho trará mais consciência à comunidade acadêmica dos parâmetros dos solos de Recife-PE, bem como dos desempenhos geotécnicos das obras de contenção estudada.
Os ensaios de cisalhamento direto realizados nas condições naturais e inundadas apresentaram variações significativas nos parâmetros de resistência do solo, como coesão e ângulo de atrito. O ângulo de atrito obtido foi de 33° na condição natural e de 29° na condição inundada. Já a coesão apresentou uma queda expressiva: de 63,95 kPa em condição natural para 16,06 kPa quando o solo estava saturado. Esses resultados evidenciam que o aumento do teor de umidade, seja por precipitações ou outras fontes de água, reduz consideravelmente a coesão do solo, comprometendo a estabilidade da encosta.
Durante o verão, o fator de segurança contra o tombamento foi de 6,97, reduzindo drasticamente para 1,23 no inverno intenso. Em relação ao deslizamento, o fator de segurança foi de 5,89 no verão e caiu para 0,94 no período chuvoso. A capacidade de carga também seguiu essa tendência de redução: de 48,45 kPa na estação seca para 33,10 kPa durante o inverno.
A queda nos fatores de segurança em cenários úmidos está diretamente relacionada à diminuição da coesão do solo com o aumento da umidade, o que pode provocar deslizamentos de terra, como demonstrado nas análises realizadas. Esses resultados servem como base técnica para justificar intervenções voltadas à estabilização da encosta, destacando-se a importância da implementação de sistemas de drenagem superficial e profunda como medidas preventivas para evitar perdas humanas, materiais e impactos ambientais.
Por fim, agradeço a Maia Melo Engenharia pelo apoio no desenvolvimento deste artigo.
REFERÊNCIAS
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