REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202508190832
Carlos Alberto Leitão Ferraz1
RESUMO
No cenário agrícola atual do Brasil é possível a transição para uma agricultura sustentável. É nesta perspectiva que a agroecologia é uma alternativa a uma agricultura menos nociva ao homem e à natureza. Desta forma, o objetivo geral desse estudo é investigar o possível processo de transição para uma agricultura em bases sustentáveis no rural brasileiro, para tanto os objetivos específicos incluem identificar as fases evolutivas do conceito de desenvolvimento sustentável; o que é uma agricultura sustentável. A metodologia adotada foi a pesquisa bibliográfica constituída a partir de estudos já publicados como livros, revistas, artigos científicos e sites na internet. Espera-se que esta pesquisa contribua para esclarecer os principais aspectos necessário para a dinâmica de transformação da agricultura convencional para um modelo de agricultura sustentável. É possível impulsionar no Brasil o modelo de agricultura sustentável
Palavras-chave: desenvolvimento; sustentável; agricultura; transição.
1. INTRODUÇÃO
A atividade rural desempenha função fundamental na economia mundial. Disponibiliza emprego com participação relevante na oferta de mão-de-obra global, além de ter uma participação significativa no PIB de diversos países, inclusive, no Brasil. Contudo, mesmo com os avanços que proporciona na atividade econômica, o modelo desenvolvido pela “Revolução Verde” com o uso intensivo de agrotóxicos, monocultura, em grandes propriedades tecnificadas, tem causado externalidades negativas ao meio ambiente e à saúde humana.
No Brasil, o modelo agrícola da revolução verde foi incorporado à agropecuária nacional, nos anos de 1960 e, com maior ênfase, na década de 1970, visando modernizar o processo produtivo agropecuário, expandir a oferta de alimentos e incentivar as exportações e a atividade econômica do país. No entanto, esse novo padrão agrícola trouxe diversos impactos negativos ao meio ambiente, à biodiversidade e à saúde humana de forma geral, como a poluição dos rios e dos solos, a perda da biodiversidade, a concentração fundiária, a exclusão dos pequenos produtores rurais, a dependência de insumos externos e a elevação dos custos produtivos. Segundo relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO, 2020), o atual modelo agrícola é responsável por 70% das retiradas de água doce do planeta globalmente e por 80% do desmatamento.
Neste contexto, é necessário trilhar novos caminhos para uma agricultura mais sustentável com menos impactos negativos ao homem e à natureza. Assim, no cenário agrícola atual do Brasil é possível a transição para uma agricultura sustentável? É nesta perspectiva que a agroecologia é uma alternativa a uma agricultura menos nociva ao homem e à natureza. A agroecologia incorpora a relação do meio ambiente com a economia, constituindo-se em uma relação histórica entre natureza e sociedade em ambos os sentidos. A evolução humana se desenvolve no cenário de meio ambiente, causando alterações na natureza. E essa compreensão da interação entre homem e natureza tem se alterado ao longo do tempo. (ALIER, 2011).
Desta forma, o objetivo geral desse estudo é investigar a possível transição para uma agricultura em bases sustentáveis ao rural brasileiro, para tanto os objetivos específicos incluem: verificar a evolução do conceito de desenvolvimento sustentável; e demonstrar o que é uma agricultura sustentável.
A metodologia adotada foi a de pesquisa bibliográfica constituída a partir de estudos já publicados como livros, revistas, artigos científicos e sites na internet. Esse tipo de procedimento é essencial por permitir conhecer de forma mais ampla o fenômeno em análise.
Este trabalho torna-se relevante pela necessidade de ampliar os estudos sobre as práticas agrícolas mais sustentáveis visando transição para uma agricultura em bases menos nocivas ao homem e ao meio ambientes, ou seja, compreender e incentivar novos procedimentos e técnicas de relacionamento com a natureza, contribuindo para a conservação da biodiversidade.
O presente estudo está estruturado, além desta introdução, nas seções; Desenvolvimento sustentável, o que é uma agricultura sustentável, transição para uma agricultura sustentável e as considerações finais.
2. O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Na análise econômica encontram-se diversos termos que tratam de questões como Crescimento Econômico, Desenvolvimento Econômico e Desenvolvimento Sustentável, muitas vezes, tratados como sinônimos, embora sejam diferenciados.
O termo crescimento econômico surgiu, no seu sentido moderno, com a revolução Industrial inglesa. As novas tecnologias proporcionaram a expansão da produção agrícola e mudanças na estrutura demográfica com a intensificação da urbanização e o consequente êxodo rural. Assim, o crescimento econômico pode ser entendido como a expansão do produto Interno Bruto da economia de uma região, durante determinado período de tempo. Quando ocorre a expansão econômica, a fronteira de possibilidade de produção se desloca para a direita refletindo um novo nível de atividade econômica, ou seja, o conceito está voltado, exclusivamente, para a mensuração da atividade econômica. (SOUZA, 2003)
O desenvolvimento econômico ocorre com o crescimento contínuo do Produto Interno Bruto real da economia, concomitante às transformações estruturais e ao aumento do bem-estar da população mensurados por indicadores econômicos e sociais, ou seja, indica uma mudança qualitativa, mais ampla que sinaliza uma organização social e economicamente mais avançada. (SOUZA, 2003)
Por sua vez, a elaboração do conceito de sustentabilidade emerge da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMA, 1987), no relatório intitulado “Nosso futuro comum”, onde desenvolve princípios orientadores para o desenvolvimento sustentável, conforme compreendido atualmente. Sendo o “desenvolvimento sustentável aquele que atende as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades. Ele contém dois conceitos-chave: o conceito de “necessidades,” sobretudo as necessidades essenciais dos pobres no mundo, que devem receber a máxima prioridade; e a noção das “limitações,” que o estágio da tecnologia e da organização social impõem ao meio ambiente, impedindo-o de atender as necessidades presentes e futuras.” (CMMA,1987).
Portanto, segundo este relatório, ao analisar os objetivos do desenvolvimento socioeconômico deve-se considerar a sua sustentabilidade em todos os países desenvolvidos ou em desenvolvimento em economia de mercado ou em economia de planejamento central. (CMMA,1987).
É nesse contexto que surge a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento da ONU com a finalidade de propor meios de harmonizar o desenvolvimento econômico e o meio ambiente. Desta forma, emerge o conceito de desenvolvimento sustentável que visa atender as necessidades atuais sem comprometer a capacidade de atender as necessidades das gerações futuras. (CAVALCANTI, 2003).
3. O QUE É UMA AGRICULTURA SUSTENTÁVEL
O crescimento demográfico, a crescente demanda por alimentos e por recursos ambientais indicam a necessidade de harmonizar a agricultura e o meio ambiente. É nesse cenário que se faz necessário a expansão de uma agricultura em bases sustentáveis. O termo sustentável significa a capacidade de sustentar, suportar, amparar um sistema ao longo do tempo de maneira equilibrada, esgotar os recursos ou danificar o meio ambiente. Mas o que uma agricultura sustentável? É aquela que prima por práticas agrícolas como plantios de conservação, culturas de conservação, lavouras consorciadas e sistemas agroflorestais. A adoção desses procedimentos implicará solos mais férteis, aumentos dos rendimentos e diminuição dos gases de efeito estufa.
As técnicas de manejo integrado de pragas englobam vários padrões para monitoramento de doenças, ervas daninhas e pragas diminuindo seus efeitos à saúde humana e à natureza. A essas técnicas podem ser incorporados, ainda, os controles biológicos, o uso de variedades resistentes, reduzindo a utilização de pesticidas, impulsionando a produtividade dos plantios e preservando dos ecossistemas naturais. A expansão da integração entre árvores e vegetações contribuirá para o aumento da fertilidade do solo, redução da erosão e aumento da produtividade que possibilitará ganhos dos rendimentos dos agricultores na produção de frutos, madeira e outros produtos florestais não madeireiros.
A prática da circularidade da agricultura é mais um procedimento que está dentro das características de uma agricultura sustentável. Pois é um sistema que visa diminuir os resíduos, incentivando a reciclagem de nutrientes e restabelecer os recursos naturais, utilizando-se da compostagem de cobertura e de sistemas integrados de produção agropecuária. Ao adotar os métodos circulares na agricultura, os agricultores podem reduzir a dependência de fertilizantes sintéticos e pesticidas concomitante ao aumento da fertilidade do solo e redução do desperdício.
Os avanços tecnológicos, inclusive, na agricultura, como os procedimentos digitais com a agricultura de precisão, softwares de gestão agrícola e de cadeia de abastecimento podem ajudar os agricultores a aumentar a eficiência e reduzir o desperdício e aumentar a rentabilidade produtiva. Assim, as tecnologias de precisão, incluindo drones, sensores e imagens proporcionam aos agricultores dados em tempo real sobre os níveis de nutrientes, umidade do solo, saúde das plantas, de forma a aperfeiçoar os fatores produtivos e reduzir custos. (EXAME, 2023).
4. A TRANSIÇÃO PARA UMA AGRICULTURA MAIS SUSTENTÁVEL
O setor agropecuário tem um papel crucial na economia global. Pois, oferta ocupação laboral para parcelas significativas da mão-de-obra mundial com reflexos importantes no Produto Interno Bruto de diversas nações, incluindo o Brasil. Mesmo com os avanços na produção e na produtividade e, consequentemente, com os aumentos dos ganhos econômicos para os produtores agrícolas, o padrão produtivo criado pela “Revolução Verde” com a utilização intensiva de agrotóxicos, monoculturas, em grandes propriedades com uso acentuado de novas tecnologias e processos produtivo modernos que otimizam a produção, por outro lado, tem causado externalidades negativas ao meio ambiente e à saúde humana. A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO, 2020), estima que o atual padrão agrícola contribui com 70% das retiradas de água doce do planeta e por 80% da supressão da vegetação natural mundial.
Neste contexto, é necessário trilhar novos caminhos para uma agricultura sustentável com menos impactos negativos ao homem e à natureza. É neste contexto que a agroecologia é uma alternativa de agricultura sustentável. A agroecologia incorpora a relação do meio ambiente com a economia, constituindo-se em uma relação histórica entre natureza e sociedade em ambos os sentidos. A evolução humana se desenvolve no cenário de meio ambiente, causando alterações na natureza. E essa compreensão da interação entre homem e natureza tem se alterado ao longo do tempo. (ALTIERI, 2012).
A agroecologia representa uma visão científica com o propósito de contribuir para a transição dos padrões atuais de agricultas convencionais e de modelos desenvolvimento econômico para uma matriz s de desenvolvimento rural e de agricultura sustentáveis. Assim, é um enfoque científico de transição agroecológica gradual, que ocorre ao longo do tempo, de uma categoria de produção baseado na utilização intensiva de agrotóxicos para uma matriz agrícola integrada a concepções e tecnologias ecologicamente sustentáveis. É uma dinâmica de aperfeiçoamento crescente, ao longo do tempo, sem ter um prazo para sua conclusão. (CAPORAL e COSTABEBER, 2004)
Esse processo de transição para a agricultura agroecológica, por ser um processo complexo tanto em termos metodológicos, organizacionais e tecnológicos, apresenta três níveis de progressão para agroecossistemas mais sustentáveis: a) primeiro nível de transição – incrementar práticas convencionais mais eficientes para reduzir a utilização de insumos externos dispendiosos, escassos e nocivos ao meio ambiente; b) segundo nível de transição – a permuta de insumos e procedimentos convencionais por modelos alternativos, ou seja, trocar insumos e atividades convencionais por modelos alternativos; e c) terceiro nível de transição – é a reconfiguração dos agrossistemas para o seu funcionamento com novos agrupamentos de processos em bases agroecológicas. (CAPORAL e COSTABEBER, 2004).
Nesse contexto, como dinamizar a transição para uma agricultura mais sustentável? A FAO (2021) em relatório aponta cinco estratégias de produção agrícola com menos substâncias químicas tóxicas e mais tecnologias.
1.Plantio direto é uma estratégia que se inicia na lavoura precedendo a semeadura com a preparação do solo, indo até as técnicas aplicadas após a colheita. Ações como rotação de cultura e cobertura do solo, contribuem para uma maior riqueza de nutrientes e podem auxiliar no monitoramento de plantas daninhas, reduzindo a necessidade de controle químico.
2. Controle biológico – A introdução de inimigos naturais das pragas, como predadores, parasitas ou patógenos, embora não seja utilizada em larga escala no Brasil, mas pode ser uma excelente opção ao emprego de agrotóxicos. A prática tem avançado em muitos cultivos, sem deixar nenhum vestígio nos alimentos e no meio ambiente.
3. Manejo Integrado de Pragas (MIP) – Colheitas em períodos pouco propícios à difusão das pragas, o uso de sementes resistentes e a utilização de barreiras físicas, entre outras técnicas do Manejo Integrado de Pragas, proporcionam o controle de doenças e pragas de forma sustentável e econômica.
4. Monitoramento da lavoura – Informações precisas sobre insetos e doenças na lavoura são essenciais para auxiliar decisões com a finalidade de aumentar a eficiência produtiva. Os dados obtidos permitem a utilização de técnicas como agricultura preditiva e de precisão para reduzir custos com defensivos e elevar a produtividade da propriedade.
5. Novas tecnologias agrícolas – O uso de drones evita o desperdício e aumenta a eficiência da pulverização de defensivos agrícolas, melhorando a segurança alimentar e preservando o meio ambiente.
Além dessas estratégias de produção agrícola, tecnologias recentes têm auxiliado na aplicação mais racional de defensivos e reduzem os custos com insumos como pesticidas, herbicidas e fungicidas. Além do mais, outros instrumentos tecnológicos podem ser usados de diversas maneiras: o sensoriamento remoto para encontrar pragas; drones para melhorar a pulverização de agroquímicos; robôs para combater ervas daninhas; inteligência artificial para mapear de forma precisa a propriedade; entre outras aplicações. Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação” (FAO, 2021).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esse estudo evidenciou a importância de se trilhar novos caminhos que levem a expansão de uma agricultura constituída de bases sustentáveis tanto para a saúde humana como para o meio ambiente. Demonstrando que é possível a inserção de forma mais intensa do modelo agroecológico em comparação ao modelo agrícola convencional. Pois no sistema agroecológico o padrão produtivo agrícola interage de maneira sustentável e racional com o meio ambiente.
Portanto, um ambiente de desenvolvimento, verdadeiramente sustentável, deve considerar, além da sustentabilidade econômica, a ambiental e a social. Somente um desenvolvimento que incorpore esses três princípios de maneira harmoniosa será considerado um desenvolvimento sustentável.
Como colocamos ao longo deste artigo, a agricultura sustentável refere-se àquela que, diferentemente da agricultura convencional, prima por procedimentos produtivos capazes de reduzir a exploração intensiva de recursos naturais não renováveis e, concomitantemente, incentiva a biodiversidade biológica e a conservação dos ecossistemas da natureza. Na realidade, nos procedimentos agrícolas sustentáveis empregam-se o controle integrado de pragas, o plantio consorciado e a rotação de culturas, entre outros.
Conforme abordamos neste texto, a FAO (2021) indica 5 (cinco) estratégias para impulsionar a transição para uma agricultura sustentável: o plantio direto – reduz a erosão, a compactação do solo e o desperdício de nutrientes; controle biológico – desenvolve a biodiversidade e protege a saúde humana e a natureza; manejo integrado de pragas – combinação de procedimentos diversos para conter doenças e pragas em níveis seguros, sem danos a natureza e a saúde humana; monitoramento da lavoura – obtenção de dados precisos para auxiliar no gerenciamento, aumentando a eficiência produtiva; Uso de novas tecnologias aplicadas à agricultura – permitem expandir a eficiência produtiva, reduzindo custos e diminuindo as externalidades negativas ao homem e ao meio ambiente. Desta forma, a implementação dessas práticas agrícolas levaria a uma agricultura de caráter sustentável com equilíbrio entre processos produtivos, conservação ambiental e bem-estar social.
REFERÊNCIAS
ALIER, Juan M. O ecologismo dos pobres: conflitos ambientais e linguagens de valoração. 1ª ed. São Paulo: Contexto, 2011.
ALTIERI, M. A. Agroecologia: bases científicas para uma agricultura sustentável. 3ª ed. São Paulo: Expressão popular, 2012.
CAPORAL, F. R. COSTABEBER, J. A. Agroecologia: alguns conceitos e princípios. Brasília: MDA/SAF/Dater-IICA, 2004.
CAVALCANTI, C. Desenvolvimento sustentável e gestão dos recursos naturais: referências conceptuais e de política. “In:”Raízes, Campina Grande, v. 22, nº 02, p.96–103, jul/dez. 2003.
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro comum. 1987, Oxford University Press, Oxford.
EXAME. 5 maneiras de acelerar a transição para uma agricultura sustentável. Exame, São Paulo, 07 de dezembro de 2023, Biblioteca. Disponível em: https://ciorganicos.com.br/biblioteca/5-maneiras-de-acelerar-a-transicao-para-uma-agricultura-sustentavel/. Acesso em 31-10-2024.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA AGRICULTURA E ALIMENTAÇÃO. O estado da alimentação e da agricultura 2020. Disponível em: fao.org/brasil/noticias/detail-events/en/c/1333398/. Acesso em 13/08/2025.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA AGRICULTURA E ALIMENTAÇÃO. O Quadro Estratégico da FAO: 2022-2031.2021. Disponível em: https://www.fao.org/brasil/programas-e-projetos/en/. Acesso em: 31/10/2024.
SOUZA, N de J. Curso de economia. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.
¹Professor doutor, economista, Universidade do Estado da Bahia, Campus IX. cferraz@uneb.br.