O ALUNO SURDO E A INCLUSÃO NA ESCOLA REGULAR VERSUS A ESCOLA BILÍNGUE

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/dt10202512100745


 Soraya Esfandiary Celestino Barbosa


RESUMO 

O presente artigo analisa o processo educacional do aluno surdo no contexto das  políticas públicas brasileiras de educação inclusiva, discutindo os limites da inclusão do  estudante surdo em escolas regulares e a relevância da escola bilíngue como espaço de promoção do desenvolvimento linguístico, cultural e identitário. A pesquisa, de caráter  bibliográfico e descritivo, fundamenta-se em autores como Gesser (2009, 2012), Sá  (2011) e Witkoski (2012), que problematizam a inclusão em classes comuns sem a devida observância das singularidades linguísticas e culturais do aluno surdo. Os resultados  apontam que a inclusão, quando realizada de forma descontextualizada e sem  profissionais capacitados, configura-se como integração e não assegura um processo de  ensino-aprendizagem satisfatório. Conclui-se que a escola bilíngue representa o modelo  mais adequado para garantir linguisticidade, identidade e pedagogia visual como pilares  da construção de conhecimento para estudantes surdos. 

Palavras-chave: Educação. Inclusão. Surdez. Escola bilíngue. Estudos Surdos. 

1. INTRODUÇÃO 

A educação inclusiva consolidou-se como pauta central das políticas públicas brasileiras  nas últimas décadas, defendendo o direito de todos ao acesso à escola regular,  independentemente de suas especificidades. Nesse cenário, a inclusão de alunos surdos  tem sido amplamente debatida, sobretudo diante dos desafios inerentes às diferenças  linguísticas, culturais e identitárias que caracterizam esse grupo. 

Embora a legislação assegure a educação inclusiva, observa-se que a realidade escolar  frequentemente negligencia as necessidades específicas dos alunos surdos, sobretudo  devido ao desconhecimento da comunidade escolar acerca da pedagogia visual, da  Língua Brasileira de Sinais (Libras) e do processo de constituição identitária do sujeito  Surdo. 

Este artigo tem por objetivo analisar criticamente a inclusão do aluno surdo na escola  regular e apresentar a escola bilíngue como espaço capaz de atender às singularidades  desse alunado.

2. FUNDAMENTAÇÃO LEGAL SOBRE A EDUCAÇÃO INCLUSIVA DO ALUNO SURDO 

A Constituição Federal de 1988 estabelece a educação como direito de todos, garantindo  igualdade de condições e atendimento especializado aos alunos com deficiência.  Documentos internacionais, como a Declaração de Salamanca (1994), reforçam o direito  ao acesso em escolas regulares desde que respeitadas as necessidades específicas de  aprendizagem. 

A Lei nº 9.394/1996 (LDB) prevê atendimento educacional especializado e adaptação  curricular conforme as particularidades de cada aluno. A Lei nº 10.436/2002 reconhece  a Libras como meio legal de comunicação, reforçada pelo Decreto nº 5.626/2005, que  determina a oferta de ensino bilíngue e a presença de profissionais capacitados — tradutores-intérpretes, professores de Libras e docentes conhecedores da singularidade  linguística dos surdos. 

O Plano Nacional de Educação (Lei nº 13.005/2014) reafirma o compromisso com a  educação bilíngue para surdos, defendendo a oferta de Libras como primeira língua e  Língua Portuguesa escrita como segunda língua. 

Apesar desse arcabouço legal robusto, ainda há lacunas entre a legislação e sua  efetivação no cotidiano escolar, especialmente no ensino regular inclusivo. 

3. A INCLUSÃO DO ALUNO SURDO NO ENSINO REGULAR 

Historicamente, os surdos enfrentaram segregação e exclusão social, sendo  considerados incapazes até o século XIX. A partir da década de 1990, o discurso da  inclusão passou a ganhar força, mas sua implementação prática ainda apresenta  fragilidades significativas. 

Na escola regular, a presença do aluno surdo é frequentemente marcada por isolamento,  dificuldades comunicacionais e ausência de práticas pedagógicas adequadas.  Professores, muitas vezes, não possuem formação em Libras, desconhecem a cultura  surda e não dispõem de metodologias específicas, o que compromete o processo de  aprendizagem. 

Gesser (2012) afirma que a inclusão, tal como praticada, frequentemente se limita à  presença física do aluno em sala de aula, sem garantir acesso real ao conhecimento.  Assim, o que se denomina “inclusão” torna-se, na prática, apenas integração.

4. A ESCOLA QUE “NÓS SURDOS QUEREMOS”: A ESCOLA BILÍNGUE 

A escola bilíngue para surdos é defendida por pesquisadores e pela comunidade surda  como a modalidade mais adequada de escolarização, pois considera as especificidades  linguísticas e culturais desse grupo. 

Segundo Sá (2006), a escola bilíngue tem como pilares: 

  • Libras como primeira língua (L1)
  • Português escrito como segunda língua (L2)
  • Pedagogia visual, que privilegia a visão como principal canal de aprendizagem;
  • Valorização da identidade e cultura surdas

A presença de professores surdos e profissionais bilíngues favorece o input linguístico  natural, fundamental ao desenvolvimento cognitivo e identitário. Práticas pedagógicas  visuais, uso intensivo de recursos imagéticos e estratégias de ensino adequadas à  aquisição de segunda língua são elementos característicos deste modelo educacional. 

A escola bilíngue não exclui o ensino da Língua Portuguesa, mas o aborda como L2,  respeitando o desenvolvimento da Libras como língua natural do aluno. 

5. METODOLOGIA 

A pesquisa é de natureza bibliográfica e descritiva, fundamentada em autores da área  de Educação de Surdos, especialmente Gesser (2009, 2012), Sá (2011) e Witkoski (2012).  O estudo busca correlacionar legislações, políticas públicas e perspectivas culturais,  identitárias e linguísticas do aluno surdo, sem manipulação de variáveis. 

6. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 

Os achados evidenciam que: 

  • A inclusão escolar, como geralmente praticada, não assegura um ambiente  linguístico adequado ao aluno surdo. 
  • A ausência de professores bilíngues, intérpretes e adaptações metodológicas  compromete a aprendizagem. 
  • A diferença linguística é o principal fator de exclusão dentro da escola regular. 
  • A escola bilíngue, ao proporcionar contato entre pares surdos, uso sistemático  da Libras e pedagogia visual, garante melhores condições de desenvolvimento  linguístico, cognitivo e social.

A análise confirma que o modelo inclusivo atual ainda é insuficiente para promover  igualdade educacional real aos estudantes surdos. 

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS 

A pesquisa demonstra que a inclusão do aluno surdo na escola regular, sem o devido  suporte linguístico e pedagógico, não atende às suas necessidades específicas. As  práticas inclusivas, quando descontextualizadas, reforçam desigualdades e resultam em  fracasso escolar. 

A escola bilíngue emerge como alternativa necessária para garantir o direito à diferença,  respeitando a Libras como língua natural e a cultura surda como parte fundamental da  constituição identitária desses sujeitos. 

Conclui-se que a promoção de uma educação realmente inclusiva exige a compreensão  e o respeito às singularidades dos estudantes surdos, bem como a implementação  efetiva das legislações que asseguram seus direitos. 

REFERÊNCIAS 

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