FEIRA DE CIÊNCIAS E MATEMÁTICA – EUREKA – ENSINO DE MEDIDAS DE CAPACIDADES POR MEIO DE ESTRATÉGIAS DE FOMENTO A VIVÊNCIA COM A REALIDADE DOS ALUNOS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10249051530


Lilian de Almeida Torres 1
Alaíde Leandro da Silva²
Vânia Ferreira Braga³
Orientadora: Dra.Talita Carvalho Silva de Almeida4


Resumo

O presente relato de experiências, apresenta o ensino de medidas de capacidades por meio de atividades de leitura e práticas de fomento à vivência com a realidade dos alunos, na preparação de receitas de sabonetes artesanais. Participaram das atividades 35 alunos, matriculados no 7º ano da EMEF Carmelo Mendes da Silva, da Rede municipal de ensino de Canaã dos Carajás-Pará. Temos como objetivo estruturar prática de uso das medidas de capacidade a partir do reaproveitamento de sabonete, visando ações de empreendedorismo e sustentabilidade. Como metodologia, as atividades propostas  exploraram situações do dia a dia envolvendo medidas de capacidade e suas equivalências, bem como resolver problemas de medidas de tempo e de temperatura, cálculo de probabilidades ou estimativas, na preparação de receitas de sabonetes artesanais com matéria prima de origem regional, agregando as mais diversas formas criativas e inovadoras na realização de confecção de produtos de higiene pessoal. Os produtos foram comercializados pelos alunos no evento da feira de Ciências e Matemática Eureka, por meio do Denário Card, como moeda fictícia da Secretaria Municipal de Educação-SEMED de Canaã dos Carajás/Pa.

Palvras-chave: sustentabilidade; empreendedorismo e medidas de capacidades.

1. Introdução

O ensino de medidas de capacidades por meio de estratégias de fomento à vivência com a realidade dos alunos ocorreu a partir do reaproveitamento de sobras de sabonetes no contexto de estudos sobre empreendedorismo e sustentabilidade.

A partir do projeto institucional da 1ª feira de Ciências e Matemática Eureka – Empreendedorismo, Inovação e Desenvolvimento Sustentável: praticando o pensamento científico, crítico e criativo, buscou-se referenciais sobre este Tema, levando a ideia aos alunos da realização de estudos e pesquisas e a organização de produtos que posteriormente seriam comercializados na Eureka.

Os estudos iniciaram com o objetivo de potencializar práticas e repertórios diversificados dos alunos, tendo como referência as contribuições de Freire (1996), ele nos traz reflexões sobre a dimensão da educação, quando diz que o ensino é muito mais que uma profissão, é uma missão que exige competências para a atuação do sujeito que ensina para que atue em uma postura crítica.

Os alunos ao serem oportunizados a estudar sobre empreendedorismo aguçam suas curiosidades, de modo a perceber que é possível desenvolver habilidades para transformar ideias criativas em ações empreendedoras. A escola criar oportunidades para o aluno aprender a pensar e agir neste contexto, como afirma Mendes (2007)

A educação para o empreendedorismo deve ser em primeiro lugar, como a própria designação indica, educação. Como tal, o empreendedorismo é uma aprendizagem ao longo da vida e, assim sendo, a melhor forma de aprender é combinar experiências de vida com atividades educativas formais. (MENDES, 2007, p.288)

Quando dado ênfase aos estudos sobre à sustentabilidade visa-se a possibilitar que o aluno possa entender o seu conceito, identificar práticas do dia a dia ligadas ao desenvolvimento sustentável, promovendo estudos, pesquisas e discussões sobre reaproveitamento.

Discutir a relevância e os desafios da Eureka, fez com que surgisse a ideia de reutilizar sobras de sabonetes para fazer sabonete líquido e vender na feira. Com isso a incorporação de estratégias educativas foram pensadas a partir da afirmativa que se tem nos Parâmetros Curriculares Nacionais-PCNs (1997), do tema transversal Meio Ambiente. Ele estabelece que:

[…] O papel dos professores como orientadores desse processo é de fundamental importância. Essa vivência permite aos alunos perceber que a construção e a produção dos conhecimentos são contínuas e que, para entender as questões ambientais, há necessidade de atualização constante (BRASIL, 1997, p.188)

A partir desta conjuntura entende-se que o ensino-aprendizagem sobre empreendedorismo e sustentabilidade, permite a assegurar atividades didático-pedagógicas de medidas de capacidades, inseridas em contextos oriundos de situações cotidianas (neste caso, fazer sabão líquido), de modo que houve enriquecimento no currículo ao aplicar o conhecimento das unidades de medida de capacidade a partir de estudos sobre a temática central do projeto Eureka.

Nessa perspectiva, o ensino de conceitos matemáticos por meio da Eureka, de modo a despertar o interesse dos alunos por meio de situações práticas (produção de sabonetes líquidos), oportuniza a eles a vê-la como possibilidade de ser articulado a aprendizagem dos seus conceitos em situações cotidianas.

3. Metodologia

Com foco no desenvolvimento de habilidades inerentes à aprendizagem sobre empreendedorismo, sustentabilidade e medidas de capacidade, o primeiro passo foi promovermos uma roda de conversa com os alunos para apresentar a proposta da Eureka. Nesta etapa, foi perguntado o que eles sabiam sobre empreendedorismo e quais são os sonhos pessoais e profissionais de cada um.

Em seguida, o foco foi direcionado as discussões sobre empreendedorismo como iniciativa que envolve criatividade e ação, mencionando que não é o suficiente somente ter uma boa ideia, é preciso se planejar e agir para que o empreendimento seja de sucesso. Para finalizar essa aula, os alunos leram um texto informativo sobre empreendedorismo e juntos discutimos-o.

Na aula seguinte, iniciamos com um breve diálogo sobre sustentabilidade. Foi neste contexto que surgiu a ideia dos alunos fazerem uma pesquisa do que poderiam fazer para atender os propósitos desta temática. Eles optaram em fazer o sabonete líquido partindo do reaproveitamento de sabonetes em barra já usados e que seriam descartados por já estarem acabando. Ou seja, com a reutilização dos pedacinhos de sabonete foi pensado em produzir sabonetes líquidos para vender na Eureka.

Cada aluno se comprometeu em trazer suas sobras de sabonetes de casa e fazer uma mini campanha (junto aos colegas da própria escola) para a junção das sobras de sabonetes usados de suas casas também. Após duas semanas de buscas deste recurso pelos alunos, realizamos a produção do sabonete líquido na escola.

Figura 1: alunos ralando as sobras de sabonetes

Fonte: arquivo pessoal do autor

Figura 2: aluna preparando o sabonete líquido

Fonte: arquivo pessoal do autor

Figura 3: alunos preparando o sabonete líquido

Fonte:arquivo pessoal do autor

Antes de iniciar a etapa de produção, observamos e discutimos as medidas a serem utilizadas onde para cada 90 gramas de sabonetes colocamos em média 1 litro de litro de água. Falamos ainda sobre a temperatura ideal para colocar o sabonete  ralado na água quente. Daí pudemos até relembrar  os números inteiros a partir da temperatura, pois a temperatura é uma unidade de medida, etc.

Após o sabonete líquido estar pronto ainda colocamos em vidros menores de 60 ml e aí pudemos trabalhar a unidade de medida de capacidade litros, mililitros, quantos vidrinhos iriam dar, etc.

Figura 4: Sabonete líquido pronto

Fonte: arquivo pessoal do autor

Antes de fazer o produto  a ser comercializado na feira Eureka, houveram etapas imprescindíveis que devem ser asseguradas, como a mobilização e envolvimento dos alunos, o diálogo com suas famílias na compreensão da finalidade de recolhimento das sobras de sabonete, a cedência da cozinha para a realização da atividade prática, etc.

Os conteúdos matemáticos foram trabalhados de modo que não houve reclamação dos alunos, pois eles estavam envolvidos nas atividades práticas, em um contexto dinâmico, sendo orientados a pensar, questionar, experimentar, entre outros.

Em uma perspectiva de investigação Matemática, destaca Ponte et al (2009), que o aluno deve ser chamado a agir não só na formulação de questões mas também na apresentação dos resultados, nas discussões e argumentações com os seus colegas e o professor.

Na feira Eureka, sob olhares dos profissionais docentes da escola, os alunos participaram das vendas dos produtos, atentando-se ao valor por eles estipulado de 25 Denários. Etapa esta em que eles tinham que negociar com os clientes, pois haviam aqueles que queriam descontos nos produtos.

Durante o processo de estudos e preparação do sabonete líquido, os alunos participaram ativamente do processo. Desde a escolha até a organização e venda na Eureca.

4. Resultados

A experiência da Eureka, me ajudou a pensar sobre a importância de conduzir o aluno a vivenciar experiências práticas ao estudar diferentes conteúdos. Essa feira foi bem interessante porque eles puderam perceber que nem tudo que é descartado é, necessariamente, lixo. Ou seja, os restos de sabonetes que seriam jogados fora, se transformaram em sabonete líquido e foram vendidos no dia do evento, surgindo assim uma oportunidade de motivação quanto ao entendimento sobre empreendedorismo.

Os alunos manifestaram alegria em aprender conteúdos matemáticos em contextos oriundos de situações cotidianas, de forma bem lúdica e participativa. Isso se manifestou quando eles realizavam as atividades em sala de aula, assim como em suas vendas, quando diziam que seus esforços valeram “a pena”. A atenção e entusiasmo estavam presentes, pois, quando eles precisavam  de apoio, recorriam aos professores que estavam no estande.

Na venda, cada vidrinho de 60 ml de sabonetes tinha o valor de 25 denários. Foram vendidos 35 vidrinhos de sabonetes e arrecadado um total de 875 denários. Nesta atividade eles puderam colocar em prática os conhecimentos obtidos em sala de aula, incentivando-os a estimular o desenvolvimento de competências e habilidades relacionadas ao planejamento, a criação de produtos e a comercialização.

Os alunos tiveram autonomia ao manifestar seus conhecimentos sobre o projeto Eureka. Quando interrogados pelos clientes, manifestavam seus conhecimentos sobre a capacidade de cada produto comercializado.

Merece atenção ao mesmo tempo, o fato da feira de Ciências e Matemática – Eureka, ter oportunizado aos alunos a fazer descobertas importantes a partir de estudos conceituais e práticos. O meu papel enquanto educadora, em uma relação dialógica, foi fundamental na condução de propostas de atividades de ensino-aprendizagem.

O aluno foi visto como personagem principal do processo de ensino e aprendizagem. O ensino ofertado teve o desígnio de aprofundar e/ou consolidar as aprendizagens dos alunos em relação aos conceitos matemáticos sobre medidas de capacidade, elencados no planejamento de cada atividade.

A Eureka favoreceu a um “convite” à interdisciplinaridade, de modo que em uma relação professor-aluno, eles se assumam epistemologicamente curiosos, como dito por (FREIRE, 2006). Esse movimento de integrar os componentes de Ciências e Matemática, possibilitaram a integrar objetos de conhecimentos e habilidades destas áreas, favorecendo a ampliar o potencial de aprendizado do aluno nos demais componentes curriculares.

Esta experiência, favorece ainda ao entendimento de que o ensino da matemática deve conduzir os alunos a explorar uma variedade de situações propostas com intencionalidades pedagógicas, que lhes permitam aprender ao estabelecer relações entre conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais (ZABALA, 1998).

Desta forma, o entendimento dos conceitos matemáticos foram revelados não apenas pela sua definição, os alunos exercitam suas aprendizagens em contexto real e “emitiram juízo”, em suas atitudes durante o evento.

5. Discussões

Se queremos alunos motivados em agir como protagonistas na escola e/ou fora dela, é preciso valorizar seus conhecimentos antes e durante a problematização e realização de cada atividade de ensino-aprendizagem nas etapas de cada fase de um projeto e na organização dos produtos, com o desígnio de desenvolver competências

Sobre as competências essenciais, destacamos entre as dez gerais da Base Nacional Comum Curricular-BNCC (2017 p.9) as elencadas a seguir:

2. Pensamento Científico, Crítico e Criativo — Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das diferentes áreas.

6.Trabalho e Projeto de Vida — Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhe possibilitem entender as relações próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade.

7.Argumentação — Argumentar com base em fatos, dados e informações confiáveis, para formular, negociar e defender ideias, pontos de vista e decisões comuns que respeitem e promovam os direitos humanos, a consciência socioambiental e o consumo responsável em âmbito local, regional e global, com posicionamento ético em relação ao cuidado de si mesmo, dos outros e do planeta.

A prática de ensino da escola deve garantir boas condições pedagógicas, fundamentada nos quatros pilares estabelecidos pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura-UNESCO: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver e aprender a ser.

O ensino da Matemática deve ser proposto de modo que os alunos possam enxergar a escola com olhos de felicidade. É papel do professor planejar atividades desafiadoras, que possam tornar o aluno um sujeito participante e ativo nas aulas.

Neste contexto, percebe-se a necessidade de rediscutir as estratégias adotadas na realização de atividades de matemática, criando espaços de discussões entre professores, sobre as abordagens de conteúdos, a fim de melhorar as propostas de atividades didático-pedagógicas. Pois, existe necessidade de uma matemática interessante, exploratória, divertida e desafiadora (D’Ambrósio, 1996).

Freire (1996) afirma que “ensinar exige reflexão crítica sobre a prática”. Para isto é necessário o movimento ativo e dialético entre fazer e o pensar sobre o fazer. De modo que reconheça que é pensando criticamente sobre sua prática e do outro, que ele melhora a própria prática.

Os alunos precisam estar envolvidos no processo ensino-aprendizagem. Para isso, a prática do professor por meio de um bom planejamento que sustente boas atividades, os ajudará a obter resultados positivos.

5. Conclusões

O ensino da matemática centrado no desenvolvimento do aluno não se restringe apenas a abordagens de conceitos. Ela deve ser ensinada de modo que os alunos desenvolvam a capacidade de identificar oportunidades de utilizá-la para resolver problemas, ao interpretá-los em contextos e situações diversas.

A BNCC afirma que o Ensino Fundamental deve ter compromisso com o desenvolvimento do letramento matemático. Ao considerar esse pressuposto, entende-se que os alunos devem compreendê-la como uma ciência viva.

Alicerçar descobertas e construções de conceitos matemáticos não é algo fácil. Isso faz emergir a necessidade de um professor atento às nuances curriculares e principalmente as necessidades de aprendizagens e potencialidades dos alunos, avaliando e revendo sua prática enquanto educador, sempre que for necessário.

A preocupação com a reflexão sobre a prática e na prática, em uma visão Freireana, deve estar em função de ser um educador que cria possibilidades ao educando para sua própria construção.

Referências

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular – BNCC. Ministério da Educação -MEC.Brasília, DF, 2017.

______.Parâmetros Curriculares Nacionais: Meio ambiente. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília, 1997

D’AMBROSIO, Ubiratan. História da Matemática e Educação. In: Cadernos CEDES. História e Educação Matemática. 1. ed. São Paulo: Papirus, 1996.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

MENDES, Ana Rita de Oliveira. Apontamentos sobre a educação para o empreendedorismo em Portugal. Revista Portuguesa de Pedagogia. Ano 41-3, 2007

PONTE, João Pedro; BROCARDO, Joana; OLIVEIRA, Hélia. Investigações matemáticas na sala de aula. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.


1 Especialista em Gestão, Supervisão e Orientação escolar; professora de matemática na EMEF Carmelo Mendes da Silva; lilian.torres@iemci.ufpa.br  

² Especialista em Alfabetização e letramento, Educação Especial Inclusiva, AEE e Sala de Recurso multifuncional, Psicopedagogia, Arteterapia, Diversidade de aprendizagem e Mestra em Ciências e Matemática; professora de Arte na EMEF Sebastião Agripino da Silva; alaide.silva@iemci.ufpa.br

³vnferreirabraga@gmail.com