REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202508042044
Ariane Marciele Veiga Gripa Bordin2; Daniela Maria Pantaleão; Erasmo Carlos Gonçalves Saldanha; Geisibel Vargas Soares; Juliano Tonin; Leonardo Athayde de albuquerque; Neli Maria Lazzarotto; Odete Roseli de Oliveira; Pamela Georg; Sisnando Leiria Júnior
RESUMO
A retórica da sustentabilidade tornou-se um artifício recorrente nas estratégias de comunicação de grandes corporações que, ao adotarem uma estética discursiva voltada à responsabilidade ambiental, buscam legitimar práticas muitas vezes dissociadas de um compromisso efetivo com o meio ambiente. Essa instrumentalização do discurso sustentável revela-se como uma forma de encenação, em que valores ecológicos são utilizados como ornamento para reforçar a imagem pública das empresas, sem que haja transformação substancial em seus modelos produtivos. Nesse cenário, o marketing verde passa a operar como mecanismo de persuasão simbólica, criando uma aparência de comprometimento ambiental que, na prática, frequentemente mascara a manutenção de lógicas predatórias. Assim, a sustentabilidade deixa de representar uma diretriz ética e se converte em recurso retórico funcional ao capital, sendo empregada para contornar críticas, atrair consumidores e satisfazer exigências regulatórias mínimas. A análise crítica dessa prática corporativa permite compreender os limites entre a retórica e a ação, destacando a necessidade de diferenciar práticas sustentáveis genuínas de iniciativas meramente cosméticas. A performatividade ecológica revela, nesse contexto, um descompasso entre discurso e realidade, comprometendo a credibilidade das ações ambientais propagadas. Dessa forma, é imperativo refletir sobre os riscos de uma sustentabilidade simulada, que, ao invés de contribuir para a preservação ambiental, serve à perpetuação de modelos econômicos insustentáveis sob o verniz da responsabilidade. A problematização do uso estratégico da sustentabilidade aponta para a urgência de mecanismos de avaliação crítica, transparência e responsabilização das empresas diante de seus impactos ambientais concretos.
Palavras-chave: Sustentabilidade. Retórica. Corporativismo.
ABSTRACT
The rhetoric of sustainability has become a recurring device in the communication strategies of large corporations which, by adopting a discursive aesthetic centered on environmental responsibility, seek to legitimize practices often disconnected from an actual commitment to the environment. This instrumentalization of sustainable discourse reveals itself as a form of performance, in which ecological values are used as ornamentation to reinforce the public image of companies without substantial transformation in their productive models. In this scenario, green marketing functions as a mechanism of symbolic persuasion, creating an appearance of environmental commitment that often conceals the maintenance of predatory logics. Thus, sustainability ceases to represent an ethical guideline and becomes a rhetorical resource functional to capital, being used to deflect criticism, attract consumers, and meet minimal regulatory demands. A critical analysis of this corporate practice allows an understanding of the boundaries between rhetoric and action, highlighting the need to differentiate genuine sustainable practices from merely cosmetic initiatives. Ecological performativity, in this context, reveals a disconnect between discourse and reality, compromising the credibility of the environmental actions promoted. In this way, it becomes imperative to reflect on the risks of simulated sustainability which, instead of contributing to environmental preservation, serves to perpetuate unsustainable economic models under the guise of responsibility. The problematization of the strategic use of sustainability points to the urgency of mechanisms for critical evaluation, transparency, and corporate accountability regarding their real environmental impacts.
Keywords: Sustainability. Rhetoric. Corporatism.
1 INTRODUÇÃO
A crescente valorização do discurso ambiental no cenário global tem impulsionado empresas a adotarem estratégias comunicacionais sustentáveis como forma de adaptação às novas sensibilidades sociais e exigências do mercado contemporâneo. O avanço de pautas ecológicas na agenda internacional, associado ao aumento da conscientização ambiental por parte dos consumidores, tem pressionado o setor corporativo a reposicionar-se simbolicamente frente às demandas por responsabilidade socioambiental. Contudo, esse movimento nem sempre está vinculado a transformações estruturais nos modos de produção ou ao real compromisso com a mitigação de impactos ambientais. Frequentemente, trata-se de uma reconfiguração estética do discurso institucional, cujo objetivo principal é preservar a imagem corporativa por meio da adesão simbólica à sustentabilidade.
Nesse contexto, a sustentabilidade converte-se em linguagem performática, esvaziada de substância e moldada sob a lógica do capital, passando a funcionar como um instrumento de legitimação institucional. As empresas, ao incorporarem expressões como “desenvolvimento sustentável”, “compromisso ecológico” e “pegada verde” em campanhas publicitárias, relatórios anuais e certificações ambientais, constroem uma retórica que visa atender às expectativas do público e aos requisitos regulatórios mínimos. No entanto, a desconexão entre o discurso proferido e as práticas de fato adotadas revela a fragilidade desse compromisso e evidencia que a sustentabilidade, nesse modelo, funciona como artifício de marketing mais do que como diretriz ética.
Desse modo, a retórica verde ocupa posição central nas narrativas empresariais contemporâneas, configurando-se como elemento de escamoteamento das contradições entre o lucro e a preservação ambiental. A adoção seletiva de práticas sustentáveis, geralmente restritas a ações pontuais, fragmentadas e de baixo impacto, reforça a superficialidade dos compromissos assumidos. Em vez de promover uma revisão profunda dos processos internos e dos fundamentos econômicos que sustentam a atividade empresarial, a sustentabilidade passa a operar como simulacro, capaz de suavizar os efeitos de condutas ambientalmente nocivas por meio de uma gramática visual e verbal de responsabilidade.
A crítica a esse modelo de sustentabilidade performática exige, portanto, uma análise dos dispositivos de legitimação discursiva utilizados pelas corporações, sobretudo daqueles que operam na esfera simbólica. A produção de sentido em torno da imagem “verde” das empresas ocorre em meio a uma disputa por hegemonia comunicacional, na qual se travam batalhas em torno da credibilidade, da confiança do consumidor e da reputação institucional. Nesse cenário, o capital apropria-se da linguagem ambiental como recurso estratégico, convertendo valores ecológicos em elementos funcionais à manutenção de estruturas econômicas predatórias, agora recobertas por um verniz de responsabilidade.
Dessa forma, a compreensão da sustentabilidade enquanto encenação retórica aponta para a necessidade urgente de criar instrumentos eficazes de avaliação, verificação e responsabilização das ações ambientais empresariais. A existência de um discurso institucional supostamente sustentável não implica a existência de compromisso real com o meio ambiente. Assim, apenas mediante o fortalecimento de mecanismos regulatórios, da participação crítica da sociedade civil e da transparência nos processos corporativos será possível distinguir iniciativas verdadeiramente sustentáveis de estratégias discursivas voltadas à autopromoção. A sustentabilidade, para ser ética, precisa ser concreta, verificável e transformadora.
2. DESENVOLVIMENTO
A sustentabilidade performática, conforme apontado por diversos estudos, apresenta-se como uma manifestação estratégica do discurso empresarial moderno, voltada à construção de uma imagem pública alinhada aos valores contemporâneos de responsabilidade ambiental. Em muitos casos, o compromisso ambiental divulgado por grandes corporações é apenas aparente, configurando-se como um artifício simbólico de adesão a uma causa que, de fato, não orienta os processos internos de produção e gestão. A retórica sustentável, nesse contexto, cumpre função legitimadora, oferecendo às empresas uma posição confortável diante de consumidores críticos, sem que haja mudanças estruturais em suas práticas produtivas (ALMEIDA,2017).
O marketing verde, enquanto desdobramento dessa lógica retórica, atua como uma forma refinada de manipulação simbólica, transformando elementos ambientais em ativos discursivos lucrativos. A apropriação de expressões como “compromisso com o planeta” ou “produtos ecologicamente corretos” integra uma gramática de persuasão que mascara, muitas vezes, condutas ambientais questionáveis. Dessa forma, o apelo à sustentabilidade torna-se uma performance comunicacional descolada da realidade operacional das empresas, cujo foco permanece voltado ao acúmulo de capital, ainda que travestido de responsabilidade ecológica (CAMPOS,2015).
Ao explorar os mecanismos simbólicos de convencimento empregados pelas corporações, observa-se que a sustentabilidade serve não como fim, mas como meio de afirmação mercadológica. A construção de uma imagem institucional “verde” atende a uma expectativa social crescente por responsabilidade ambiental, mas frequentemente essa expectativa é preenchida por simulacros. A distância entre discurso e prática é, nesse sentido, sintoma de uma lógica empresarial que instrumentaliza valores éticos para manter intactos os interesses econômicos (NOGUEIRA,2016).
Essa realidade evidencia a urgência de critérios objetivos que permitam distinguir o engajamento autêntico de ações meramente cosméticas. A ausência de fiscalização efetiva e de parâmetros claros para a aferição da sustentabilidade abre margem para que empresas recorram a narrativas ambientais como forma de autopromoção, esvaziando o conteúdo das políticas ecológicas. A retórica ambiental, quando não acompanhada de medidas verificáveis e compromissos mensuráveis, representa não apenas uma fraude simbólica, mas um obstáculo à efetivação de mudanças concretas no paradigma de desenvolvimento (OLIVEIRA,2018).
Assim, a consolidação de práticas empresariais sustentáveis requer mais do que adequação discursiva; exige transformação estrutural e transparência nas ações. A estética do verde, quando não lastreada em mudanças profundas nos modelos de gestão e produção, torna-se mero adereço. O risco, nesse caso, é a perpetuação de um modelo econômico predatório sob uma nova roupagem, mais palatável ao público, mas igualmente nociva ao meio ambiente. A crítica à sustentabilidade performática, portanto, revela a necessidade de repensar os marcos regulatórios e as formas de responsabilização empresarial (PACHECO,2019).
2.1 Empresas em Tom de Verde: O Recurso Retórico da Sustentabilidade Performática
A crescente incorporação do discurso ambiental pelas empresas, muitas vezes, não reflete um comprometimento autêntico com a sustentabilidade, mas sim uma estratégia de adesão superficial às exigências simbólicas da sociedade contemporânea. O fenômeno da “ecologia de fachada”, conforme analisado por autores críticos, denuncia uma prática em que a linguagem verde é mobilizada para construir reputações, ocultando a permanência de métodos produtivos insustentáveis e eticamente problemáticos. O recurso à simbologia ambiental é, nesse cenário, um mecanismo de manipulação da percepção pública, possibilitando que grandes conglomerados corporativos mantenham suas estruturas intactas enquanto simulam mudanças (QUEIROZ,2018).
A legitimação simbólica, reforçada por certificações genéricas, campanhas publicitárias e ações pontuais, contribui para o fortalecimento de uma imagem empresarial ambientalmente responsável. No entanto, muitas dessas ações são desprovidas de efetividade concreta e baseadas em indicadores frágeis ou autorreferenciados. A ausência de mecanismos públicos de verificação robustos facilita a propagação de uma sustentabilidade retórica, cujo alcance é limitado à dimensão estética da comunicação institucional. Trata-se, portanto, de uma arquitetura discursiva sofisticada, construída com o propósito de mitigar críticas sociais e assegurar competitividade de mercado (SILVA,2016).
Nesse contexto, a retórica ambiental torna-se funcional ao capital, não apenas por mascarar contradições, mas por integrar-se à lógica da mercantilização da imagem institucional. Empresas constroem, assim, uma espécie de “economia simbólica verde”, na qual discursos, selos e causas ambientais são incorporados como bens imateriais que agregam valor à marca. Esse fenômeno reconfigura a relação entre ética e mercado, esvaziando o conteúdo da responsabilidade socioambiental e convertendo-a em ativo de valorização reputacional (VALVERDE,2015).
A análise dessa lógica performática permite compreender o quanto o marketing verde ultrapassa a propaganda e se transforma em um sistema de gestão de percepções. Em vez de agir de forma transformadora sobre os modos de produção, a sustentabilidade discursiva limita-se a gerar uma atmosfera de confiança e segurança ambiental, sem exigir rupturas com práticas predatórias. O capital simbólico resultante desse processo atua como blindagem, neutralizando críticas e criando uma narrativa corporativa de compromisso ambiental que raramente se sustenta na prática (VASCONCELOS,2019).
Diante disso, torna-se evidente que o discurso da sustentabilidade não pode ser tomado como garantia de conduta ética. A desarticulação entre o que se propaga e o que se faz evidencia a fragilidade de uma estrutura empresarial que se apoia mais na retórica do que na reformulação de seus fundamentos. A retórica ecológica, nesse sentido, é eficaz como ferramenta de convencimento, mas ineficaz como instrumento de transformação. Sua força reside na aparência e não na substância, o que reforça a necessidade de um olhar crítico sobre os usos políticos e econômicos da linguagem ambiental no mundo corporativo (VIEIRA,2017).
A adoção de termos ambientalmente atrativos nas estratégias comunicacionais corporativas tem consolidado uma estética discursiva que opera como mecanismo de blindagem simbólica. Essa retórica, carregada de expressões como “carbono neutro”, “economia circular” e “consumo consciente”, contribui para reforçar a imagem de empresas como agentes comprometidos com causas ecológicas. Contudo, na maioria das vezes, esses termos não estão vinculados a práticas concretas e transformadoras, funcionando apenas como dispositivos de contenção de críticas e manutenção de legitimidade institucional (QUEIROZ,2018).
A emergência de uma gramática verde no campo empresarial não implica, necessariamente, a internalização de valores ambientais nos modelos de gestão. Pelo contrário, frequentemente, observa-se a prevalência de ações pontuais, desarticuladas e desprovidas de continuidade, que buscam responder às pressões do mercado de forma superficial. Tais ações se configuram como exemplos claros de greenwashing, prática criticada por diversos estudiosos da área por seu potencial de desinformar o consumidor e enfraquecer a credibilidade de políticas sustentáveis genuínas (SILVA,2016).
A prevalência da sustentabilidade como performance discursiva também revela a fragilidade dos sistemas de controle e regulação. A ausência de normativas sólidas que exijam a comprovação das práticas sustentáveis anunciadas favorece o crescimento de um ambiente corporativo onde a aparência é mais valorizada que a transformação. Em tal cenário, a sustentabilidade torna-se menos um valor ético do que um artifício comunicacional de sobrevivência e vantagem competitiva no mercado (VALVERDE,2015).
Ainda que existam empresas efetivamente comprometidas com o desenvolvimento sustentável, essas permanecem como exceção em meio à multiplicação de discursos padronizados que se assemelham mais a slogans do que a compromissos reais. A performatividade da linguagem ambiental corporativa, quando desvinculada de práticas estruturais, configura uma forma de simulação institucional, na qual o conteúdo é substituído pela forma e o impacto ambiental positivo, pela retórica da promessa (VASCONCELOS,2019).
Dessa forma, o esvaziamento semântico da sustentabilidade no discurso empresarial evidencia a necessidade de fortalecer critérios objetivos de avaliação e fiscalização. Apenas com a exigência de indicadores mensuráveis, transparência total nas metas ambientais e responsabilização jurídica é que se poderá mitigar os efeitos deletérios da sustentabilidade performática. A análise crítica desse processo é, portanto, essencial para a construção de um cenário corporativo mais ético, coerente e, sobretudo, comprometido com o futuro ambiental do planeta (VIEIRA,2017).
A apropriação estratégica da linguagem sustentável por parte das corporações manifesta-se em práticas que buscam camuflar contradições estruturais do modelo capitalista contemporâneo. A retórica verde, nesse sentido, não visa transformar as bases produtivas, mas sim reorganizar os discursos a fim de conferir legitimidade a práticas empresariais já consolidadas. Tal como aponta a literatura crítica, essa encenação discursiva é uma resposta ao aumento da pressão social por ética ambiental, sem que isso implique compromissos reais de reestruturação (ALMEIDA,2017).
O uso da estética do verde como ornamento institucional é um exemplo de como o capital se apropria de signos éticos para mantê-los subordinados à lógica da acumulação. Selos ambientais, campanhas de consumo consciente e relatórios de sustentabilidade, muitas vezes, operam como mecanismos de distração frente à manutenção de padrões produtivos ambientalmente insustentáveis. Essa contradição revela que a imagem institucional construída sob o signo da responsabilidade ambiental nem sempre é compatível com a realidade das práticas internas (CAMPOS,2015).
No campo simbólico, o discurso sustentável assume uma função anestésica, na medida em que suaviza os impactos ambientais reais e reforça uma ideia de progresso conciliável com a preservação ecológica. Ao promover essa visão idealizada, o marketing verde participa da reprodução de uma utopia empresarial desprovida de base concreta. Tal narrativa produz um efeito de apagamento das violações ambientais, deslocando o foco da crítica para a superfície do discurso (NOGUEIRA,2016).
A sustentabilidade performática, nesse caso, deixa de ser instrumento de transformação para se tornar uma engrenagem funcional ao próprio sistema que se pretende questionar. Em vez de promover rupturas, a linguagem ambiental serve para adaptar o discurso empresarial às novas exigências simbólicas de consumo e cidadania, sem alterar suas estruturas centrais. Isso implica em uma ressignificação da ética, agora convertida em estética comunicacional (OLIVEIRA,2018).
A partir dessa constatação, torna-se urgente reconhecer que a retórica da sustentabilidade não pode ser analisada de forma isolada, mas sim no interior de um contexto mais amplo de disputa por legitimidade no campo social e econômico. Apenas com o fortalecimento do controle público e da crítica sistemática será possível estabelecer limites claros entre o discurso e a prática, separando a sustentabilidade substantiva da sustentabilidade performática (PACHECO,2019).
A ampliação do controle público sobre os discursos empresariais de sustentabilidade implica na construção de mecanismos institucionais capazes de fiscalizar não apenas os impactos ambientais concretos, mas também a coerência entre o que é divulgado e o que é efetivamente praticado. A ausência de instrumentos normativos rigorosos favorece o uso oportunista da linguagem ambiental, permitindo que empresas simulem engajamento socioambiental sem alterar suas estruturas produtivas. Nesse cenário, a crítica sistemática torna-se uma ferramenta essencial para desmascarar estratégias de greenwashing e desnaturalizar a ideia de que toda iniciativa dita “sustentável” é, de fato, benéfica ao meio ambiente (QUEIROZ,2018).
Além disso, a disputa por legitimidade no campo econômico revela que a sustentabilidade é apropriada como capital simbólico, convertendo-se em diferencial competitivo mais do que em compromisso ético. O discurso verde, assim moldado, é instrumentalizado para alcançar novos nichos de mercado, garantir acesso a financiamentos e atender aos anseios de consumidores cada vez mais exigentes. No entanto, tal apropriação não garante mudança real nos paradigmas produtivos nem na lógica de exploração dos recursos naturais. A sustentabilidade performática, nesse sentido, opera como uma nova linguagem do capital, que simula transformação sem tocar na essência dos processos que sustentam a degradação ambiental (VASCONCELOS,2019).
Dessa forma, torna-se evidente que a sustentabilidade genuína exige não apenas regulamentação eficaz, mas também uma reorientação profunda dos princípios que norteiam o desenvolvimento econômico. A superação da retórica ambiental vazia passa, necessariamente, pela construção de uma cultura organizacional comprometida com valores ambientais que transcendam os interesses de marketing. Isso requer uma mudança paradigmática nas relações entre empresa, natureza e sociedade, rompendo com a lógica instrumental que reduz o meio ambiente a mero recurso explorável. A crítica fundamentada e a exigência de práticas verificáveis são, assim, caminhos indispensáveis para que a sustentabilidade deixe de ser um enunciado estratégico e se torne um projeto ético de transformação real (VIEIRA,2017).
3. CONCLUSÃO
A análise da sustentabilidade enquanto recurso retórico evidencia o esvaziamento do compromisso ambiental em muitas iniciativas corporativas que, ao priorizarem a imagem institucional em detrimento de transformações estruturais, contribuem para o enfraquecimento do significado ético e político da sustentabilidade. Ao transformar o discurso verde em uma estratégia comunicacional, desconectada de ações concretas e mensuráveis, empresas passam a participar de um processo de banalização dos valores ecológicos, esvaziando seu potencial mobilizador e comprometendo os avanços esperados na mitigação dos impactos ambientais. Essa banalização contribui para um cenário de desinformação ambiental, no qual a aparência de engajamento substitui o engajamento real, tornando o conceito de sustentabilidade vulnerável à manipulação.
Além disso, a instrumentalização da sustentabilidade revela uma tentativa deliberada de reposicionamento das empresas no mercado contemporâneo, explorando simbolicamente os valores ambientais para fortalecer a reputação e conquistar a confiança do consumidor. Trata-se de um movimento sofisticado de apropriação discursiva, no qual a responsabilidade ecológica é ressignificada como atributo mercadológico, muitas vezes desvinculado da reformulação dos processos produtivos. Essa prática não apenas reforça a lógica de acumulação do capital sob nova roupagem, mas também impede que os princípios ecológicos se convertam em critérios estruturantes das atividades econômicas. O apelo à sustentabilidade, enquanto ornamento retórico, torna-se um artifício de legitimação que atua no plano simbólico sem provocar qualquer transformação sistêmica.
Dessa perspectiva, a performatividade do discurso ecológico indica um descompasso estrutural entre aparência e substância, no qual a forma substitui o conteúdo, e a estética da responsabilidade prevalece sobre sua ética. As ações sustentáveis, quando guiadas exclusivamente por interesses de posicionamento no mercado, carecem de força transformadora e mantêm intocados os fundamentos insustentáveis do atual modelo de desenvolvimento. A retórica ambiental, nessa lógica, não atua como instrumento de superação das crises ecológicas, mas como mecanismo de reprodução dos mesmos padrões que as causaram. O simulacro de mudança promove uma estabilidade ilusória, mascarando a continuidade da exploração e postergando decisões urgentes sobre o futuro do planeta.
A crítica a essa postura demanda não apenas o desvelamento das estratégias discursivas utilizadas pelas corporações, mas também a formulação e a implementação de instrumentos objetivos e rigorosos de controle. A construção de indicadores transparentes, verificáveis e submetidos a instâncias independentes de auditoria é condição indispensável para garantir que as iniciativas empresariais sejam analisadas para além da sua dimensão declaratória. Nesse sentido, é fundamental que políticas públicas, agências reguladoras e organismos internacionais atuem de forma integrada no monitoramento e na responsabilização de práticas ambientais, de modo que a sustentabilidade deixe de ser um recurso retórico e passe a ser critério de legitimidade real.
Assim, o reconhecimento da sustentabilidade como encenação retórica reforça a necessidade de uma articulação entre ética, política e economia que transcenda o nível do discurso e se materialize em ações concretas. A responsabilização corporativa diante dos impactos ambientais que produz não pode se restringir à retórica institucional ou à lógica compensatória de marketing verde. Torna-se imprescindível o fortalecimento de mecanismos sociais, institucionais e jurídicos capazes de confrontar o discurso com a prática, desmontar os simulacros da sustentabilidade performática e consolidar uma cultura de responsabilidade ambiental real, transparente e transformadora. A sustentabilidade, para ser legítima, precisa ser ética, mensurável e orientada à justiça ambiental.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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VIEIRA, Bruno. Consumo consciente e engano verde: os limites da sustentabilidade retórica. Natal, 2017.
1 Artigo científico apresentado ao Grupo Educacional IBRA como requisito para a aprovação na disciplina de TCC.
2 Discente do curso de Ciências Sociais.